Bowie 70 é um disco com muitas camadas e dimensões, tal como o músico que homenageia. É um álbum de David Fonseca, que fez todas as versões e tocou todos os instrumentos. Mas não só. É uma celebração da diversidade das vozes portuguesas de hoje, que acompanham o maestro Fonseca.
Estreia a 10 de Junho a série do Canal História Portugal Desconhecido que em 24 pequenos episódios vai pôr a nu o país, da cultura às personalidades e gastronomia. As filmagens já arrancaram e na Mouraria gravou-se o episódio “O Fado”, com a ajuda de Cuca Roseta. As filmagens foram parar à rubrica Bastidores da revista que chega amanhã às bancas. E, porque quisemos saber o que anda a tramar a fadista, a entrevista veio parar aqui.
Li no teu site oficial que acreditas que cada um de nós tem uma missão na vida. A tua acabou por ser o fado. Mas alguma vez o taekwondo ou a pintura se tentaram meter no caminho?
Acho que tudo aquilo que escolho fazer são paixões. Também tenho uma paixão pelo yoga. Um dia que tenha menos concertos espero poder dedicar-me mais ao taekwondo. O yoga é bom, porque consigo levá-lo para todo o lado. Para a pintura não tenho tanto jeito, a verdade é essa. Tenho uma família de artistas em termos de pintura e escultura e sou a que pinto pior. Mas é uma coisa que me dá muito gozo, aquele momento de expressão. Por isso faz-me muita falta chegar a casa, agarrar no pincel e pintar.
Mas só pintas para ti?
Só para mim, não mostro. Depois tenho vergonha.
E se tivesses de pintar o Fado, como o fez José Malhoa, como o representarias?
Isso é interessante. Não sei...
Se calhar numa próxima vez podemos falar sobre isso.
Há uma palavra que está intimamente ligada ao fado. Se pudesse resumir o fado numa palavra seria “inverdade”. E por isso a minha pintura deveria ser sempre à volta disso, porque acho que quem canta o fado procura expor a sua verdade, escondendo sempre um pouco. O facto é que há uma entrega do que nós somos.
Voltando a este destino, que encontraste tarde na vida, em comparação com outros fadistas, foi aqui na Mouraria que o encontraste?
Por acaso não. A minha primeira casa de fados chamava-se a Academia das Bifanas, ali na Rua Artilharia 1. Foi aí que cantei fado durante um ano, todas as sextas.
Quanto a discos de estúdio. A história diz que a Cuca Roseta lança um álbum de dois em dois anos, desde o primeiro em 2011. Não sei se é de propósito...
Agora não vai ser! Já estou a fazer o quarto e por acaso íamos lançar agora. O meu primeiro disco foi lançado a 21 de Março, o segundo passou para Maio... tem sido sempre nesta altura. Mas acho que agora vamos esperar mais tempo. Tive sempre um problema nos outros discos: tive de fazê-los de forma muito rápida. E acho que um disco é algo que fica para sempre. Claro que faz parte do caminho, à medida em que vão saindo discos, irmos melhorando algumas coisas. É preciso errar para consertar. E queria fazer este disco com mais tempo.
E há um conceito associado a esse novo trabalho?
Há sempre um conceito ligado à Natureza. A grande beleza do fado é quando ele é natural, sem máscaras. Por isso também gosto deste paralelismo. Não há nada mais belo e mais forte. A Natureza mexe muito comigo. O primeiro disco Cuca Roseta, tinha uma pena na capa, o segundo chamava-se Raiz e o terceiro Riû. E agora o quarto vai ter a ver com “luz”. O conceito ainda não está todo montado, mas a imagem será essa.
Tens feito parcerias muito interessantes, com músicos internacionais e até com um chef. E agora? Quem mais gostarias de desafiar?
Eu adoro encontros entre artistas, quando as pessoas juntam as suas artes, sejam quais forem. Fado e flamenco, fado e pop, fado e electrónica até. Que seja. É muito interessante. A verdade é que nunca os procurei. Foram pessoas que naturalmente vieram ter ao meu caminho. Sou um pouco assim. Vivo um dia de cada vez, não crio muitas expectativas. E acho que nada acontece por acaso, mas sou uma lutadora. Por exemplo, conheci o Bryan Adams como fotógrafo para a capa da Vogue. E pensei “não vou perder esta oportunidade de lhe pedir uma música e uma fotografia para o meu disco”. Outro exemplo: o Djavan sempre adorei e não o procurei, ele apareceu. Os artistas que mais admiro já estão mortos: The Beatles, The Queen, o Nat King Cole, o meu preferido de sempre. Um dueto com ele já não dá.
Já foi feito.
Já foi feito depois de morto, não é? [risos]. Mas há uma artista que eu gostava muito de me cruzar, que é única. Gosto muito da Maria Bethânia. Vamos ver se a vida me leva para isso ou não. Vou aproveitando as oportunidades, a saboreá-las, agradecê-las e vivê-las por inteiro.
Uma vez cantaste para o Papa Bento XVI o "Avé Maria Fadista". Agora vem a Portugal o Papa Francisco. Que música escolherias para ele?
Se calhar preferia cantar o "Avé Maria" do Frei Hermano. É uma música que me acompanhou desde pequenina. Fui convidada para ir às Jornadas Mundiais da Juventude e tinha um encontro marcado com o Papa Francisco. Mas não pude ir, porque me marcaram um concerto no dia seguinte. Acho que é a música que me tem marcado desde sempre. Quando a canto, leva-me a momentos da minha vida desde pequena que me trazem sempre boas recordações.