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Nova Dança Portuguesa
© José FabiãoTalvez ela pudesse dançar primeiro e pensar depois, de Vera Mantero

“Na Nova Dança, a imaginação é de facto o limite. Essa é uma das suas grandes conquistas”

A Gulbenkian prepara-se para dedicar um longo ciclo de performances, filmes, conversas e conferências à Nova Dança Portuguesa. A entrada é livre.

Raquel Dias da Silva
Escrito por
Raquel Dias da Silva
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A Fundação Calouste Gulbenkian vai dedicar um ciclo inteiro, programado por um período alargado de mais de três meses, à Nova Dança Portuguesa. Com curadoria de João dos Santos Martins, Ana Bigotte Vieira, Carlos Manuel Oliveira e Ana Dinger, dança não dança – arqueologias da Nova Dança em Portugal reúne dezenas de coreógrafos e artistas contemporâneos para mostrar, em dez sessões agrupadas tematicamente, as diferentes manifestações de dança que reflectem e marcaram o século XX e o início do século XXI. A programação, que se prolonga até Fevereiro do próximo ano, compreende vários eventos – performances, filmes, conversas e conferências –, bem como um livro e uma exposição. O arranque está marcado para 30 de Outubro, às 18.00, com “Os Portugueses não têm corpo”, que inclui em estreia absoluta Almada Negreiros, o bailarino, do coreógrafo e bailarino Luís Guerra, e a obra de Vera Mantero Talvez ela pudesse dançar primeiro e pensar depois, um solo fortemente baseado na improvisação, que será dançado por Paulina Santos, bailarina da Companhia Nacional de Bailado. No final, haverá conversa entre os coreógrafos e a solista.

O ciclo agora apresentado é resultado de uma pesquisa iniciada em 2016, no âmbito de Para uma timeline a haver – genealogias da dança enquanto prática artística em Portugal, um exercício colectivo que procurou sinalizar marcos relativos ao desenvolvimento e à disseminação da dança como prática artística em Portugal entre os séculos XX e XXI. “A pesquisa surgiu de um convite do Teatro Viriato [em Viseu], para coreografar um encontro entre alguns dos artistas que fizeram parte da geração da Nova Dança Portuguesa. Foi isso que acabou por lançar as bases para o projecto com a [historiadora] Ana Bigotte Vieira”, esclarece João dos Santos Martins, que procura expor uma história até agora “bastante inacessível enquanto cultura coreográfica geral”. “Esta edição [a 7.ª do projecto, que já teve apresentações em Santarém, Porto e Coimbra, por exemplo] serve também para questionar o que é a Nova Dança aos olhos dos diferentes tempos, e o que vamos apresentar são sobretudo performances de dança, onde a ideia de dança está colocada em causa ou é expandida.”

Para o bailarino e coreógrafo, uma das conquistas da Nova Dança, na forma de pensar e na forma de estar, tem que ver com a rejeição de conceitos estreitos do corpo. “Estreitos no sentido de predefinição de o que é que deve ser a dança, o que é que deve ser um espectáculo, o que é que deve ser uma investigação”, explica. “O que a geração da Nova Dança fez foi quebrar esses paradigmas, que eram operativos em companhias de repertório, que era o que existia sobretudo em Portugal no final dos anos 80, como a Companhia Nacional de Bailado, a Companhia de Dança de Lisboa e o Ballet Gulbenkian. Na Nova Dança, estabeleceu-se uma cena independente, onde tudo é possível, onde a imaginação é de facto o limite, e essa para mim é uma das suas grandes conquistas, sobretudo porque implicou [a implementação de] novos processos para a dança, onde se interage com ideias de improvisação, de experimentação com o corpo, de relação com os objectos, e também de entender a dança não como uma disciplina pura, mas sim como um lugar de cruzamento entre várias práticas artísticas.”

Na primeira sessão do ciclo dança não dança, a 30 de Outubro, vai procurar interrogar-se o lugar do corpo na sociedade portuguesa, traçando-se um arco entre o modernismo do início do século XX e os anos 1990, momento inicial da Nova Dança Portuguesa. Segue-se, a 5 de Novembro (15.00) um dia dedicado às “Danças Livres”, para revisitar as práticas de euritmia dos anos 1920-1930 e a disseminação de nus artísticos pelos palcos de então e de hoje, através de duas conversas – “Danças Livres”, com Sofia Neuparth, Ana Paz e alunos da Escola de Dança do Conservatório Nacional, e “Nus Artísticos”, com Ana Borralho, João Galante, Ary Zara, Gaya de Medeiros e Izabel Nejur – e três performances – Coração-mão, de Sofia Neuparth com a Escola de Dança do Conservatório Nacional; No body never mind, 002, de Ana Borralho e João Galante; e A Boca de Atlas, com Gaya de Medeiros e Ary Zara.

Na semana seguinte, há duas sessões, uma a 12 de Novembro, a partir das 15.30, e outra a 15, a partir das 19.00. A primeira, “Escola-Revolução”, inclui a exibição do filme Révolution École 1918-1939, de Joanna Grudzinska, e uma conversa em torno de Madalena Perdigão, figura incontornável da história da Gulbenkian e da vida artística portuguesa. A segunda, “Sujeitos Desiguais”, explora por sua vez o lugar da mulher na sociedade em geral, e na portuguesa em particular, com duas performances  – Lágrima, de Olga Roriz pela Companhia Nacional de Bailado, e Visita Guiada, de Cláudia Dias – e uma conversa entre ambas as artistas. Segue-se, ainda em Novembro, uma sessão no dia 19, a partir das 10.30, que procurará explorar a relação entre “Transmissão, Coreografia e História”, através de Das possibilidades da conservação de performance, uma conferência-conversa por Hélia Marçal; Envoltura, história e síncope, uma conferência-performance por Isabel Naverán; e da exibição do filme Yugoslavia: How ideology moved our collective body, de Marta Popivoda.

No mês de Dezembro, há mais três sessões temáticas: “Il Faut Danser Portugal”, no dia 3, a partir das 17.00, com duas performances e uma conversa, para abordar o termo “portugalidade”; “Ballet Gulbenkian: Variações”, no dia 10, a partir das 15.30, com um filme, uma performance (que é uma recriação  e uma conversa, tudo em torno da companhia histórica; e “Coreografia Expandida”, no dia 17, a partir das 16.00, com uma performance e uma conversa, que homenageia “um gesto de abertura e de experimentação traçado colectivamente nos anos 1980, a partir de uma vontade de Paula Massano”. “[No dia 10] há um visionamento do filme Um Corpo que Dança [de Marco Martins] e apresentado uma revisitação ou reimaginação de Ritmo/Violento, que foi uma das primeiras peças apresentadas pelo Grupo Experimental de Ballet, que é um antecessor do Ballet Gulbenkian, e este convite foi endereçado ao coreógrafo Rei Cabral”, destaca a artista e investigadora Ana Dinger, que também assina a curadoria.

“Um dos trabalhos que também vai ser apresentado é uma peça do artista plástico António Olaio [Il Faut Danser Portugal, no dia 3, às 17.00], que foi apresentada pela primeira vez em Paris, em 1984, na altura dos dez anos da Revolução de Abril. O enunciado dele, que é o título do trabalho, é uma espécie de convite à dança, como se dissesse ‘Portugal, dançar é preciso’, ou seja, é preciso continuarmos a mover-nos para a manutenção desta ideia de liberdade e das conquistas que foram feitas”, acrescenta dos Santos Martins, que chama a atenção para o facto de Olaio não ter formação em dança, mas sim em pintura.

Já em Janeiro de 2024, duas sessões sob o mote “Desenterrar Memórias da Dança”, que toma o nome de uma conversa sobre a emergência de corpos negros dançantes na história do país, e que terá repetição a 4 de Fevereiro. Antes, haverá ainda uma sessão a 17 de Janeiro, dedicada a “Estes Corpos que nos Ocupam”, isto é, “ideias-feitas de corpo, espectáculo, vivente, organismo e dança”. “Mas é importante dizer que o programa não se limita às performances, aliás, as performances foram pensadas como um programa paralelo à exposição, que devia inaugurar em simultâneo, mas que foi adiada para Novembro do próximo ano, com muitos materiais de arquivo e muita presença de audiovisual”, revela Martins. “Vamos ter ainda o lançamento de um livro-catálogo, que vai ser um objecto importante para a dança em Portugal, como o maior livro sobre dança contemporânea publicado em Portugal, também com uma vontade de continuar estas histórias e com a ideia de História da dança, que não é limitada à interpretação de uma pessoa, uma vez que temos mais de 20 convidados a escrever.”

Fundação Gulbenkian. 30 Out 2023-4 Fev 2024, vários horários. Entrada gratuita (em alguns casos sujeita ao levantamento de bilhete no próprio dia), à excepção da performance Idiota, de Marlene Monteiro Freitas (10€)

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