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Bel'empada

  • Restaurantes
  • Grande Lisboa
  • preço 2 de 4
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
  1. Bel'empada
    ©Ana LuziaBel'empada
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A Time Out diz

3/5 estrelas

No bairro de Alvalade sempre abundou o restaurante do senhor doutor. São sítios onde qualquer cábula grisalho de Ralph Lauren merece um vocativo reverencial da parte dos empregados de mesa. “Como está, senhor doutor?”, “que deseja, senhor doutor”, “aqui está, senhor doutor”. O supra-sumo disto era a Biarritz, pouco saudosa pastelaria, amada por adeptos do antigo regime. Lembro-me de lá ir ainda rapazola e tudo o que era mocassin com pernas passar-me à frente.

Ora, não sendo já um rapazola, e não havendo já mocassins, voltei a sentir este duplo tratamento no Bel’empada. A questão
 não tem a ver com títulos académicos, mas com um serviço de primeira e de segunda, comida de primeira e de segunda. No Bel’empada, de cada vez que o empregado listava os pratos do dia, os pratos do dia mudavam. Para o engenheiro X havia “isquinhas”; para o doutor Y “cabidela de galo muito boa”. Para mim, forasteiro, desqualificado, ovas cozidas, rosbife e “o que está na carta”. Esta sensação de não sócio num clube privado foi ainda mais desconfortável dado o tamanho do restaurante, um cubículo que permite ouvir os batimentos cardíacos da pessoa na mesa do canto, apenas 18 lugares e três funcionários ao serviço: dois na cozinha e um na sala.

À frente do restaurante está Belmiro de Jesus, dono e cozinheiro. Belmiro é um indivíduo com ar de boxeur e muita experiência na área. Começou jovem na Adega da Tia Matilde, mas tornou-
se conhecido no Salsa & Coentros, o célebre restaurante alvaladense, que fundou com o amigo e colega de sempre José Duarte. Em 2015 decidiu romper o duo e aventurar-se sozinho. Tem boa escola tradicional portuguesa, com destaque para o receituário
de caça e alentejano. Outra característica é o apreço
pelo produto. Os seus pratos procuram manter o sabor das coisas boas – e há muitas coisas boas no Bel’empada.

Alguns pratos que provei eram mesmo espectaculares
 – e não me refiro às empadas, comida que dá nome à casa. As empadas são acima da média: provei as de perdiz,
 de coelho e de porco bísaro, todas com a massa fina, a carne condimentada q.b. Aparentemente, fazem grande sucesso e eu apostaria em como são a principal fonte
 de receitas do restaurante, pois saem em modo take
away como farturas na Feira de Benfica. Mas não as achei espectaculares.

Espectacular é a
mãozinha de vitela, o arroz
 de pombo bravo, a sericaia. Espectaculares são os ovos, todos os ovos. Belmiro de Jesus é mestre neste ofício e gosta
de improvisar. Pode calhar fazer ovos com o que houver da época, mas os ovos com migas de batata estão sempre na carta, e são porventura os meus preferidos: mexidos, com mais gemas do que claras, sedosos e mal passados, trazem a batata laminada em rodelas, entre
o frito e o confitado; quando
os mastigamos, no meio da cremosidade fofa sentimos pequenos estalidos da batata crocante, uma maravilha.

Outra maravilha é a mãozinha de vaca de fricassé. Tem a magia desse molho alimonado que Portugal esqueceu nos anos 80, aqui servido com grão e com a
pata do bovino, peça cheia de gelatina e muitos tendões em troços rijinhos, uma bomba de sabor e colagénio.

A ementa tem também muitos clássicos do Salsa & Coentros, iguaizinhos até no nome. Há caça com fartura: perdiz de escabeche, arroz de perdiz, de lebre, de pombo bravo, lebre com feijão. Nem toda a gente aprecia, tanto mais que aqui a caça é mesmo caçada. Isso é bem evidente no arroz de pombo bravo, carne em fiapos, escura e intensa, imersa num bom carolino caldoso,
 a pedir tintos encorpados
 no copo. Fora os bichos do mato, destaque para o rosbife de vitela, para as bochechas de porco preto, a alheira do Fiolhoso e as plumas de porco preto.

Nas entradas, além
 dos ovos, há queijos, empadinhas, azeitonas 
a sério, uma óptima broa
de milho, pimentos de coentrada, quase tudo competente. A salada de favas, no entanto, apesar do bom azeite a temperar, seria outra coisa se as leguminosas viessem alhadas, sem a pele (demasiado grossa), e com mais sal.

O sal, aliás, foi um problema recorrente. Um dos arrozes não trazia pitada; o bife trazia pitada a mais. Não foram os únicos erros, sendo que
 o empregado sempre os tentou justificar de forma inapropriada. Exemplo:
 num caso foram trocados
 os pedidos; o empregado primeiro negou, depois apontou para a cozinheira estando o dono presente. Feio.

Em síntese. O Bel’empada é um bom restaurante de cozinha tradicional portuguesa (melhor ao jantar do que ao almoço, ou seja, quando Belmiro está na cozinha), com a originalidade de servir o menu inteiro entre as 12.00 e as 00.00. Mas tem três probleminhas.
 O primeiro é a comida
 ser decalcada do Salsa & Coentros, com os mesmos preços, sendo que a sala e
 o serviço estão uns furos abaixo. O segundo é a
falta de consistência na execução. O terceiro – e o mais grave – é a cabidela de galo caseiro ter sido só para o senhor doutor.

*As críticas da Time Out dizem respeito a uma ou mais visitas feitas pelos críticos da revista, de forma anónima, à data de publicação em papel. Não nos responsabilizamos nem actualizamos informações relativas a alterações de chef, carta ou espaço. Foi assim que aconteceu.

Alfredo Lacerda
Escrito por
Alfredo Lacerda

Detalhes

Endereço
Avenida João XXI, 24 B
Alvalade
Lisboa
1000-260
Horário
Seg-Sáb 12.00-00.00
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