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  1. Quinta das Águias
    © João SaramagoOs cavalos Artax e Silver
  2. Quinta das Águias
    © João SaramagoNa quinta vivem cerca de 30 gatos, muitos resgatados pela associação Animais de Rua
  3. Quinta das Águias
    © João SaramagoOs cavalos Artax e Silver na Quinta das Águias
  4. Quinta das Águias
    © João SaramagoA alimentação vegetariana é um dos pilares da quinta
  5. Quinta das Águias, Paredes de Coura, Casa de Hóspedes
    ©João SaramagoA casa de hóspedes da Quinta das Águias
  6. Quinta das Águias, animais
    ©João SaramagoA porca Bolota já participou numa novela da SIC
  7. Quinta das Águias
    © João SaramagoO casal Ivone e Joep

Quinta das Águias: um refúgio com lugar para todos

Este projecto privilegia a sustentabilidade, o bem-estar de todos os seres e a biodiversidade. Conheça a Quinta das Águias, um refúgio com lugar para todos.

Escrito por
Bárbara Baltarejo
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Na Quinta das Águias, uma organização sem fins lucrativos em Paredes de Coura, vive-se devagar na companhia de 130 animais de diferentes espécies, todos em liberdade. A Time Out Porto foi conhecer este projecto que privilegia a sustentabilidade, o bem-estar de todos os seres e a biodiversidade, e conheceu o casal que ocupa os seus dias a cuidar de cavalos, ovelhas, porcos, pavões e outros animais; e a garantir as sustentabilidade dos próximos tempos, seleccionando e preservando sementes de plantas autóctones. Leia esta reportagem com uma chávena de café de especialidade nas mãos ou com um bule de chá dos Açores, por exemplo.

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Quinta das Águias: um refúgio com lugar para todos

Um santuário de biodiversidade
© João Saramago

Um santuário de biodiversidade

Os portões abrem-se e Ivone Ingen Housz e Zacarias, o carneiro mais bem-disposto da quinta, dão-nos as boas-vindas. A Quinta das Águias, um projecto de sustentabilidade sem fins lucrativos em Paredes de Coura, respira um ar gélido e húmido, típico da região durante o Inverno. Graças a ele, os tons terrosos e verdejantes das árvores e plantas rasteiras emolduram o cenário.

Dentro da casa de hóspedes em pedra está Joep Ingen Housz, ocupado a tratar de um molho de orégãos colhido na quinta. Com três quartos, duas casas de banho, cozinha e uma sala de estar – com grandes janelões em vidro rasgados na fachada, por onde entra um sol tépido de Fevereiro e que deixam ver os pavões que passeiam lá fora – o edifício faz lembrar as rústicas e familiares casas de campo minhotas. Nos cinco hectares em redor vivem cerca de 130 animais em liberdade e milhares de plantas em harmonia.

Ivone recua no tempo. “Começámos por trazer os animais que tínhamos no Porto, alguns cães e gatos. Entretanto, a minha filha Maria fundou a associação Animais de Rua e acolhemos outros animais. Vieram gatinhos, cães, porquinhos-da-índia, coelhos, galinhas. Foi assim que tudo começou”, conta, de olhos postos nos cavalos Artax e Silver, que comem milho tranquilamente.

Um rebanho de ovelhas observa atentamente as nossas mãos à procura de um petisco e, sem darmos por ela, encontramos uma enorme área de bosque. “Quando aqui chegámos, plantámos logo 700 árvores.” Não é por acaso que hoje aqueles cinco hectares são vistos como um santuário da biodiversidade. Há espécies exóticas e autóctones, como os carvalhos (que enchem o chão de bolotas, o aperitivo preferido da porca com o mesmo nome e das amigas Miss Piggy, Jelly e Belly). “Quase todas as plantas têm propriedades medicinais ou um uso alimentar. Também é nosso objectivo atrair abelhas, pelo importante papel que têm no ecossistema”, explica a psicóloga de 62 anos.

A sua paixão pelas plantas é evidente. Sem qualquer placa informativa, reconhece-as e sabe de cor as suas características. Para Joep, os pais farmacêuticos de Ivone estão na origem desta paixão, uma vez que curavam os pacientes recorrendo às suas propriedades.

Antes de o sol desaparecer da paisagem bucólica, os animais são recolhidos pelas funcionárias Cinda e Lurdes. Cada espécie dorme numa área pensada especialmente para ela. No regresso a casa, fala-se sobre a Camellia sinensis (a planta do chá), os tremoceiros, os vários tipos de hipericão, os azufaifos, a vinca, a malva, o plantago, a erva-de-são-roberto, a toranjeira e o diospireiro. Tudo cultivado lá. Ivone recolhe criteriosamente folhas e ervas para fazer uma infusão, o herbal tea Quinta das Águias, muito apreciado por quem o bebe.

A cozinha vegetariana
© João Saramago

A cozinha vegetariana

Joep põe mais lenha nas salamandras para garantir que a casa continua quente durante o jantar, que começou a preparar enquanto passeávamos. “Chegou a hora da minha meditação”, diz o holandês de 72 anos, com um sorriso. Entretido a descascar e a cortar cebolas, alhos e outros vegetais, defende que a sua filosofia na cozinha “é que a comida deve ser fácil, saborosa e saudável”. A receita da lasanha para esta noite está no livro Semear o Futuro, publicado pelo casal em Outubro de 2019. Para ambos, a comida ocupa uma parte muito importante. É encarada como uma fonte de bem-estar e de harmonia com os seres vivos e com o planeta.

Ivone e Joep são vegetarianos e têm promovido este estilo de vida através de diferentes iniciativas em Paredes de Coura, desde 2004, altura em que aqui se instalaram. O Congresso Internacional CouraVeg, que geralmente acontece em Setembro, é exemplo desse trabalho. Tem trazido à pequena vila, com menos de 10 mil habitantes, nomes como Kip Andersen, realizador do documentário Cowspiracy; o advogado e autor especializado em direito dos animais Steven Wise; ou Patrik Baboumian, o bodybuilder vegan com o título de homem mais forte da Alemanha e um dos mais fortes do mundo. “Achámos que era importante numa região de produção de carne haver um evento que desse a conhecer mais este mundo do vegetarianismo e o município recebeu muito bem a ideia”, recorda Ivone, referindo-se ao início do projecto, em 2015.

De volta à cozinha, Joep monta a lasanha, já com o forno aquecido. Leva massa integral, estufado de legumes com beringela, curgete, cenoura, espinafres, cogumelos e tomate, e um molho branco feito com creme de caju, leite de soja, levedura nutricional e farinha de espelta. Uma delícia.

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O casal Ivone e Joep

Durante o jantar, o casal explica como se conheceu. “Eu costumava frequentar retiros budistas em França. Foi lá que conheci o Joep, através de uns amigos franceses. Um dos mestres que costumava acompanhar veio ao Algarve, então perguntei a esses amigos por que é que não vinham a Portugal vê-lo. Eles vieram e o Joep também...”, conta Ivone de olhos postos no marido, que abana a cabeça em sinal de aprovação. “Naquela altura havia poucas pessoas a trabalhar em informática e, embora eu tivesse começado a trabalhar na Holanda, tive a oportunidade de ir para Paris gerir um projecto em 1969”, acrescenta Joep.

O ronronar do gato Nick e o crepitar da lenha ouvem-se enquanto Ivone continua a história. “Tínhamos uma vida bastante activa e, então, quisemos mudar-nos para um sítio com muita natureza, onde pudéssemos estar mais tranquilos. Procurámos no Algarve, em Ponte de Lima, em Viana do Castelo, mas quando vimos esta quinta, que estava abandonada há 40 anos, apaixonámo-nos”.

Baptizaram-na de Quinta das Águias, em homenagem às aves que a sobrevoavam, e abriram as portas à comunidade dez anos mais tarde, em 2014. “Era egoísta ter um espaço com imensa natureza só para nós. Então, decidimos receber retiros de yoga e de meditação.”

Hoje funciona como alojamento local, recebe retiros e promove eventos para a comunidade através de parcerias com instituições como a Câmara Municipal de Paredes de Coura ou a Santa Casa da Misericórdia. Além do CouraVeg, também organizam eventos mais pequenos, como os Open Days, anunciados através do Facebook, em que abrem as portas da quinta para dar a conhecer o projecto. Há ainda o Clube Vegetariano, um grupo informal que se junta mensalmente para cozinhar com o Joep.

O respeito pela natureza
© João Saramago

O respeito pela natureza

Ivone põe na mesa quatro muffins, uma das especialidades de Joep mais apreciadas. São de chocolate e, claro, feitos sem ovos, leite ou qualquer ingrediente de origem animal. Entretanto, debatem-se problemáticas ambientais. “Não usamos nada químico. Para alimento da terra usamos o estrume dos nossos cavalos e seguimos os princípios da permacultura, agricultura biológica e agroforestry, temos uma combinação”, descreve a psicóloga.

A permacultura é uma forma de cultivo permanente em que se respeitam os padrões e as características das plantas nos ecossistemas naturais. Já a agroforestry (agrossilvicultura, em português) estuda os benefícios de cultivar árvores em conjunto com produções agrícolas. Ambas melhoram os solos e trazem mais biodiversidade.

Ivone fala ainda de outras medidas: “Temos painéis solares na casa de madeira onde vivemos; aqui, na casa de hóspedes, temos bomba de calor, um sistema que consome muito menos electricidade; e salamandras que usamos com a lenha das árvores que vamos cortando”, enumera, enquanto afaga a cadela Juma. 

A par dos cuidados que têm para diminuir o impacto no ambiente, Ivone e Joep são responsáveis por uma autêntica arca botânica, preservando sementes de diferentes plantas raras e autóctones. Para que não se percam, são partilhadas na Feira de Troca de Sementes, que acontece em Paredes de Coura, organizada em parceria com a autarquia. “O título Semear o Futuro para o livro não foi escolhido por acaso”, nota, enquanto remexe nas sementes de feijão pousadas em cima da mesa. 

A noite já se instalou e o casal despede-se. Joep confessa que segue o ritmo da natureza. “No Verão gosto de me deitar cedo e de acordar às 05.30 da manhã. Tenho o meu bio-relógio a funcionar”, diz, antes de sair em direcção à casa de madeira onde vivem. Alguns dos cerca de 30 gatos, resgatados de diferentes situações de risco, seguem-nos, mas Nick fica para trás. Preferiu dormir connosco.

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A sustentabilidade do projecto
© João Saramago

A sustentabilidade do projecto

Ao nascer do dia, a mesa está pronta para o pequeno-almoço. Há pão integral de fermentação natural feito pelo Joep, granola caseira, compotas, café, leite de soja e manteiga vegetal. Tudo isto trazido silenciosamente pelas funcionárias Cinda e Lurdes, que começam a jornada de trabalho pelas 08.00.

Com o estômago reconfortado, acompanhámos a rotina matinal da quinta. “Não temos dias típicos. Os dias acabam por ser sempre diferentes do que planeamos”, adverte Joep. Enquanto caminhamos em direcção aos espaços dos animais, os primeiros a receber a atenção do casal pela manhã, conversam sobre as despesas associadas à quinta e sobre a sustentabilidade do projecto, que, apesar de funcionar como alojamento local, não tem fins lucrativos.

“Temos que gerir muito bem o dinheiro, porque os custos são enormes com a alimentação dos 130 animais, os cuidados veterinários e a manutenção do espaço”, aponta Ivone. “O que nos vai dando algum rendimento são os padrinhos dos animais, as pessoas que fazem donativos, o alojamento e o nosso calendário solidário, que fazemos todos os anos”, explica. As contas da organização podem, aliás, ser consultadas no site da Quinta das Águias.

O tempo passa depressa por cá, até porque há sempre coisas para fazer. Ao almoço, Joep saca de mais uma refeição vegetariana deliciosa da manga. Desta vez, comemos dahl vegetariano, uma espécie de sopa indiana, boa para fazer frente ao frio do Minho; esparguete integral com legumes “à carbonara”; e, para terminar, muffins de laranja e chia. Tudo muito bom.

As mudanças no estilo de vida do casal – ela era psicóloga, ele gestor de projectos na área da informática – tornam-se o tema da conversa. “Agora, a nível material, somos muito mais simples, mas trabalhamos para construir um mundo melhor”, defende Joep. Ivone acrescenta: “A verdade é que quando nos instalámos aqui estávamos muito concentrados em nós. Hoje, estamos bem mais felizes e a nossa vida é muito mais rica agora que temos mais interacção com a comunidade local e com os hóspedes. Somos mais felizes”.

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