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Agora é possível seguir os passos do livro Levantado do Chão, publicado em 1980, que acompanha uma família alentejana, os Mau-Tempo, ao longo de várias gerações, desde o início do século XX até 1975. A história foca-se nas más condições oferecidas aos trabalhadores rurais e nas lutas políticas que travaram pelos seus direitos. Este Audio Walk Tour – Levantado do Chão, que agora chega a Lisboa, acompanha o Roteiro Literário Levantado do Chão, da Câmara Municipal de Montemor-o-Novo, é uma criação da cooperativa cultural eborense Trimagisto. E pode ser escutado aqui.
“Caro viajante, seja bem-vindo. Ate bem os sapatos e caminhe até à oliveira. Levante um pé à vez e caminhe neste chão. Falemos de Saramago e de Levantado do Chão, pois claro. Por mais que mergulhe nos sons, não deixe de levantar a cabeça para perceber o lugar que o rodeia. Tome atenção às ruas, às pessoas, aos carros, às pedras no caminho e ao volume dos auscultadores. Não se deixe atropelar e não tropece. E por favor, não caia. É que levantar do chão… custa.” São as primeiras palavras deste verdadeiro teatro auditivo, narrado por vários actores profissionais e musicado por Carlos Marques, director artístico de um projecto mais alargado chamado Rise Up – Levantado do Chão, que arrancou em 2014 em torno desta obra de Saramago, tendo já vários capítulos autónomos no passado, entre teatro, música, leituras ou sessões de contos.
O Audio Walk Tour – Levantado do Chão tem quatro faixas áudio em Lisboa, as primeiras, e 15 em Montemor-o-Novo. Pode ouvir em casa, mas o convite é que saia à rua e siga os passos desta história, interpretada por Joana Manuel, Diogo Andrade, Natália Luíza, António Fonseca, Nuno Nunes e o próprio Carlos Marques, também autor da banda sonora que acompanha o espectáculo. Em Lisboa, seguimos os passos de João Mau-Tempo, membro da segunda geração da família central desta história, um jovem revolucionário preso e torturado pelo Estado Novo.
Se a primeira faixa em Lisboa começa mesmo em frente à Fundação José Saramago, onde se encontra a oliveira sob a qual foram depositadas cinzas do Nobel português, a segunda paragem é feita na Praça do Comércio e a terceira no Museu do Aljube, outrora Cadeia do Aljube, por onde passaram muitos presos políticos. Esta primeira etapa, antes de rumar a Montemor-o-Novo (em casa ou mesmo em pessoa) termina com uma faixa que o desafia a procurar um “lugar agradável”, que pode ser mesmo o banco público que está mesmo em frente ao museu, enquanto espera que João saia da cadeia, após meses de clausura. Mas não vai ter de esperar tanto tempo.
Carlos Marques explica-nos que este roteiro tem “uma preocupação não turística, é uma obra de arte” que conta em voz alta a obra de Saramago. Um “processo louco”, descreve Carlos, o mentor deste percurso que não deixou nada ao acaso. Por exemplo, o tempo de cada faixa foi testado para bater certo com o roteiro, mesmo que pelo caminho encontremos semáforos que não nos deixam atravessar a rua a gosto. Às vozes dos actores e à música que faz parte deste roteiro, foram acrescentados sons da cidade, pelo que é recomendado (mas não obrigatório) que percorra as ruas das cidades em horas de menor movimento. Afinal, o silêncio num espectáculo vale ouro.