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Santiago, Italia

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Santiago, Itália (2018)
©DRSantiago, Itália de Nanni Moretti
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A Time Out diz

3/5 estrelas

As “geringonças” sinistras não são uma originalidade portuguesa. Em 1970, Salvador Allende congregou quase toda a esquerda chilena na candidatura presidencial que o levou ao poder, com o apoio essencial dos democratas-cristãos. Socialistas, sociais-democratas, comunistas e outros marxistas tomaram La Moneda pela via democrática, um feito extraordinário em tempo de golpes e revoluções, e em plena Guerra Fria, que gerou entusiasmo no país e
 um alarmismo despeitado em Washington. Entendendo que era preciso impedir que a experiência fizesse escola, o nefasto Richard Nixon pôs a CIA em campo para precipitar a queda do governo, o que acabou por acontecer de forma trágica a 11 de Setembro de 1973.

Neste regresso ao documentário, Nanni Moretti começa por mostrar o ambiente de festa que se seguiu à eleição, passa às divergências no seio da coligação e, quando damos por nós, já os militares saíram à rua para “restaurar” a democracia, bombardeando a capital, Santiago, e instaurar uma ditadura que durou até 1990. Allende suicida-se. Pinochet, o general que comanda as tropas, ordena a perseguição imediata
 de esquerdistas mais activos, que encontram na diplomacia italiana um refúgio e a possibilidade de uma nova vida, na Europa, ao contrário do que acontece com os migrantes do Mediterrâneo hoje. E é aqui que o realizador italiano quer chegar: a intenção nunca foi abordar aqueles anos de sonho materializado, que até inspiraram o “compromisso histórico” da política italiana nos anos 1970.

Moretti conversa com refugiados levados para Itália (daí o título), registando relatos cobertos de mágoa e frustração e saudade, entrecortando-os com imagens
 da época. E dá voz a dois militares, um dos quais condenado pelos crimes de rapto e homicídio, que afirma que só concordou em falar porque lhe disseram que seria uma entrevista imparcial. “Eu não sou imparcial”, responde-lhe o italiano, na única vez que aparece no nosso campo de visão. Ninguém esperaria que o fosse. Moretti é justo. Mas isso não basta para estar à altura dos seus pergaminhos. O relato das atrocidades é ralo.
 E é pena, porque um dos antigos refugiados, um ateu que se emociona ao falar do importante e esquecido papel do cardeal Raúl Silva Henríquez no combate à ditadura, até oferece um caminho que teria sido interessante ver o realizador de Habemus Papam percorrer.

Por Hugo Torres

Hugo Torres
Escrito por
Hugo Torres

Detalhes da estreia

  • Duração:80 minutos
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