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Ready Player One: Jogador 1

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Ready Player One
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A Time Out diz

3/5 estrelas

Steven Spielberg é responsável por alguns dos momentos (sobretudo cinematográficos), mais perenes e mais citáveis da cultura pop dos anos 70 a 90, pela “invasão” de géneros clássicos como a aventura, o fantástico ou a ficção científica por uma mundividência adolescente e pela criação daquilo a que poderíamos chamar uma nova ideologia do espectáculo e do entretenimento, que também se projectou para a televisão, para os jogos de vídeo ou para os comics.

O seu novo filme, Ready Player One: Jogador 1, baseado no livro de Ernest Cline, é uma consequência de tudo isso. Spielberg procura, simultaneamente, capitalizar na actual onda de nostalgia pela década de 80, lançada por pessoas que cresceram nessa altura, e que por exemplo deu origem a séries de televisão como Stranger Things; e falar para a geração dos jogos de vídeo e da realidade virtual, que passa mais tempo a teclar no telemóvel e na Internet do que a ver televisão ou a ler, e só vai ao cinema para ver o novo blockbuster de super-heróis.

Se o realizador vai conseguir que Ready Player One: Jogador 1 atraia esses dois grupos etários opostos e com referências tão díspares, um cultivando as saudades do passado, outro todo virado para o futuro, isso ainda estamos para ver.

O livro de Cline, que também participou 
no argumento da fita, é uma cornucópia de citações da cultura pop embrulhadas num enredo simplista de ficção científica juvenil. A acção de Ready Player One: Jogador 1 passa-se em 2045, num mundo distópico em que as pessoas de todas as condições sociais, mas sobretudo os menos desfavorecidos, se evadem, através da tecnologia de realidade virtual, para um universo artificial de fantasia chamado OASIS, onde podem viver todas
 as aventuras imagináveis através dos seus avatares.

OASIS foi criado por um génio recluso e
 já falecido, James Halliday (Mark Rylance), que deixou a sua imensa fortuna, e o controlo daquele mundo de escapismo sintético, a quem consiga ganhar uma competição com três fases, a cada uma das quais corresponde uma chave. Todos os enigmas da competição têm a ver com referências da pop culture dos anos 70 e 80, mas também com a vida pessoal de Hallyday, cujo avatar digital, Anorak, se manifesta a cada chave que é conquistada.

O jovem Wade Watts (Tye Sheridan) consegue, através de Parzival, o seu avatar, obter a primeira chave, e juntamente com quatro amigos, vai competir com a toda- -poderosa IOI, a corporação maléfica de serviço, personificada pelo seu director, Nolan Sorrento (Ben Mendelsohn), na corrida pelo controlo do OASIS.

Realizado à velocidade de um Fórmula 1 que ficou sem travões, o filme tem a forma de um colossal jogo de vídeo em 3D, que por sua vez se desenrola num mundo virtual mutante. Steven Spielberg bombardeia-nos sem parar com mais referências, objectos e personagens do acervo colectivo da cultura popular, na esmagadora maioria das décadas de 70, 80 e 90 – e isto sem contar com as “homenagens”
– do que as que conseguimos detectar ou contar.

Algumas delas são de filmes que ele mesmo realizou ou produziu, de Parque Jurássico à trilogia Regresso ao Futuro (Parzifal guia um DeLorean como no OASIS). E também por lá aparecem a moto de Akira, King Kong, o carro de Mad Max, o Gigante de Ferro ou jogos hoje jurássicos da Atari. Ao contrário de John Halliday, que é um “criador que abomina a sua criação”, Spielberg compraz-se na sua, alegremente e de maneira cúmplice.

A certa altura, Ready Player One: Jogador 1 chega mesmo a “invadir” um conhecidíssimo filme de terror realizado por um dos gigantes do cinema, baseado num livro de um dos maiores autores do género (no livro de Cline, o filme é outro, muito diferente). Deve ser a primeira vez na história do cinema que uma fita de um realizador vivo se mete por outra de um realizador morto dentro, e não contente com isto, altera-a.

A mensagem de Ready Player One: 
Jogador 1 é tão transparente como a sua intriga. Não nos podemos deixar viciar nos mundos artificiais criados por um progresso tecnológico cada vez mais vertiginoso, sob pena de perdermos o contacto com a realidade e com os outros, e a noção das coisas que são realmente importantes. (O filme contra si fala, ao celebrar, pelo gesto e pelo discurso, esta mesma evasão para paisagens geradas por computador, e ao cortejar geeks e gamers. É uma contradição a que as superproduções de Hollywood já nos habituaram.)

O mais interessante (e também inquietante) deste filme, uma vez todos os efeitos gastos, toda a agitação passada e toda a ilusão dissipada, é a reflexão que deixa
 para ser feita. Será que Ready Player One: Jogador 1 anuncia o início do fim do cinema tal como o conhecemos e fruímos até agora, apontando para aquilo que, segundo alguns, será a forma que assumirá num futuro cada vez mais próximo? Isto é, visto já não numa sala escurecida e como uma experiência partilhada, mas sim individualmente, através de um capacete ou de óculos de realidade virtual? É uma ideia que decerto dividirá os dois públicos opostos que Steven Spielberg quer seduzir e conciliar com este filme.

Por Eurico de Barros

Escrito por
Eurico de Barros

Detalhes da estreia

  • Classificação:12A
  • Data de estreia:quinta-feira 29 março 2018
  • Duração:140 minutos

Elenco e equipa

  • Realização:Steven Spielberg
  • Argumento:Zak Penn, Ernest Cline
  • Elenco:
    • Tye Sheridan
    • Olivia Cooke
    • Ben Mendelsohn
    • Mark Rylance
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