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Cantina 32

  • Restaurantes
  • Flores
  • preço 2 de 4
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado
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    Fotografia: João SaramagoO prego
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    © João Saramago
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A Time Out diz

4/5 estrelas

A terminar a refeição a rapariga poisa o vaso no meio da mesa, como se fosse um elemento decorativo a acompanhar o café. O meu amigo, um indivíduo alienado como Eliseu (a peneira do Benfica) sorri, mas assinala: “Falta a sobremesa”. Ela contrapõe, vitoriosa: “O vaso é a sobremesa”. O efeito é extraordinário. Toda a gente ri do equívoco. De repente, já não é apenas comida – é teatro, é encenação, é recriação. É aquilo a que hoje se convencionou chamar cozinha emocional, e que se sintetiza assim: o que acontece na cabeça importa mais do que o que acontece no estômago ou, pelo menos, importa primeiro.

Começa então a desconstrução do cheesecake disfarçado (3,50€), colherada a colherada, duas crianças esgravatando o segredo. Há uma primeira camada de terra (chocolate Oreo em pó?), de onde brota a planta (rebento de tomilho); por baixo, um creme branco, consistência de iogurte; na base, pedaços de caramelo, banana. Mesmo não sendo original (nem a brincadeira do vaso, nem a combinação de sabores), a experiência resulta surpreendente.

Já tinha sido assim à entrada. Ao chegarmos ao restaurante houve logo uma sensação de espanto. O espaço, em noite chuvosa, prolongava o ambiente sombrio da Rua das Flores. Lá dentro tudo a meia-luz, tectos altos, paredes a imitar betão, quadros de figuras antigas, sinistras, longas patilhas – qual sótão de um palácio assombrado onde se arrumou mobiliário, livros, candeeiros inquinados e fotos de tetravós maléficos, com patilhas farfalhudas e laço ao pescoço.

Outro pormenor delicioso: as casas de banho. Aliás, as casas de banho dos restaurantes do Porto têm-se vindo a tornar numa das galerias de artes plásticas mais interessantes da cidade. Uma delas tem a indicação de um “6” a outra de um “9”(desenho?). Fica a dúvida, fica o humor: qual delas é dos homens, qual delas é das mulheres?

Já à mesa, nem tudo agradou, mas quase tudo tinha um pormenor interessante que salvava o conjunto. Exemplo logo a abrir: no couvert (3,60€) o pão era banal, a manteiga de banana e mel mais um doce do que uma manteiga, mas com flocos de flor de sal a dar contraste. Depois, as chips de mandioca (2,50€): estavam quase todas queimadas (há aqui um padrão), mas as que escaparam à incineração eram bem boas, finas como lâminas, crocantes. A mesma dicotomia na caldeirada de lulas (17€): na base do prato uma torrada demasiado torrada, por cima as lulinhas demasiado lulinhas e camarões pequenos demasiado pequenos; mas a mise-en-scène do caldo, servido numa chaleira à mesa, deu graça.

O que não teve qualquer “mas” foi o Bacalhau à Brás (7€). Nenhuma salvação. Embora servido numa sertã de ferro, surgiu cozido, deslaçado, morno. Também sem adversativa, agora em bom, o carpaccio de novilho (9,50€): a temperatura correcta, o tempero perfeito de azeite, pimenta e trufa.

O menu, de resto, é extenso, com propostas que tanto podem agradar ao Fernando Mendes (tripas, vitela de Lafões, francesinha), como à Sara Sampaio (salmão curado com mostarda, creme de abóbora).

Em síntese, esta Cantina 32 tem boas ideias, tem atmosfera e tem uma das decorações mais personalizadas do Porto. Nas comidas, algumas coisas boas mal executadas misturam-se com outras de grande efeito. Aplauda- se o risco, corrija-se a cozinha.

*As críticas da Time Out dizem respeito a uma ou mais visitas feitas pelos críticos da revista, de forma anónima, à data de publicação em papel. Não nos responsabilizamos nem actualizamos informações relativas a alterações de chef, carta ou espaço. Foi assim que aconteceu.

Alfredo Lacerda
Escrito por
Alfredo Lacerda

Detalhes

Endereço
Rua das Flores, 32
Porto
4050-262
Preço
Até 30€
Horário
Seg-Qui 12.30-15.00/ 18.30-23.00, Sex-Sáb 12.30-15.00/ 18.30-23.30
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