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‘Very Typical’: três peças para turista ver

Escrito por
Miguel Branco
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Turista e não só. A Ribeira, espaço da companhia Primeiros Sintomas, no Cais do Sodré, acolhe, de hoje a domingo, três espectáculos de autores portugueses representados em inglês

Somos proficientes a dizer mal. Que os turistas nos estragam a ida para o trabalho, que o metro está sempre cheio, que as ruas têm trânsito constante, que é tudo mau nesta Lisboa gentrificada. E quando nos vamos obrigar a reflectir sobre isso? Eis a proposta de Lígia Soares, Sónia Baptista e Ricardo Vaz Trindade. 

Very Typical é um projecto que une três peças, cada qual escrita e interpretada pelo seu autor, e que vão ser apresentadas em bloco na casa dos Primeiros Sintomas. Que, convém explicar, tem tudo a ver com este projecto. Ou seja, a localização da Ribeira, a sua rara proximidade à agitação da rua, a sua inscrição numa área privilegiada percorrida por estrangeiros, fez emergir este conceito no Cais do Sodré.

Algumas destas criações já foram apresentadas previamente. “Quando estive aqui a apresentar o ‘Romance’, em português, havia imensa gente que entrava e perguntava o que estava aqui a acontecer e eu não tinha nenhuma peça em inglês, para lhes oferecer”, conta Lígia Soares. E se fazemos menus de restaurante em inglês, se promovemos visitas guiadas em trinta línguas distintas, porque não proporcionar teatro a gente que quer consumir a cultura local? 

Very Typical é, sobretudo, um conceito que provoca a questão comunicativa. Como é que estes três criadores vão ter público? “Isso é o que a gente vai testar agora. Temos expectativa que esta possa ser uma realidade plausível. Acreditamos que grande parte do público que vamos ter pode vir dos flyers que vamos entregar aqui à porta. Este sítio é geograficamente privilegiado”, explica Lígia. Já Ricardo Vaz Trindade garante que já têm algumas reservas: “Diria que vamos ter muito público português, pessoas ligadas ao teatro, até porque a oferta cultural em Agosto é baixa. Algumas destas pessoas dizem que vão trazer amigos estrangeiros, que vivem cá ou que estão de passagem.”

Falamos de três peças curtas, apresentadas em dois blocos. No primeiro, pelas 19.00, apresenta-se Romance, de Lígia Soares. O espectáculo tem a duração de 50 minutos, há um intervalo para mudança de cenário, no caso dos artistas, e para jantar, no caso dos espectadores. Às 21.30 retoma-se a festa com Today, Is It a Squirrel?, de Sónia Baptista e Rang-a-dang, de Ricardo Vaz Trindade.

Romance, de Lígia Soares, foi feito em residência artística na Mala Voadora, local onde viria a estrear. Passou depois por Palmela e aqui pelos Primeiros Sintomas, sempre em português. Parte de uma ordem da artista, que que está de pé, circundada pelos espectadores, e começa por sugerir (de uma forma bastante sugestiva) coisas como “diz que me amas”. “Decidi criar várias vozes, situações de contracena, situações argumentativas. Sendo que com este dispositivo as pessoas se vão apercebendo que esta peça apela à sua participação. Há quase um comando, uma coisa mimética para que repitam aquilo que estou a dizer, é um acto performativo sobre dizermos aquilo que nos é dado a dizer”, explica a autora e intérprete.

Segue-se Sónia Baptista e Today, Is It a Squirrel?, espectáculo feito a partir da experiência de ter mudado de cidade. Baseia-se em três actividades que a artista tinha como prioritárias em Londres: andar, ler e escrever. Diz Lígia Soares: “é uma peça ligada à observação do corpo e da acção. É um testemunho da sua estranheza em relação à cidade, nostalgia e saudade. Fala de Londres em relação a Lisboa e agora é apresentada em Lisboa, sobre Londres”.

Rang-a-dang é um pequeno monólogo que Ricardo Vaz Trindade decidiu tirar da sua obra Traz a promessa de voltar ao lugar de partida, elaborada em 2016 no Laboratório de Escrita para Teatro do Teatro Nacional D. Maria II. Fala de uma mulher que quer ser tudo, “quer ser actriz, quer ser modelo, quer subir na vida”, descreve Ricardo. 

É fácil de ver que as três obras são bastante distintas na sua génese. Mas une-as o interesse em provocar, o gosto por dizer, para gente que nem sempre pode ouvir devido à barreira linguística. É aquele Very Typical que o Zézé Camarinha não diria.

Ribeira, Primeiros Sintomas. Rua da Ribeira Nova, 44 (Cais do Sodré). Sed-Dom 19.00 + 21.30. 10€ (cada sessão); 15€ (as duas sessões).   

+ Teatro: as peças a não perder em Agosto

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