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Blade Runner 2049

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A Time Out diz

4/5 estrelas

A aspiração das máquinas a terem sentimentos humanos, a sentirem os desejos, as paixões e as dores dos seus criadores de carne e osso, bem como consciência de si próprias e do mundo, para lá da sua programação original, que eventualmente poderão levá-las a revoltar-se contra a humanidade que as concebeu e fabricou, é um dos temas mais antigos da literatura de ficção científica (FC), e que naturalmente passou para o cinema do género. Um tema tão clássico, tão fulcral à FC e tão glosado e permanente, que Isaac Asimov até enunciou, no seu conto de 1942 Runaround, as célebres Três Leis da Robótica (à qual acrescentaria mais tarde uma quarta, que precede estas), que regulam o comportamento dos robôs e outras criaturas artificiais, como medida de segurança para os homens.

Inspirado em Do Androids Dream of Electric Sheep?, de Philip K. Dick, Blade Runner:Perigo Iminente, de Ridley Scott (1982), é um dos filmes que melhor e mais espectacularmente trata este tema dos robôs “humanizados” e revoltados contra quem os criou para fazer o trabalho árduo, sujo e perigoso dos humanos (nomeadamente, nas novas colónias do espaço), contando uma história policial de acção num quadro de FC onde se destaca o world building (distópico no caso vertente). O filme passa-se numa Los Angeles high tech, poluída e chuvosa, híper-povoada e envolvida numa noite permanente, parte de um planeta Terra em colapso ecológico e populacional, um mundo ao qual se liga, umbilicalmente e com rara coerência interna, o enredo neo-noir e futurista sobre o agente da polícia de Los Angeles Rick Deckard (Harrison Ford) que persegue replicantes rebeldes e fugitivos para os eliminar.

Há muito tempo que havia a intenção de rodar uma continuação do filme de Scott, que esteve, por exemplo, para adaptar The Edge of Human, o livro de K.W. Jeter que continuava quer a obra de Dick, quer o próprio Blade Runner: Perigo Iminente. Esse intento foi finalmente concretizado com Blade Runner 2049, de Denis Villeneuve, um filme onde estão envolvidos muitos daqueles que trabalharam no original, desde o próprio Scott, agora produtor executivo, até Hampton Fancher, um dos seus dois argumentistas. Daí a sólida fidelidade à obra-prima de Ridley Scott e a forte sensação de continuidade apresentadas por Blade Runner 2049, que prolonga, reforça, pormenoriza e aumenta as características do universo em que a acção se desenrola, um futuro ainda mais negro, devastado e cheio de gente, e cada vez mais desenvolvido tecnologicamente. E no qual, apesar das aparências, não só os replicantes, como outras criações sintéticas e virtuais, continuam a desejar atingir a condição de humanos. Uma das melhores e mais tocantes sequências de Blade Runner 2049 não é de acção nem de aparato visual: é uma tentativa de comunhão sexual entre seres de carne e osso e criações electrónicas.

Trinta e cinco anos depois do filme original, Blade Runner 2049 volta a ser uma história policial inscrita num contexto de FC, ambientada num futuro que correu mal, e no qual se mantém as especulações científicas e filosofantes sobre a humanização das máquinas (quer lhes chamemos robôs, andróides, replicantes ou representações virtuais). Ryan Gosling é um replicante agente da polícia de Los Angeles, que no decurso da sua missão de “reformar” modelos antigos perigosos fabricados pela extinta Tyrell Corporation, depara com um mistério que o vai levar a Rick Deckard (Harrison Ford retoma a personagem) e a uma extraordinária revelação, bem como a perigos vários e inimigos temíveis. Dizer mais sobre a intriga do filme é deixar spoilers desmancha-prazeres.

Denis Villeneuve realiza Blade Runner 2049 com aquela calma controlada que se lhe conhece dos seus trabalhos anteriores, como Sicário ou o excelente Primeiro Contacto, assinando um filme intrinsecamente ligado ao de Ridley Scott do ponto de vista visionário, visual, narrativo, dramático e especulativo, mas também percorrendo novos caminhos num universo familiar. Era impossível que uma continuação de Blade Runner: Perigo Iminente conseguisse ser tão boa, tão impressionante, tão marcante, tão carismática e tão influente como a fita original. Mas Blade Runner 2049 consegue a proeza de andar lá perto. Desde O Padrinho: Parte II, de Francis Ford Coppola (1972) que não acontecia um feito destes. Por vezes, o futuro reserva-nos magníficas surpresas. Mesmo um futuro perigoso, feio e assustador como o de Blade Runner 2049.

Por Eurico de Barros

Escrito por
Eurico de Barros

Detalhes da estreia

  • Classificação:15
  • Data de estreia:quinta-feira 5 outubro 2017
  • Duração:163 minutos

Elenco e equipa

  • Realização:Denis Villeneuve
  • Argumento:Hampton Fancher, Michael Green
  • Elenco:
    • Ryan Gosling
    • Harrison Ford
    • Jared Leto
    • Ana de Armas
    • Sylvia Hoeks
    • Robin Wright
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