A Time Out na sua caixa de entrada

Fake Famous

  • Filmes
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
Fake Famous de Nick Bilton
©DR
Publicidade

A Time Out diz

3/5 estrelas

A certa altura de Fake Famous, o documentário rodado pelo jornalista Nick Bilton para a HBO, visitamos uma garagem de uma vivenda em Los Angeles onde está instalado um cenário que reproduz o interior de um jacto particular. É ali que os candidatos a influenciadores do Instagram se dirigem para tirar fotografias em que simulam estar num luxuoso avião particular, a caminho de um qualquer destino de sonho. E como Bilton nos informa, o cenário “está com as reservas esgotadas para as próximas semanas”. Já antes o realizador tinha mostrado, em sua casa, como basta um tampo de sanita novo e uma fotografia do céu para simular a janela de um avião a jacto.

Estas são só duas das revelações sobre o vácuo, superficial, narcisista, hiperconsumista e bastante batoteiro mundo dos influenciadores das redes sociais, feitas em Fake Famous. Mas Nick Bilton, jornalista especializado em tecnologia que colabora com títulos como o The New York Times ou a Vanity Fair, e que se estreia aqui a realizar, quis ir mais longe na exposição da falsidade, da encenação e da fraude aberta que abundam neste meio. E para isso, propôs-se transformar em influenciadores do Instagram, por meios ilegítimos, três jovens anónimos seleccionados num casting, que tinham em comum a faixa etária, o desejo da fama e pouquíssimos seguidores na dita rede social.

São eles Dominique, aspirante a actriz e empregada numa loja de roupa; Wylie, um gay faz-tudo numa imobiliária; e Chris, candidato a designer de moda, todos vindos de vários sítios dos EUA para Los Angeles em busca da celebridade. A descrição da “fabricação” deste trio de influenciadores é acompanhada de depoimentos de vários peritos, desde jornalistas a empresários do Instagram que começaram por ser influenciadores (e também fizeram batota). Bilton mostra como se arranjam seguidores que são na realidade bots, identidades falsas que passam por pessoas reais, “likes” e comentários, comprados ou a hackers que tanto podem estar nos EUA como algures no Egipto ou na Sérvia, ou a bem organizadas e lucrativas empresas especializadas. O negócio da fama artificial no Instagram compensa bastante – e beneficia não só anónimos como também os que já são famosos.

Aprendemos igualmente como é fácil e pouco dispendioso simular, com a ajuda de uma pequena equipa e alguns bons conhecimentos, uma vida de luxo e lazer em mansões (alugadas à hora), piscinas de hotéis de cinco estrelas (encenadas no jardim de casa) e até mesmo vistosos destinos dentro e fora de portas (basta um fundo natural ou urbano convincente). Uma das empresárias do Instagram entrevistadas teve, quando era influenciadora, uma muito seguida e elogiada conta sobre Nova Iorque. Cidade onde nunca pôs os pés, e que fazia na Califórnia, onde vive. É o mundo da encenação, do faz-de-conta, do parecer, da ilusão glamorosa.

A experiência de Nick Bilton acaba por não resultar em pleno, e assim frustrar parcialmente o objectivo do filme, porque dois dos candidatos a influenciadores acabam por desistir. Wylie por medo de um troll que descobre o esquema e o interpela na net, Chris por se sentir desconfortável e querer vingar “por mérito próprio”. Restou Dominique, cujo percurso compensou em parte as desistências dos dois colegas, já que chegou aos 25 mil seguidores (quase todos falsos) e começou a receber produtos de graça para promover no Instagram e um convite com tudo pago para uma viagem a Los Angeles com outras influenciadoras. Ou será melhor chamar-lhes porta-vozes e montras ambulantes e acríticas de marcas?

O documentário termina abruptamente, com a chegada da pandemia da Covid-19, que impede Dominique de ir numas apetecíveis férias oferecidas. Mas que parece não existir para muitos influenciadores do Instagram, que continuam a postar fotos como se as suas vidas, e o mundo, estivessem exactamente na mesma. Nick Bilton introduz, no final, menções ao activismo político-social no mundo online, para fazer o contraste com a futilidade, o hedonismo e o comercialismo da subcultura dos influenciadores, mas resulta forçado, postiço e desnecessário. O ponto de Fake Famous já estava feito, mesmo apesar da experiência que preside ao documentário não ter sido totalmente conseguida.

Escrito por
Eurico de Barros
Publicidade
Também poderá gostar