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Sir Roger Moore, o “Santo” legítimo e o James Bond de luxo

Escrito por
Eurico de Barros
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Era filho de um polícia e de uma dona de casa. Queria ser pintor mas fez a agulha para actor quando descobriu que não tinha talento e que ser “extra” em filmes pagava bem e dava acesso a um mundo inimaginado. Quando era estudante de teatro na prestigiada Royal Academy of Dramatic Art, o grande dramaturgo, actor e compositor Noel Coward disse-lhe que não tinha o menor jeito para representar, mas como era “um homem devastadoramente bonito”, devia aceitar todos os papéis que lhe propusessem, sobretudo os que pagassem bem. Quando se transformou uma estrela internacional, um crítico escreveu que ele era tão mau actor, que precisava não só de um “duplo” para as cenas de acção como também para as cenas sem acção.

Sir Roger Moore, que morreu na Suíça, aos 89 anos, de cancro, nunca se levou muito a sério como actor (“Tenho três expressões: sobrancelha esquerda levantada, sobrancelha direita levantada, e as duas levantadas ao mesmo tempo”), nunca ligou muito às críticas (“Precisava de ter duas casas só para guardar as más”) e dizia com sincera modéstia que devia 99% da sua fama “à sorte” e que ficou mundialmente conhecido graças a apenas dois papéis. Primeiro, o de Simon Templar, “O Santo”, na televisão, na década de 60, e depois o de James Bond, o agente 007 de Ian Fleming no cinema, em sete filmes, rodados entre 1973 e 1985: “007-Vive e Deixa Morrer” (1973), “007-O Homem da Pistola Dourada” (1974), “007-Agente Irresistível” (1977), “007-Aventura no Espaço” (1979), “007-Missão Ultra-Secreta” (1981), “007-Operação Tentáculo” (1983) e “007-Alvo em Movimento” (1985).

Moore foi o terceiro James Bond, depois de Sean Connery ter originado o papel no cinema, e a seguir ao catastrófico George Lazenby, que só durou um filme. Uns acham que foi um dos piores 007 de sempre. Outros, o melhor. O que importa é que Sir Roger Moore foi um Bond diferente, instilando-lhe traços da sua personalidade, e características não só do Simon Templar de “O Santo”, como também de outra personagem que fez na televisão, o lorde Brett Sinclair de outra série policial, “Os Persuasores” (1071-72), onde contracenou com Tony Curtis. Moore interpretou 007 num estilo totalmente diferente do forte e feio de Connery.

Foi como se um aristocrata inglês com uma educação refinada e um forte sentido de humor (que era também o do actor), tivesse vestido a pele da personagem do agente secreto mais cosmopolita  implacável de Sua Majestade. O lado implacável foi atenuado e o lado cosmopolita e humorístico mais cultivado. Onde alguns torceram o nariz, outros aplaudiram, e apesar de ter sido o actor mais velho a assumir a personagem de James Bond (tinha 45 anos quando a interpretou pela primeira vez, e 56 quando lhe disse adeus), Sir Roger Moore é hoje o 007 preferido de uma vasta legião de “bondianos”. E até escreveu, além de dois saborosos livros de memórias, um outro sobre 007 no cinema, “Bond on Bond” (2014).

“O Santo” e os filmes de James Bond tendem, naturalmente, a ofuscar outras coisas meritórias que Sir Roger Moore fez, como é o caso, na televisão, da série histórica “Ivanhoe” (1958-59) ou da citada “Os Persuasores”, ambas exibidas pela RTP. E, no cinema, de filmes que interpretou antes, durante e depois da sua estadia  na figura de 007. Entre os melhores estão “A Luta de um Homem” (1970), de Basil Dearden, de “Armadilha Internacional”, de Peter Hunt (1976),  “Os Gansos Selvagens” (1978),  “Assalto no Alto Mar” (1980) e “Os Comandos de Sua Majestade”  (1980), todos de Andrew V. McLaglen, “O Mistério de um Rapto”, de Bryan Forbes (1984).

Numa das últimas entrevistas que deu, disse, com o seu proverbial bom humor e a sua reconhecida modéstia: “Passei a minha vida a interpretar heróis porque tinha ar de herói. Praticamente todos os papéis que me ofereceram pouco mais exigiam do que fizesse de mim próprio. Adorava ter interpretado um vilão a sério.” Permita-nos discordar cordialmente, Mr. Bond… Perdão, Sir Roger.

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