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Duquesa
©Renato Cruz Santos

Duquesa traz o 'Norte Litoral' a Lisboa

Nuno Rodrigues é a Duquesa de que se fala. O cabecilha dos Glockenwise traz o 'Norte Litoral' ao MusicBox Lisboa na sexta-feira

Luís Filipe Rodrigues
Escrito por
Luís Filipe Rodrigues
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Duquesa é a personagem que Nuno Rodrigues, vocalista e guitarrista dos Glockenwise, encarna quando se apanha em palco e em estúdio sem a banda de garage rock com quem toca desde a adolescência.

Falámos uns dias antes da apresentação do novo disco, Norte Litoral, no MusicBox.

Da última vez que falámos, no ano passado, estavas a considerar estagiar num escritório de advogados. O que estás a fazer agora?

Desde que terminei a licenciatura, para aí em 2013/2014, que andei só a tocar. Não fazia mais nada. Mas estava aborrecido por não ter o que fazer entre as nove e as cinco, como as pessoas normais, e decidi arranjar um trabalho a sério (risos). E agora estou a estagiar. Mas acabei por não seguir o caminho tradicional, por não ir para uma sociedade de advogados fazer coisas chatas. Estou num escritório pequeno no Porto. Fazemos várias coisas porque é importante que tenha contacto com as áreas todas durante o estágio. Mas a minha área de interesse é a propriedade intelectual e os direito de autor.

Conseguias viver só da música, se quisesses?

Os meus únicos rendimentos neste momento são da música, visto que não recebo nada pelo estágio. A maior parte dos estágios em advocacia não são remunerados. Por isso continua a ser apenas a musica. Não é uma vida muito glamorosa, mas é fixe ter esse sustento. Ainda por cima a fazer uma coisa de que gosto. 

Como é que equilibras a música e esse trabalho das nove à cinco? O teu patrono não se importa que te baldes ao trabalho para dar entrevistas e filmar vídeos?

Ele tem uma relação com a música. É um apreciador.

Um apreciador de Duquesa?

Não sei se é fã de Duquesa, mas conhece. É sócio de um bar no Porto, tem uma relação com a boémia e a música. Não me parece que vá surgir nenhum conflito. Há um entendimento quanto a isso. 

Algumas faixas deste Norte Litoral têm uma onda meio anos 80 que não reconhecíamos na tua música até agora. De onde é que veio isso? 

Tem a ver com várias coisas. É evidente que tenho prestado atenção a artistas a que dantes não ligava tanto. Tinha pouco contacto com essa década, e o que me chegava era tudo muito cheesy. Mas na verdade é uma época prolífica em excelentes artistas. É muito interessante. 

Este disco é muito diferente do EP de 2014. O primeiro era mais solar, mais luminoso. Este é um disco mais lunar.

Não tinha interesse em voltar a fazer o mesmo. Ia correr o risco de me repetir. Em Duquesa tenho oportunidade de fazer aquilo que me apetece, e pareceu-me adequado do ponto de vista estético fazer coisas diferentes, e daí ter desde baladas ao piano a canções muito rítmicas à anos 80. Não há nenhum compromisso estético, por isso o disco fica meio a soar a mixtape. Gosto disso. Além disso tive a oportunidade de encarnar uma personagem um bocadinho mais profunda, artística. Porque também tenho vinho a conhecer melhor essa personagem que é Duquesa, nos concertos e com o passar do tempo. Tenho percebido melhor quem é essa personagem e o que quero que ela diga. Este disco é a primeira concretização, a primeira materialização, disso. 

Falas em Duquesa como uma persgonagem. Porquê?

Será sempre diferente de mim, porque isto também é uma arte performativa. Subir ao palco tem tanto de teatro como de honestidade. E Duquesa tem muito de mim, mas também é algo mais. Se em Glockenwise estou mais à vontade, de calças de ganga a fazer barulho e a contar piadas, aqui assumo outros contornos, ligeiramente mais melodramáticos e teatrais. Gosto de explorar isso. Para ser o Nuno Rodrigues já sou o Nuno Rodrigues normal o resto do tempo. Se vou subir ao palco para fazer alguma coisa, prefiro que haja espaço para haver outras vozes, outras intenções.

Outra novidade do novo disco é cantares em português pela primeira vez. Foi difícil?

Foi relativamente natural, na verdade. Quando escrevi as canções pareceu-me que a voz devia ser portuguesa. A grande dificuldade foi perceber como é que funcionava a métrica em português e assim, porque as letras saíram mais ou menos de forma natural. Talvez porque não são muito complicadas, porque são bastante honestas.

Lembro-me de te perguntarem, há uns anos, porque é que não cantavas em português e de dizeres que não era natural para ti. O que mudou entretanto?

Não foi uma decisão consciente. Não acordei um dia e decidi cantar em português. Só que a primeira frase que me saiu da boca, quando estava a fazer aquelas canções, foi em português. Nunca me tinha acontecido e pensava que nunca me fosse acontecer. Mas fiquei contente, porque nunca tinha escrito nada minha língua-mãe. E agora podem surgir muito mais coisas, visto que já está o precedente instituído (risos).

Vais continuar a cantar em português, portanto.

Sim e nem tem de ser exclusivamente em Duquesa. 

O primeiro avanço do disco, o “Norte Litoral”, é muito diferente de tudo o que fizeste antes. Não tiveste medo de fazer uma coisa tão diferente?

Não. É evidente que foi um bocadinho esquisito escolher aquela para ser o primeiro avanço do disco, mas fi-lo por isso mesmo. Introduzia a ideia de cantar em português e não desvendava ao que o disco soava. Achei que era perfeita por isso. Apesar de não ser nada radiofónica, foi a que deu mais que falar porque introduziu todas essas novidades.

De facto, foi muito falada e acho que foi bem recebida. Pelo menos foi muito partilhada no Facebook. Surpreendeu-te?

Eu achei isso curioso, porque era a música mais arty do disco. A canção é muito contemplativa e o videoclip é muito pausado. Mas houve muita gente que se identificou com o tema. Gente de fora, gente que tem uma relação com o Norte Litoral. A canção está longe de ser uma ode ao Norte Litoral, e até falo de coisas más, mas as pessoas preferem ignorar isso, porque é alguém a falar da terra delas. Não estava mesmo à espera disso. Até na Galiza houve gente a partilhar a música. Eles também são norte litoral e também se identificam com essa ideia, mesmo no contexto espanhol deles e tendo em conta a relação deles com a portugalidade... Bom, agora portugalidade não é uma palavra que esteja muito na moda (risos). Foi feita uma apropriação cultural do termo.

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Já foste estrear este disco ao Brasil. Como correu? Estreei em São Paulo, no Rio e em Portalegre. No Rio as pessoas aproveitaram para exteriorizar um bocadinho o sentimento que têm neste momento em relação à situação política que o Brasil atravessa. Então, quando chegou a altura de tocarmos... Vou adivinhar: quando chegou a altura de tocar o Cálice. Precisamente, na altura em que tocámos o Cálice. Começaram a gritar "fora (Michel) Temer". Os petistas (apoiantes do PT) e os coxinhas (alcunha pejorativa para um conservador), como eles dizem por lá, a protestar uns com os outros. Tive de interromper a música, esperar que se acalmassem e voltar ao início. Lidaste bem com isso? Já estava à espera que acontecesse.  O Chico tem sido uma pessoa contestada, pela posição política que assume. Ele diz que agora aquilo já está mais calminho. Diz que anda na rua, chamam-lhe filho da puta mas que isso não lhe faz grande diferença. As abordagens já foram mais violentas. Agora a situação está mais normalizada. Ele esteve lá? Não. Eu acho que ele quis fugir um bocadinho a essa coisa. Ele já não é uma pessoa que goste muito de aparecer. Em alturas destas então... Ele aliás saiu do Brasil. Na altura em que estivemos lá ele estava em Paris.   Que é um dos refúgios dele... Sim. É para onde ele foge normalmente. Como é que foi a sensação? Uma coisa, imagino, é cantar a música do Chico aqui, outra diferente será cantar lá. Foi boa. A ideia do disco sempre foi, única e exclusivamente, home

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Bowie 70 é um disco com muitas camadas e dimensões, tal como o músico que homenageia. É um álbum de David Fonseca, que fez todas as versões e tocou todos os instrumentos. Mas não só. É uma celebração da diversidade das vozes portuguesas de hoje, que acompanham o maestro Fonseca. Mas também é mais do que isso. É uma elegia cantada por mulheres e homens que reconhecem a influência de Bowie e dão voz à música dos Davides. E isso talvez seja o mais importante. Falámos sobre isto tudo com David Fonseca. Falámos sobre David Bowie. Falámos sobre Bowie 70.   Como é que soubeste da morte do Bowie? Como é que recebeste a notícia? De uma forma muito moderna. Tinha tido uma noite muito longa, a trabalhar, e deitei-me tarde. Estava na cama e o telefone teve um daqueles avisos, onde se lia: “David Bowie morreu.” Eu pensei: “Esta malta passa-se, isto não é verdade. Que parvoíce.” E fui dormir. Depois o telefone começou a tocar insistentemente a partir das dez da manhã e vi que alguns jornalistas me estavam a ligar. Foi aí que percebi que aquilo devia ter mesmo acontecido. Fiquei triste, obviamente. Estamos a viver um momento, e o ano passado foi pródigo nisso, em que muitas das nossas referências musicais enquanto miúdos desaparecem. E é um choque. Quando essas pessoas desaparecem, uma pessoa tem sempre a sensação, ou pelo menos eu tenho, que o mundo fica mais pobre.  E como é que que nasceu este disco, o Bowie 70? Isto surge num almoço simples entre mim e a Paula Homem, a presidente

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  • Rap, hip hop e R&B

Conversámos com um dos nomes maiores do hip-hop nacional enquanto bebia um chá na Champanheria do Largo. Ainda disponibilizou uma fita métrica para servir do suporte do gravador. Slow J é um artesão sem medidas fixas.   Posso perguntar-te porque é que tens uma fita métrica no bolso?  Tenho que levar um móvel e preciso de saber se cabe no carro.  Estás em mudanças, é isso?  Ya, mudei-me há duas semanas para a Parede. Antes estive seis meses no Cais do Sodré a fazer uma residência artística, tinha o quarto e o estúdio pegados, num espaço que se chama Lost Lisbon. Tinha um ambiente muito fixe... Foi aí que fizeste parte do disco?  Sim. Antes já tinha estado 5 ou 6 meses no estúdio do Fred [Ferreira, produtor].  Quanto tempo levaste para fazer este disco?  Dois anos.  Chega?  Mais ou menos... saiu-me mesmo do corpo. Foi a primeira vez que investi tanto tempo numa cena minha e o balanço agrada-me. O disco ultrapassou as minhas expectativas e ao mesmo tempo vivi bem... passei por grandes experiências.  Essas experiências levaram-te a escutar o Presidente Mujica, ao ponto de teres dois samples do homem no disco?  Identifiquei-me muito com as ideias do gajo, os samples que estão lá vêm especificamente de um documentário que é o Human, não sei se já viste... Confesso que não.  Vale a pena. É um documentário que filma pessoas pelo mundo inteiro, sempre num fundo preto, e com histórias de todo o tipo, desde o Mujica até um perfeito anónimo com experiências humanas fortes.

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