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A Time Out diz

5/5 estrelas

O fine dining vegetariano de José Avillez é delicioso e já está afinado. Alfredo Lacerda suspeita que mais estrelinhas irão luzir na jaqueta do chef.

A grande expectativa recaía sobre a cenoura com esfera de azeitona e leite de pinhão. O prato é um campeão de popularidade do Belcanto; e o próprio José Avillez, em entrevistas, declarou ser um dos seus favoritos. Mas o arroz com trufa preta e manteiga de ovelha, por cima uma coberta fina de beldroegas marinadas em limão, acabou vencedor. Que maravilha. À primeira garfada, eis a alta cozinha a provar que ainda é uma fonte inigualável de prazer. Genial e bom. Cheio. Envolvente. Vibrante. “A taça vai para o arroz”, elegeu a mesa. 

Estava lá tudo. O arroz al dente numa simbiose gorda de trufa preta (discreta, não o engate oleoso do costume) e manteiga de ovelha; o carvão aditivado a dar-nos a cor negra, trágica; e depois as beldroegas, tratadas com pinças, um leque perfeito sobre os bagos, cítricas e verdes, a limpar-nos o palato, a dar-nos frescura e clorofila. Podem chamar o Tombalobos e o Quim do Talho, o Vítor Sobral e o Olivier. Podem chamar o mais ortodoxo dos carnívoros. É um grande prato. E não precisa de carne ou peixe. 

A grande virtude deste menu é esta mesmo: nada precisa de carne ou peixe. A cada momento, em cada prato, temos a perfeição e o detalhe. A fórmula, em parte, assenta no trio vencedor da nova cozinha de vegetais: crocância, umami ou gordura – frequentemente, os três ao mesmo tempo. Mas, depois, acrescem suplementos proteicos, com uso abundante de leguminosas (oh, magníficas e delicadas as azevias de favas, com um shot de sumo de tremoço), por vezes conjugadas com derivados de animais (como na gema confitada, com caldo de feijão e tupinambo – outro prato extraordinário), fumados e tostados (como na couve grelhada com milhos e queijo). 

Nesse sentido, o Encanto é um restaurante vegetariano, mas não é necessariamente um restaurante magro, nem anti-coisas: lactose, glúten, hidratos (sendo certo que a cozinha estará preparada para restrições, a pedido, já no restaurante ou antecipadamente, no momento da reserva). Saímos de lá mais leves do que se tivéssemos ido ao vizinho Belcanto, mas sem a sensação de nos termos alimentado a folhas – que, na verdade, só fazem duas aparições. O que temos, sobretudo, é tubérculos e raízes, cereais, feijões e frutos secos, técnica e uma noção fina, muito avilleziana, do equilíbrio entre as partes. 

Os traços distintivos da cozinha de José Avillez parecem prolongar-se em David Jesus (chef executivo do Belcanto), mas também em Luciano Marques, o homem do Bairro que se tornou responsável pelas aberturas do grupo Avillez, e, agora, em João Diogo Amorim, à frente do Encanto. Nunca há nada fora do sítio, nada nos magoa ou enjoa. A isso, alia-se um cuidado supremo com as texturas, sobretudo com a crocância, sempre na medida certa. É uma cozinha de contenção – no Belcanto, como no Cantinho, como no Encanto –, mas no bom sentido, no sentido em que essa contenção, para além de autoral – premeditada –, nos alimenta com leveza, sem nos forçar a nada. 

Em todo o caso, de pouco valeria a tutoria de Avillez sem a execução do chefe residente, João Diogo Formiga, que esteve afinadíssimo. Igualmente muito bom o serviço de sala, no caso, a cargo de Catarina Morito, expedita e conhecedora das confecções. Quanto aos vinhos, a carta tem uma selecção a copo completa (baixa intervenção, bios, mas outros mais tecnológicos), nas regiões e nas castas. Pena um dos tintos ter sido servido uns graus acima do que era suposto, alegadamente “por os portugueses ainda resistirem a beber vinhos tintos mais frescos” (enfim, se os portugueses se atirarem de uma janela…). 

No que respeita ao espaço, a sala do Encanto herda o interior do antigo Belcanto, que depois se fez Canto. A estética é a do Studio Astolfi, com as suas prateleiras estilizadas, sem grandes despesas ou opulência. 

Sobre a conta – que não é “continha” – dois apontamentos. O preço da degustação (95€, sem vinhos) é, por si, altinho, tendo em conta a matéria-prima (sem os luxos proteicos dos fine dinings de nível Michelin), mas também a facilidade em gerir eficazmente os stocks, uma vez que o restaurante funciona apenas com um menu de degustação, igual para toda a gente. A isto soma-se uma prática abusiva. No momento de pagar com cartão, surgiu englobado no mostrador do terminal ATM um acréscimo de 5 por cento do valor da factura, relacionado com a “gratificação”. Ora, ainda que a empregada tenha indicado o seu carácter opcional, estamos perante aquilo a que se poderia chamar, no mínimo, de imposição simpática, no máximo, de remuneração clandestina dos funcionários (o valor é distribuído por todos), a cargo dos clientes. 

Em síntese. A degustação do Encanto é uma delícia, do princípio ao fim. E não estamos perante uma mera ala vegetariana do Belcanto, uma sucursal pobre da casa mãe, digamos. Serviço acima da média, mesmo tendo em conta o critério actual dos Michelin. Com pouco mais de três meses, o restaurante tem já valor para conseguir a estrela dos pneus (a verde também é hipótese), assim os inspectores não sejam conservadores em matéria vínica nem em atoalhados. Oxalá isso suceda, mas sem que se inflacione ainda mais o preço; e sem que a sombra do vizinho famoso diminua o seu próprio encanto. 

Alfredo Lacerda
Escrito por
Alfredo Lacerda

Detalhes

Endereço
Largo de São Carlos, 10
Lisboa
1200-410
Preço
21 162 6310
Horário
Ter-Sáb 19.00-22.30
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