A Time Out na sua caixa de entrada

Procurar
Restaurante, Essencal, Cozinha Francesa, Bairro Alto
©Duarte DragoEssencial

Experiências pós-Covid: para jantares no Essencial vale a pena sair de casa

No Bairro Alto, um pequeno restaurante insiste no molho de champanhe, no foie e no Paris-Brest. Uma maravilha, garantimos.

Alfredo Lacerda
Escrito por
Alfredo Lacerda
Publicidade

Fim-de-Semana, hora de jantar. Um casal de namorados passeando de mãos dadas no meio da estrada, lentos e contemplativos por entre o casario de estendal, como num passeio museológico. Ao fundo, na esquina do costume, comerciantes de psicotrópicos e sucedâneos sem turistas a quem vender. Bares de portas fechadas, lugares para estacionar, silêncio. Não cheira a cerveja com xixi, nem a haxixe com óleo de fritar batatas. Eis o Bairro Alto pós-pandemia.

Cortando para a Rua da Rosa, a mesma melancolia, quase tudo fechado e escuro. A luzir só o restaurante Essencial, reaberto há dias. Em Março, a pequena casa de André Lança Cordeiro estaria já cheia ao início da noite. E haveria na sala muitas cabeças louras e muitas línguas. Agora, 100 por cento de lotação tuga, ainda por chegar.

No ar uma certa gravidade, o copeiro em fundo à espera de louça, o chef e sua cozinheira, Leonor Sobrinho, debruçados sobre a placa de indução, a arrancar com a alquimia. Vemos tudo porque a cozinha está entre nós, uma ilha na sala, quadrangular, forrada a lioz, no topo panelinhas e frigideiras prontas a fazer molhos e reacções de Maillard – duas das coisas mais belas da cozinha, dois trunfos deste Essencial.

Carta curta, como sempre foi, mas agora com pequenas alterações. Pode optar-se por um de dois menus – o cliente escolhe entre alguns pratos da lista. O menu mais curto (35€) dá direito a entrada, prato e sobremesa. O mais ambicioso (55€) traz três entradas, um prato e uma sobremesa.

A ideia parece ser controlar custos, sem cortar qualidade. Suspeito que a factura para o cliente é mais ou menos a mesma, mas com isto Lança Cordeiro dispersar-se-á menos e poupará mão-de-obra. Faz muito bem.

É ele quem vem entregar o foie gras em três pimentas, um clássico da casa, ao lado pão brioche torrado para acamar o dito, e doce de alperce (acidez, muita) para domar a gordura de fígado. A entrada do menu do meu amigo tem outra toada. Fatia de salmão curado ali, o aneto equilibrado; as ostras anunciadas no título invisíveis no molho lácteo; o daikon em lâminas estaladiças e frescas. Terra, mar e textura. Grande prato.

Nos principais, a codorniz perfeita, tenra mas elástica, dourada no ponto, acompanhada de salsifi, raiz prima da pastinaca subtilmente cozinhada, tudo ligado por um jus onde entram ossinhos da ave e vitela. Num tachinho à parte, puré a sério, sem invenções nem excessos natosos, noz moscada bem presente, tanto conforto.

Vem também o peixe galo com molho de champanhe. Tranche alta, só chicha, molho branco feito de esqueleto de peixe fumado e puxado com natas – “poucas”, garante Lança Cordeiro, enquanto descarrega o molho já na mesa. Bom mas não tão bom como o resto da refeição: peixe esfriado (o próprio prato sem estar aquecido), o coração de alcachofra com uma ou outra folha fibrosa por descartar.

Sobremesas, Essencial, Mil-Folhas
Mil Folhas do Essencial©Duarte Drago

A terminar, duas das sobremesas em que Lança Cordeiro é exímio – e que já haviam feito furor no Hotel Nau Palácio Governador e no Local, restaurantes onde o chef se deu a conhecer em Lisboa, depois de experiências em França. Mil-folhas com caramelo salgado, telhas finíssimas e amanteigadas. Igualmente maravilhoso o Paris-Brest, roda de massa choux e creme de avelãs — pastelaria clássica francesa no seu melhor.

No fim, uma sugestão: a sala podia ter luzes mais baixas, dando mais intimidade e criando uma separação com a bancada da cozinha, aí sim, onde devem estar todos os focos.

Em síntese. André Lança Cordeiro faz excelente comida de inspiração francesa, sem berlicoques e sem overdose de lípidos. Tem manteiga e tem natas e tem reduções, mas tudo civilizado, um compromisso saboroso de conforto e surpresa. Lamenta-se a ausência da sua famosa terrina de pâté em croûte da carta, mas sabe-se que a lista mexe-se com as estações e com a cabeça do chef. Uma óptima cabeça.

Rua da Rosa 176 (Bairro Alto). 21 157 3713. Dom-Seg 19.00-23.00. Preço: 50 – 60€.

+ Este restaurante no meio da floresta é perfeito para refeições com distanciamento social

Ainda não leu a nova Time In Portugal? Leia aqui grátis a edição desta semana

Últimas notícias

    Publicidade