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Fado ao Carmo

  • Restaurantes
  • Chiado
  • preço 3 de 4
  • 4/5 estrelas
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  1. Fado ao Carmo
    ©Manuel MansoFado ao Carmo
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A Time Out diz

4/5 estrelas

Antes do intervalo, a fadista Sofia Ramos deixa os músicos tocarem um tema sozinhos e vai-se sentar. Arranca forte o instrumental e com ele um burburinho, iniciado pela mesa do fundo. Apesar dos "chiuuuu" que soam do balcão, o ruído prossegue e o dono vê-se forçado a intervir: "Assim não dá", atira.

Os guitarristas continuam a dedilhar, na esperança de que a conversa acabe. A conversa não acaba. Indiferente ao alerta, o grupo ri e cochicha. O dono eleva a voz, dirige-se aos músicos, interrompe. "Parem de tocar. parem de tocar, por favor!" Faz-se silêncio, a pequena sala expectante e petrificada. "É preciso muita concentração para se tocar o fado. Têm de parar de falar". Quase cai o Carmo e a Trindade. No fado for you.

Estava apresentado o sítio. O episódio diz bem dele. As casas de fado são, hoje, espaços para turistas do very typical. Mas o fado não é isso. O fado ouve-se em silêncio. E quem quer, quer, quem não quer avie-se numa dessas armadilhas do Bairro Alto, com néons e empregados a recrutar clientela na rua à caça de gorjetas e avaliações no TripAdvisor.

Aqui, vê-se logo que há respeito pelos músicos. Está tudo feito para que não se dividam atenções entre o prato e o concerto. Não se ouve fado com a boca cheia. Mesmo na cozinha - ali ao lado, semi-aberta - parece que um recém-nascido dorme sobre a banca, tudo em pontas, não se ouve um tilintar. Só quando acaba a música, o serviço irrompe nas mesas, poucas, cerca de 25 lugares sentados, todos ocupados por estragueiros, à excepção deste vosso escriba e seu companheiro - uma participação especial de João Pedro Oliveira, jornalista, músico, convidado para avaliar a parte sonora da experiência.

Pouco depois do pedido, são servidas as entradas, ambas bem boas: pataniscas de bacalhau, polme de ovo vestindo o peixe. Lascado e húmido, à maneira do bacalhau albardado; e chamuças de caça, que eram de coelho, a massa crocante e seca, a carne húmida, desfiada, muito saborosa. Para entreter há ainda um couvert com boas azeitonas, bolinhas de pão saloio torradas, boa manteiga de alho e pasta de tremoço.

Entram a seguir os músicos. Estão ao nível das pataniscas ou melhores. Tocam quatro músicas seguidas, depois descansam para que se sirvam os pratos principais. Nesta altura, o critíco gastronómico dá lugar ao critíco de música. João Pedro Oliveira mostra-se logo muito bem impressionado.

Sobre a fadista, Sofia Ramos:

"Canta sem arabescos excessivos, nem trinados desnecessários. Afinadíssima e com um sentido musical extremo. Tudo respira certeza, as palavras sempre bem recortadas, cada fonema entoado com segurança. Abraça a sala inteira sem esforço. Não há qualquer sinal de dificuldade, faz aquilo sempre com ar de prazer."

Sobre os homens da guitarra e da viola:

"Malta com dedos muito bem educados, belíssimos músicos. O rapaz do bigodinho sabe ser um bom acompanhante, dar espaço à voz e à palavra, apesar de ser um virtuoso, como se vê quando o tema se torna instrumental. Brilha quando tem de brilhar, sabe esperar. Toca da mesma forma que usa aquele bigode: cruzando uma estética de antigamente com academia de músico contemporâneo. Está ali muito estudo, muita ciência, mas também muito ouvido e gosto pela tradição. Do viola pode dizer-se mais ou menos o mesmo. Mas talvez o que mais me tenha impressionado tenha sido a unidade rítmica. Tudo soa coeso e leve, como um trio deve soar.

O que também é coeso (mas não tão leve) é o menu. Pode-se escolher um prato de seis possibilidades, sendo que só há praticamente clássicos portugueses. Perna de pato com esmagada de batata, secretos de porco com migas, bife à portuguesa, salada da época, risoto de cogumelos, espargos e trufa - mais as nossas opções: arroz de polvo e bacalhau à Brás.

Impecáveis um e o outro. O Brás dá uma cabazada à maioria do que os chefs andam a fazem por aí. Quanto ao arroz de polvo, sem invenções caldoso mas de sabor profundo, os bagos de agulha (grrrr) no ponto, durinhos. De sobremesa, já depois do segundo set músical, chegam um pudim caseiro e uma óptima tarte de limão, a base finíssima e manteigosa.

Em síntese. Este Fado ao Carmo é uma raridade entre os barretes que costumam ser as casas de fado lisboetas. Não só se come excelente cozinha regional portuguesa, como se ouve fado do melhor, feito por jovens músicos. Serviço competente, atento, comprometido. Carta de vinhos curta, mas bem escolhida e sem preços exagerados.

Ah! Fadista!

*As críticas da Time Out dizem respeito a uma ou mais visitas feitas pelos críticos da revista, de forma anónima, à data de publicação em papel. Não nos responsabilizamos nem actualizamos informações relativas a alterações de chef, carta ou espaço. Foi assim que aconteceu.

Alfredo Lacerda
Escrito por
Alfredo Lacerda

Detalhes

Endereço
Rua da Condessa, 52
Bairro Alto
Lisboa
1200-122
Preço
30€ (entrada, prato, sobremesa) +10€ concerto. Bebidas à parte
Horário
Seg-Sáb 20.00-01.00
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