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'Ex-zombies: uma conferência' estreia esta quinta-feira no D. Maria II

Escrito por
Miguel Branco
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Em Ex-zombies: uma conferência, de Alex Cassal, a distopia é máscara para a relação humana com o outro. Sugerimos que vá de gola alta, que esconda o pescoço. 

Já dizia Lili Caneças: “Estar vivo é o contrário de estar morto”. Sim, com aspas e tudo, pois se estamos numa conferência convém ter uma carteira de autores para citar – e aqui há outros, de José Afonso a Robert Kirkman –, para aumentar a veracidade intelectual da coisa. Sobretudo quando é a última de todas as conferências de um mundo já dominado por zombies, cujo último reduto que se conhece é a sala de cenografia do Teatro Nacional D. Maria II. Ex-zombies: uma conferência, com encenação de Alex Cassal, estreia esta quinta-feira e por lá fica até 27 de Março. 

Estamos na sala de cenografia – que só por si já é abordagem curiosa, com figurinos a fazer de paredes – perante uma mesa típica de conferência, microfones a meia haste, peças de frutas para quando apertar a fome, livros que suportam a coisa, aquele ambiente coloquial que se manifesta no discurso e no corpo, querem-
-se costas direitas e voz bem projectada. Quatro conferencistas especializados em zombies prometem-nos teses inteiras sobre as criaturas: como reconhecê-los, técnicas de defesa e ataque, tudo. 

O brasileiro Alex Cassal, há um par de anos em Portugal, cedo se interessou por esse imaginário distópico, “não o final, mas o que acontece com aquele grupo de sobreviventes que tem de reinventar as regras sociais, a ética, a justiça, o afecto”, explica. Mas o que mais trouxe para este Ex-zombies: uma conferência é a metáfora, o zombie como outro, como pouco imediato, no fundo, “a nossa relação com o que vem de fora, com aquele que não sou eu”, afirma Cassal. O mesmo que considera a preocupação de postal algo mais profundo do que parece: “Quando o Manuel Coelho diz ‘mas eu reciclo o meu lixo, como peixe, eu me importo com os gays, com os refugiados, eu estou implicado’. Ele não está sendo hipócrita, ao mesmo tempo ele tem preocupações mais urgentes: como é que vou tomar uma posição activa com os refugiados quando estou com medo de perder o emprego?”

Vai tudo direitinho, ordenado, como uma conferência exige. Vai até ao ritual de transformação do conferencista-estagiário em zombie – escolha completamente aleatória –, que depois disso, segurem-se.  Da ordem temos caos, tijolos a voar, um pântano de melancia, até croissants servem para matar humanos. 

Eis que flutuam as temáticas restantes, o empobrecimento, o capitalismo selvagem, acção-reacção. Ui. Temas talvez demasiado profundos de abordar enquanto se foge de conferencistas cada vez mais zombies, de dentes autónomos. Para isso mais vale morrer. E desatar a matar.

Teatro Nacional D. Maria II (Sala de Cenografia). Qua 21.30. Qui-Sáb 19.00. 6-12€

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