[title]
A um dia da inauguração, marcada para esta quarta-feira ao final da tarde, ainda se ultimam os preparativos para abrir o Pavilhão Julião Sarmento à cidade. A espera foi longa. A obra chegou a ter conclusão prevista para o Verão de 2023. Dois anos depois, vai ser mesmo desta que a colecção pessoal do artista português poderá ser vista pelo público.
Isabel Carlos, crítica de arte e curadora, assume a direcção artística do espaço, mas também o trabalho curatorial por trás da exposição inaugural. "Trabalhei pela primeira vez com o Julião Sarmento em 1992. Tínhamos uma relação que era, diria, musculada. Discutíamos, porque o Julião era muito assertivo e eu também posso ser muito assertiva. Mas, por isso mesmo, tínhamos muito respeito um pelo outro – eu pela obra dele e penso que ele por mim, como curadora e como amiga", refere Isabel Carlos, na véspera da inauguração.

"Take 1" é a primeira exposição. Dividida em três pisos, é no segundo e último andar que as obras – 88, de um acervo que conta com cerca de 1500 – assumem uma tónica nas afinidades artísticas e pessoais de Julião Sarmento. Quatro anos após a morte do artista, Isabel evoca a emoção como primeiro patamar da razão, segundo o pensamento de António Damásio. Mais do que uma escolha meramente académica, o processo curatorial foi também um processo emocional.
"É uma colecção de afectos, porque muitas destas obras são de artistas que eram amigos do Julião e muito próximos. Daí que haja, por exemplo, casais de artistas – o Juan Muñoz e Cristina Iglesias, o Glen Rubsamen e a Rita McBride. Temos colaboração entre artistas – a Fernanda Fragateiro que intervém a partir de uma fotografia do Abílio Leitão, uma fotografia do Julião e da Isabel, a mulher dele, a dançarem. Aliás, numa pose muito cinematográfica", aponta a curadora, sobre as obras expostas no último andar.

Num campo onde predominam as relações pessoais entre artistas, curadores, e entre artistas e curadores, a escolha das obras reflecte a forma como o círculo de amigos e contactos, do domínio do privado, contribuiu para a construção de uma colecção de arte, maioritariamente assente em ofertas e trocas. À entrada é a imagem do próprio artista a dar as boas-vindas, num retrato de José Manuel Costa Alves. John Baldessari, Nan Goldin e Andy Warhol são outros dos nomes que aqui encontramos. "É uma celebração desta ideia de que a vida é arte e a arte é vida, muito dos anos 70 e da geração do Julião. Mas é também uma celebração do próprio Julião – os amigos, o amor, a festa", remata.
Descidas as escadas – onde encontramos peças de Rui Chafes e Juan Muñoz –, chegamos a um andar intermédio, uma mezzanine com vista para a galeria do piso térreo, equipada com mesas e bancos para sentar, conversar ou trabalhar. Um espaço aberto ao dispor dos visitantes, lado a lado com Amour Aveugle, fotografia de Geneviève Cadieux, de olhar projectado sobre as obras do piso inferior.

"A escolha foi orientada pela ideia de arquitectura, de casa", assinala Isabel Carlos. Exemplo disso é a grande peça em destaque – Crown Hall/Dragon House, de Ângela Ferreira, que cruza a obras dos arquitectos Mies van der Rohe e Pancho Guedes. Há semelhança da própria colecção, também a galeria está repleta de nomes sonantes da arte contemporânea – David Hockney, Adriana Varejão, Catherine Opie, entre muitos outros, convivem na mais ampla galeria concebida por João Luís Carrilho da Graça, responsável pelo projecto de arquitectura do Pavilhão Julião Sarmento.
A cave assume-se como o mais experimental dos espaços, mas também como o "levantar do pano do que será a programação futura deste espaço, com o cruzamento de linguagens, nomeadamente o cinema, a imagem animada, o vídeo e a performance", como refere Isabel Carlos. Num espaço pouco iluminado, ganha destaque Dragon Head, performance de Marina Abramovic.

Já fora do edifício está Azul Cadoiço, peça de Julião Sarmento, cedida pela família do artista. Criada no âmbito do projecto Primeira Pedra, é uma réplica em grande escala do Cinzeiro Cubo, de Bruno Munari, feita em calcário, assente em paletes de madeira. Arte que transborda as paredes do mais recente polo de arte contemporânea da cidade. No final de Junho, Belém assiste a mais uma inauguração. No edifício ao lado, outrora conhecido como Galeria Avenida da Índia, vai expor-se a colecção de arte contemporânea da Câmara Municipal de Lisboa.
Avenida da Índia, 172 (Belém). 21 838 3350. Ter-Dom 11.00-19.00. 4€ (entrada livre até 8 de Junho)
🏡 Já comprou a Time Out Lisboa, com as últimas aldeias na cidade?
🏃 O último é um ovo podre: cruze a meta no Facebook, Instagram e Whatsapp