Loco, chefe alexandre silva
Fotografia: Arlindo Camacho
Fotografia: Arlindo Camacho

De génio e de Loco, Alexandre tem um pouco

Uma porta para um país das maravilhas. O restaurante do chef Alexandre Silva impressionou-nos e impressionou o guia vermelho. Conheça-o.

Mariana Morais Pinheiro
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Uma oliveira centenária, com 450 quilos, levita suspensa por cabos de aço presos ao tecto. Três couves embelezam um jarro em cima do balcão de apoio.
As pernas das mesas são ramos e troncos de árvores, há uma parede tridimensional ao fundo, revestida de azulejos aos losangos brancos, e pedaços de carasau, um pão típico da Sardenha, a pairar sobre a cabeça dos clientes, pendurados em linhas e anzóis quase invisíveis. Este podia ser o sonho da Alice, mas não é. É o do Alexandre.

“Abrir este restaurante já era um sonho muito antigo. Quero-o desde que tinha 18 anos. No início do ano passado [2014], eu e a minha mulher, a Sara, que é minha sócia, decidimos avançar com a ideia”, conta Alexandre Silva, o chef que tem também uma banca no Mercado da Ribeira e passou pelas cozinhas do Bica do Sapato, do Bocca (seis estrelas dadas pela Time Out), e do El Celler de Can Roca, em Espanha. A 17 de Dezembro de 2015, paredes meias com a Basílica da Estrela, abriu o Loco.

“Foi um processo demorado. Levámos um ano até abrir. Primeiro foram os problemas com o gás, depois com a electricidade, as licenças também demoraram imenso tempo, mas felizmente ficou como queria”. E como é isso? Alexandre ri-se e faz uma pausa dramática como quem pondera se deve revelar o que traz na manga. “O Loco tem um conceito completamente diferente. Os menus de degustação variam de 15 em 15 dias, os pratos são trazidos à mesa pelos cozinheiros e há um momento em que uma colher com atum e limão é mesmo dada por eles à boca do cliente [entretanto, já não se dá nada à boca]. Aqui, nunca se sabe o que pode acontecer”.

Mas a loucura de Alexandre Silva não se fica pelos enfeites e pormenores espalhados pela sala – as mesas foram desenhadas pelo pai do chef. Estende-se também à cozinha, aberta, num espaço que soma o total de 150 metros quadrados. Só servem 22 pessoas por noite e tudo se prepara in loco, à frente dos clientes, o outro significado do nome do restaurante. “Tudo o que está a acontecer está à vista”, acrescenta o chef, explicando que não existe uma carta fixa, apenas dois menus de degustação: o Descobrir, com 14 momentos (70€ ou 110€, com vinhos) e o Loco, com 18 (85€ ou 135€, com vinhos).

“Apostamos numa cozinha portuguesa, contemporânea, vanguardista, com influências internacionais, derivadas de muitas das nossas viagens, desde Portugal, passando pelo norte de África, até à Ásia”, conta o chef, que trabalha essencialmente com produtos portugueses e tem uma equipa de cinco cozinheiros atrás do balcão preto lacado. “Esta é uma gastronomia onde vai ser possível encontrar muitas texturas e sabores. Vamos usar destilações feitas em vácuo, para produzir aromas e perfumes, mas também vamos ter algumas técnicas bastante arcaicas”. Uma delas é o método de cozedura de carne dentro de argila fresca, como faziam os Maias.

Alexandre limpa as mãos ao avental e avança com um prato de carapau com molho de pato e óleo de hortelã na mão. Depois, traz outro, com uns pãezinhos cozinhados a vapor, fermentados durante 24 horas, recheados com uma mousse de chouriço. “No Loco damos muita importância ao pão. A partilha do pão é cultural. É algo muito nosso. Temos sempre um pão branco rústico e outro que varia e que pode ser de frutos secos, de centeio com cânhamo ou envolto no mosto da cerveja”, explica Carlos Fernandes, o pasteleiro, também encarregue dos snacks, sobremesas e petit fours. “Trabalhamos muito com frutas. Temos uma sobremesa de diospiro e castanha e outra de abóbora assada com iogurte caramelizado e noz”, acrescenta.

A bebida que acompanha a refeição também ficou bem entregue. Sérgio Antunes, escanção premiado, trata da carta de vinhos. Escolheu 140 de origem portuguesa, desde brancos e tintos, a Portos e espumantes. De fora vêm apenas quatro champanhes. Outra das grandes apostas do restaurante são as bebidas fermentadas de produção própria. Têm ginger ale, cerveja e kvass, uma bebida originária da Rússia, feita à base de pão torrado, passas e hortelã. Em breve, vão ter também sumos fermentados. Sempre, claro, em sintonia com os pratos que saem da cozinha.

É louco suficiente para arriscar?

Leia a crítica aqui

  • Estrela/Lapa/Santos
  • 5/5 estrelas
  • Recomendado
De início houve alguma bazófia e era fácil embirrar com o sítio. Quando alguém sente necessidade de proclamar a sua “corrente criativa constante”, frequentemente acaba sozinho num onanismo preguiçoso gritando aleivosias contra os brutos lá fora. Ninguém gritou no Loco mas a reacção a um projecto que se apresentava com “um outro nível conceptual”, “uma experiência total”, foi vigorosa. Um respeitável crítico gastronómico espanhol foi quem primeiro disse “nem tanto”. Depois de uma visita a Lisboa, Carlos Maribona escreveu no blogue do jornal ABC um texto amargo. Nem a cozinha do chef Alexandre Silva era assim tão original, nem a comida era assim tão boa, nem a meta-culinária se recomendava. O crítico achou pouca graça, sobretudo, a ser servido à boca. A coisa descambaria numa subpolémica: de um lado os que queriam ser servidos à boca, do outro os que não queriam. Em qualquer caso, Espanha punha a foice em seara alheia. O terramotozinho na comunidade lusa foi imediato. Bloggers e facebookers espalharam a sua indignação contra o invasor espanhol. Gente pronta a marchar pelos povos de todos os feitios malhou no irmão ibérico como se fosse 14 de Agosto de 1385. Toda a gente perdeu a clarividência. Toda, menos Alexandre Silva. O texto de Maribona não deitou abaixo o chef, apresentado à nação em 2012, com a vitória no concurso Top Chef, da RTP. Silva já enfrentara dias difíceis e pareceu sempre aprender com os erros. O seu restaurante mais ambicioso, o Bocca, fechou pouco depois de a
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