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'O Grande Dia da Batalha', dos Artistas Unidos, estreia esta quinta-feira

Escrito por
Miguel Branco
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É a nova criação dos Artistas Unidos, que estreia quinta-feira, 18 de Janeiro, no Teatro Nacional D. Maria II. Falámos com o encenador Jorge Silva Melo, que andou às voltas com Gorki e com o seu Albergue Nocturno para aqui chegar. 

Há sempre alguém que tem de varrer. Os outros estão para ali – entre beliches, mantas, tapetes e garrafas – entre jogos de cartas e corridas para a taberna. É gente sem papéis, chutada para uma cave onde o frio se combate a shots, onde o tempo não corre e a batota é lei única. 

Cem, duzentos, milhares, que tanto são aqueles trolhas russos, que Gorki sugere em Albergue Nocturno – do qual Jorge Silva Melo partiu, em reescrita, para chegar a este espectáculo – como são os esquecidos do Mediterrâneo, em coletes salva-vidas fluorescentes, em barcos furados. É esse digladiar perante a efemeridade, perante o esquecimento das infinitas almas suspensas que a escrita de Jorge Silva Melo acrescenta a Gorki. É O Grande Dia da Batalha que nunca chega e que se estreia esta quinta-feira no Teatro Nacional
D. Maria II. 

Para o encenador este “é um texto prodigioso que instaura um teatro sempre em plano de conjunto, quase sem protagonista, um mundo vindo do romance ou dos jornais. É impressionante como Gorki consegue manter uma dúzia de personagens em cena com os destinos cruzados e visíveis”. Perante essa luminosidade – escura, que só tem cor nas vestes tradicionais das personagens –  Jorge Silva Melo dá-nos dois planos no mesmo rosto: primeiro uma tríade subversiva, uma mulher (Vassilissa, por Inês Pereira) com um casamento azedo, que disputa o amante (Pepel, por Rúben Gomes) com a irmã (Natacha, por Vânia Rodrigues); depois um sem-fim de perdidos: um actor alcoólico (José Neves), um serralheiro apático (Klestch, por João Estima), um jovem que carrega uma concertina (Aliochka, por João Pedro Mamede), a quem, para Jorge Silva Melo já “quase nada acontece, tudo já aconteceu”, descreve, antes de acrescentar: “Tentei que eles se levantassem e dissessem que continuam perdidos,  sem abrigo, sem porto”. 

E ainda sobra um outro plano narrativo, aquele em que uma trupe, de gente sem nome nem profissão, debita, em coro, à boca de cena, o que é. E eles são os que morrem, são Aleppo, são Raqqa, são Mogadíscio, são as ruínas e os corpos em trânsito e que, através da escrita de Jorge Silva Melo, ganham voz. 

Pois. Sim. É tudo isto no mesmo albergue, no mesmo depósito de nada, na morada de ninguém e nunca ninguém foi tanta gente. Também há Luca (Ricardo  Aibéo) um peregrino cadastrado, uma nova esperança que se prontifica a varrer, a confrontar, a querer atenuar o real. E nós sem nada saber:  “Quem é? De onde veio? Gorki não conta: é também esse o mistério desta peça. Estes homens estão diante de nós e são anónimos”, aponta. Podemos até continuar sem saber, mas saberemos, de certeza, não esquecer.

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