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Se não és lésbica, como é que te chamas?
© Bruno SimãoSe não és lésbica, como é que te chamas?

Três lésbicas entram num bar. O resto é História

‘Se não és lésbica, como é que te chamas?’ explora a origem e os contornos das palavras que descrevem a comunidade lésbica. Escrita e encenada por Alice Azevedo, estreia no TBA a 21 de Fevereiro.

Escrito por
Beatriz Magalhães
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Estamos num bar. Um bar lésbico, por sinal. Três mulheres frequentam este bar. Três mulheres lésbicas, por sinal. Não sabemos os nomes delas, nem de onde vêm, tão-pouco importa. A única coisa que é para aqui chamada é a sua orientação sexual. São lésbicas. Mas, há que perguntar porquê. Antes de se identificarem como lésbicas, que nome lhes era atribuído? Como se chamavam as lésbicas do passado? Que palavras eram usadas para identificar de quem se gostava, quem se amava? Se não és lésbica, como é que te chamas?, peça teatral escrita, encenada e interpretada por Alice Azevedo, pretende explorar estas questões e está em cena no TBA, entre 21 e 24 de Fevereiro.

Ainda antes de haver um texto, uma ideia ou um fio condutor para o espectáculo, já havia título. Durante uma visita a uma exposição no Museu do Aljube, Alice Azevedo deparou-se com cópias de uma revista lésbica dos anos 90 – a Lilás. Num dos números, o título “Se não és lésbica, como é que te chamas?” captou a sua atenção. Daí, viria a nascer esta peça. “Não só sobre lésbicas, mas sobre palavras, esses rótulos, essas caixinhas que algumas pessoas tanto gostam e outras pessoas tão violentamente odeiam, e fazer um bocadinho essa arqueologia dessas palavras. Falar de que palavras é que foram existindo, o que é que se fazia quando não havia palavras, essas palavras descrevem o quê? Comportamentos, ou descrevem pessoas, ou descrevem comunidades…”, reflecte a actriz e encenadora, após um ensaio. 

Na sala de ensaios do TBA, mesas e cadeiras estão dispostas de uma parede à outra. De um lado, encontramos o microfone e a mesa do DJ, interpretado por Isaac Veloso, que também é responsável pelo desenho e operação de som. Do outro lado, um balcão, de onde ocasionalmente são servidas bebidas, confere ao espaço o estatuto de bar, o qual se torna especialmente importante no imaginário representado. “Interessava-me ter um espectáculo com linguagens que viajassem muito e decidi que ele fosse passado num bar, porque na comunidade LGBT em geral, mas na lésbica em particular, é um exemplo de espaço comunitário, espaço de criar comunidade, de criar também luta política, mas também simplesmente um espaço de encontro, de partilha ou de pertença”, explica.

Retomar referências

Em cena, Alice Azevedo é acompanhada por Cristina Carvalhal e Teresa Coutinho, que interpretam várias personagens. Ao longo da peça, são abordadas diversas linguagens. Por vezes, o registo toma a forma de conferência, em que uma das actrizes fala directamente para o público e partilha as suas reflexões acerca do que se fala e do que acontece em palco. Para contar esta história, acerca da génese, dos significados e das transformações da palavra lésbica, houve um processo de pesquisa histórica. A partir desta, tornou-se relevante retomar certas referências, algumas incluem figuras da mitologia grega, outras personalidades históricas. 

Uma parte de Diálogos das Cortesãs, obra do século II de Luciano de Samósata, é adaptada e interpretada pelas actrizes, recontando a relação entre uma mulher e um homem transgénero. Mais à frente, três mulheres encontram-se no bar para um encontro de mulheres que amam mulheres. São elas, Hildegarda de Bingen, outrora monja, escritora e compositora alemã do século XII, a inglesa Anne Lister, considerada a “primeira lésbica moderna”, e Virginia Woolf, uma das mais importantes autoras do século XX. Foram então seleccionadas narrativas que, de um modo ou de outro, partilham o mesmo universo identitário. “Sabemos que existiram pessoas assim, mas que eram tão oprimidas ou tão apagadas que não há registos, mas depois vamos a ver e há muito mais registos do que aquilo que imaginamos.”

Rótulos para quê?

Uma das grandes questões que atravessa a produção prende-se com os rótulos, estes que podem ou não dizer tanto sobre alguém. Na sala de ensaios, chegam a ser mencionados fufa, sapatona, sandalinha e salto alto, palavras habitualmente usadas para referir uma mulher lésbica. Se é moralmente correcto ou não usar-se estas expressões para identificar uma determinada pessoa não é o que esta peça procura investigar. Antes, importa reflectir sobre estas palavras, conceitos e definições que servem para transmitir o que uma pessoa é ou deixou de ser. Ainda mais, perceber porquê estas palavras e não outras.  

Para Alice Azevedo, “os rótulos servem para muitas coisas, até porque nós falamos de rótulos e identidade como sendo a mesma coisa. Uma identidade é uma coisa que tem muitas dimensões, uma identidade é aquilo que eu sou, no meu ser, no meu íntimo, aquela ideia de como é que eu me identifico, mas também é como é que os outros me vêem e também é como é que essas duas coisas coexistem.”

TBA. 21-24 Fev. Qua-Sáb 19.30. 12€

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