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Maestro

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Maestro
Photograph: Netflix | Carey Mulligan and Bradley Cooper in ‘The Maestro’
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A Time Out diz

3/5 estrelas

Realizado por Bradley Cooper, o filme é muito bom a falar da vida pessoal de Bernstein e no papel fulcral da sua mulher. Embora sacrifique outras dimensões.

Para muitos amantes de música clássica, o primeiro contacto com ela foi através dos Concertos para Jovens, do maestro Leonard Bernstein, que a RTP passou em Portugal. Grande e natural comunicador, Bernstein era um exímio “explicador” de música, e fazia-o com um entusiasmo contagioso. Acabados os programas, só nos apetecia ir à procura de mais informações sobre os compositores que tinha referido e as peças que tinha tocado com a orquestra, e ouvi-las. Este Bernstein apresentador, divulgador e pedagogo está, infelizmente, quase ausente de Maestro, o filme de e com Bradley Cooper no papel do dito. 

Também o Bernstein activista político progressista não aparece, embora Cooper compense estas omissões com uma exploração da intimidade pouco convencional, da personalidade complexa e da vida conjugal do maestro (o primeiro americano de projecção internacional), compositor, pedagogo, apresentador, divulgador e professor. E bissexual promíscuo, da juventude à velhice, apesar de casado e pai de filhos (dos quais sempre procurou escamotear a faceta de incansável atleta sexual com maior tendência para os homens).

Realizado por Bradley Cooper com uma vivacidade, uma agitação, uma urgência e uma expansividade que espelham as do próprio Bernstein – um narciso e um hiperactivo que emanava tanta vaidade quanto simpatia, que tinha uma necessidade quase doentia de estar rodeado de pessoas, e que o realizador e actor exprime do ponto de vista cinematográfico com uma destreza visual gímnica mais própria de uma fita de acção do que de um filme biográfico –, Maestro interessa-se, no entanto, não apenas pelo carismático Lenny, mas também pela sua mulher, a actriz Felicia Montealegre (Carey Mulligan).

A certa altura, apercebemo-nos que Maestro passou a ser sobre ela. Não é por acaso que é a última pessoa a aparecer na fita, e que o nome de Mulligan surge primeiro do que o de Cooper na ficha técnica. Não ficaria mal ao filme intitular-se O Maestro e a sua Mulher, tal é a atenção que se dá a Felicia, ao amor que devotou a Bernstein ao longo de décadas de casamento, e ao estoicismo, à paciência e à compreensão para com um marido adúltero contumaz, que achava natural trazer os seus jovens amantes para passar fins-de-semana com a família na sua casa de campo. “Tu não fazes ideia o quanto precisas de mim, pois não?”, pergunta Felicia a Leonard a dado momento. E décadas mais tarde, avisa-o: “Se não tens cuidado, vai morrer uma bicha velha e solitária.” Maestro confirma que há verdade no velhíssimo cliché: “Por trás de um grande homem há sempre uma grande mulher.”

Bradley Cooper consegue meter-se na pele de Leonard Bernstein, ao ponto de por vezes não conseguirmos discernir se é ele que estamos a ver, ou se são imagens de arquivo do maestro. Como acontece na sequência que recria o concerto em que regeu a 2.ª Sinfonia de Mahler, na Catedral de Ely, em Inglaterra, em 1973. Dir-se-ia Bernstein em tudo, do aspecto ao modo largo, efusivo e dramático de reger, com uma entrega total que o levava a suar rios. Mas é Cooper. E Carey Mulligan é notável na forma como consegue transmitir o que quer que seja – paixão, admiração e ternura, ou incómodo, abnegação e sofrimento – com uma discreta e consumada economia expressiva. Veja-se apenas o misto de enlevo e arrebatamento com que ela olha para o marido na citada sequência na Catedral de Ely.

É impossível encaixar todas as facetas da vida de Leonard Bernstein em duas horas de filme. Por isso, Bradley Cooper recorreu, em Maestro, àquelas sequências convencionais em que se procura sintetizar em dois ou três minutos um determinado aspecto ou uma certa fase da vida do biografado, e que nunca resultam muito bem. Ao escolher esta abordagem mais íntima e centrar o filme na figura de Felicia Montealegre, o realizador sacrifica a dimensão de pedagogo e de homem envolvido nas grandes questões políticas e sociais do seu tempo, e a do músico sobredotado e do compositor de gostos elásticos que fez a ponte entre a música popular da Broadway e a música clássica, que conseguia falar dos Beatles e de Bach com o mesmo à-vontade e a mesma clareza. Para encontrarmos e nos deleitarmos com este Leonard Bernstein que está apenas de raspão, ou por alguns minutos e a espaços em Maestro, temos que ir à procura dele nos discos, e na internet, via YouTube.

Escrito por
Eurico de Barros

Elenco e equipa

  • Realização:Bradley Cooper
  • Argumento:Josh Singer, Bradley Cooper
  • Elenco:
    • Bradley Cooper
    • Sarah Silverman
    • Carey Mulligan
    • Maya Hawke
    • Miriam Shor
    • Michael Urie
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