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Passaram mais de 30 anos desde que uma das principais lojas e marcas ligadas ao mundo do skate e do surf em Portugal abriu portas numa das pontas do concelho de Cascais. Foi em 1992 que a Bana deu os primeiros passos em Sassoeiros (Carcavelos) – no espaço que ainda hoje ocupa mas que, com o passar dos anos, se tornou muito maior.
Com uma forte ligação à comunidade local, tanto encontramos o famoso circulo vermelho com letras brancas ao estilo grafitti da Bana num campeonato internacional de skate como num videoclipe de rap, na Semana da Moda de São Paulo ou numa série da Netflix, como aconteceu na primeira temporada de Rabo de Peixe. Tornou-se uma referência nacional e o seu legado continua a ser construído diariamente.
Muito em breve, adianta o fundador da marca, José Marques, a Bana vai relançar o seu site e celebrar o momento com um evento na loja – com um DJ set e a pintura de um novo mural na fachada. Até lá, contamos aqui a sua história.
Do graffiti aos campeonatos do mundo, a Bana pôs Sassoeiros no mapa
Hoje com 59 anos, José Marques começou a surfar na Praia de Carcavelos no início da década de 1980, durante a sua adolescência. “Bana era a minha alcunha do pessoal da praia, nunca pensei que fosse o nome de uma loja ou de uma marca”, conta à Time Out Cascais.

Criado em Sassoeiros, depois de fazer a tropa trabalhou em vendas e distribuição. Esteve no mercado dos discos até, por volta dos 24 anos, chegar às marcas internacionais de surf e skate. Enquanto vendedor, José fazia a ponte entre as marcas e as poucas lojas que na altura existiam em Portugal dedicadas a estes artigos.
“Foi o que me facilitou, porque, como trabalhava no meio, conhecia os fornecedores e o mercado. E de repente o meu pai deu-me um espaço pequenino, de 18 metros quadrados, que antes fazia parte do café dele. Era só um pequeno quadrado. Disse-me que, se eu quisesse, tinha um pequeno espaço para vender directamente ao público. E foi o que fiz.”
A Bana abriu então em 1992 como uma pequena loja multimarca de surf e skate, quando Sassoeiros era praticamente “uma aldeia”. “As pessoas sabiam o que era Carcavelos, mas Sassoeiros? Nem sabiam que existia. Com os anos isto foi crescendo, hoje há mais urbanizações e por sorte os liceus também foram abertos mais para estes lados.”
Na altura, a principal concorrência eram a loja Marmota, em Carcavelos; e as Windsurf Guincho, que depois seriam adquiridas pela marca Ericeira Surf Shop, também fundada na década de 1990. “No início, como dizia o meu pai, o surf era um desporto de gandulos”, ri-se José “Bana” Marques. “Agora é que o surfista já tem de ser uma pessoa com dinheiro, com grandes carrinhas e jipes. Na altura comprava-se tudo velho, em segunda mão.”

A Bana diferenciou-se desde o início pelo forte destaque que dava aos artigos de skate, um desporto associado ao universo do surf mas que muitas vezes tinha menos espaço e visibilidade nas lojas. “Chegavas a uma loja e se tivesse um skate ou dois já era bom.”
A par disso, José teve a visão de tornar a Bana num ponto de encontro local da pujante cultura urbana da Linha de Cascais. A Bana foi, por exemplo, uma das primeiras lojas em Portugal a vender latas de graffiti — e tendo em conta que a origem desta expressão artística em Portugal está tão associada a Carcavelos, onde vários adolescentes começaram a pintar no final da década de 80 até se tornarem nalguns dos mais influentes e importantes nomes do panorama nacional, estavam criadas as condições para que o legado da marca subsistisse, com uma forte ligação à comunidade. E também vendiam peças de algumas marcas de streetwear que não eram habituais nas lojas portuguesas.
“Enquanto os outros iam todos para a direita, eu fui um bocadinho mais para a esquerda. Se calhar também foi isso que me fez aguentar tantos anos, porque se tivesse ido atrás dos outros todos, era mais uma loja.”

A marca Bana surgiu pouco tempo depois da abertura da loja. Como forma de espalhar o nome, José Marques criou T-shirts, bonés ou gorros com os símbolos da marca. Inicialmente, tinham um sistema de pontos, em que se um cliente fizesse compras acima de um determinado valor, ganhava como oferta uma T-shirt ou um boné da Bana.
Eventualmente, a procura cresceu ao ponto de começarem simplesmente a vender as peças como se tratasse de mais uma marca — ao lado dos itens das grandes etiquetas globais. E as peças da Bana começaram a espalhar-se pelo circuito já que José Marques foi patrocinando skaters, surfistas ou músicos ao longo dos anos – um método que ainda hoje utiliza e que tem dado visibilidade e muitos frutos ao projecto.
O português Gustavo Ribeiro, um dos melhores skaters do mundo na actualidade, tem hoje 24 anos. Aos sete, ele e o irmão gémeo Gabriel já eram patrocinados pela Bana. Na música, José Marques apostou sempre no talento associado à cultura urbana, do hip hop ao punk rock. Plutonio, Kappa Jotta ou os Tara Perdida são alguns dos músicos que são ou foram patrocinados pela marca. “E apostei muito nos locais, até porque é uma forma de a malta se identificar com a zona. A Bana é quase um emblema da Linha.”
Com o passar dos anos, expandiu a loja e o espaço tem hoje uma área de 150 metros quadrados. “Agora já começo a receber os filhos dos clientes originais. Estou à espera dos netos”, diz José Marques.

Uma marca que também é uma escola – e o futuro da Bana
Durante uma boa década, já nos anos 2000, a moda do surf e do skate explodiu um pouco por todo o lado. Mesmo quem não pegava nas pranchas e nas tábuas, quem não se atirava às ondas ou aos halfpipes, usava roupas das marcas que se tornaram populares globalmente.
“Sobretudo as marcas de surf começaram a ficar muito comerciais, a vender a toda a gente, ficou muito mainstream. Eu sempre vi estes desportos como um nicho… E se se tivesse mantido no nicho, tinha-se mantido. Começaram a querer vender muito, a abrir mais e mais lojas, a vender peças nas lojas gerais de desporto, e o nicho deixou de achar piada porque andas igual aos outros todos, banalizou-se. Muitas dessas marcas de surf estão hoje na falência. Eu próprio tenho-me vindo a demarcar do surf e estou mais centrado no skate, embora ainda patrocine alguns surfistas.”
A aposta da Bana no skate tem sido tal que a marca patrocina a Liga Pro Skate, o campeonato nacional, e uma série de atletas que participam em provas internacionais. “Ganhamos sempre alguma coisa, trazemos sempre um caneco qualquer.”

Além disso, todos os anos dão aulas de skate como parte integrante da programação das festas de Carcavelos, em parceria com a junta de freguesia, e têm uma escola com aulas regulares no Parque das Gerações, em São João do Estoril; ou no skatepark do Bairro da Torre, em Cascais. Quem dá as aulas e gere a Bana Skate School, em parceria com José Marques, é o skater Pedro Roseiro, hoje um homem na casa dos 30 anos que começou a ser patrocinado pela marca quando tinha apenas 14.
Estabeleceram ainda parcerias com os colégios privados Oeiras International School e International Sharing School, já no concelho vizinho de Oeiras, onde dão aulas aos miúdos a partir dos quatro anos. “No Sharing, estamos com cerca de 60 alunos, ao nível da natação e esses desportos. No Oeiras International School, as aulas são mesmo curriculares, como parte de Educação Física.” Os atletas que fazem parte da escola e participam em competições representam o Cascais Skateboarding Club, o clube de skate da Bana, o único do distrito de Lisboa.
Quanto ao futuro e ao que lhe resta fazer, José diz que a única coisa que ainda não experimentou fazer com a Bana é calçado. “Foi a única coisa de vestuário que nunca fiz. Era capaz de ser giro, nem que fosse uma colaboração com uma marca qualquer. Cheguei a fazer T-shirts colaborativas com a Quiksilver e a Volcom.”

As suas peças têm corrido o mundo. Na última Semana da Moda de São Paulo, a fadista Bia Caboz apresentou-se com umas calças de ganga da Bana. A própria Madonna, nos anos em que viveu em Portugal antes da pandemia, passou pela célebre loja de Sassoeiros. “Nem sequer a reconheci, entrou aqui à procura de umas coisas e só falei com ela como uma cliente qualquer. Foi a mãe de um miúdo que aí estava que me disse: ‘É a Madonna!’”
A expansão da marca, com a abertura de mais lojas, também é um desejo antigo. Mas que se tem provado difícil de concretizar ao longo dos anos, sobretudo com o recente aumento do preço das rendas. “Seria uma maravilha hoje ter uma loja no centro de Lisboa, no Porto ou mesmo ali no Parque das Gerações. Os shoppings também sempre exigiram grandes rendas. Fomos sempre crescendo passo a passo e já muito fiz com o pouco que tínhamos.” Para breve, está prometido um novo site.
Estrada Sassoeiros, 24 A, Carcavelos. Seg-Sex 11.00-20.00; Sáb 11.00-19.00. 21 457 6683