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Kai

  • Restaurantes
  • São Sebastião
  • preço 3 de 4
  • 4/5 estrelas
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  1. Kai
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A Time Out diz

4/5 estrelas

Abriu na recém-inaugurada Torre de Picoas e leva ao alto a cozinha japonesa tradicional. A premissa é que não haja fusão nem apetrechos ocidentais, e a garanti-lo está Henry Park, o chef japonês que chegou do Dubai para fazer um elogio ao peixe da nossa costa. No espaço, impera o minimalismo funcional, com apontamentos decorativos como os barris de sake usados no kagamibiraki – o ritual japonês onde a tampa dos barris é partida para posteriormente se beber o tradicional vinho de arroz – e dois frigoríficos que deixam à vista as escolhas a beber. As mesas estão pensadas apenas para nove pessoas, um contraste com o balcão, que comporta 20 lugares. Na carta há menu executivo de almoço (25€), com sopa miso, niguiris, katsu don (costeleta de porco, repolho napa e arroz) ou kai chirashi (com peixe escolhido pelo chef em cama de arroz), que pode ser à la carte. As opções estendem-se depois aos niguiris e sashimis de atum gordo (10€/duas unidades), salmão (5€/duas unidades), pargo (8€/duas unidades) ou enguia (10€/duas unidades), aos makis como o negitoro maki (13€), tekka maki (19€) e o salmon maki (8€).

Crítica

A primeira imagem do restaurante é de cima. Entramos e temos um tecto altíssimo, de onde pende um candeeiro majestoso sobre o balcão, que domina todo o espaço, uma vintena de lugares em forma de anel aberto. Lá dentro, a outra atracção do sítio. No centro desse anel, oficia um jovem asiático com uns óculos de massa enormes. Podia ser um estilista de vanguarda ou uma versão oriental de Harry Potter. Mas é Henry Park, o chef.

Henry Park veio do restaurante Morimoto, no Dubai (há mais oito espalhados pelo mundo). O seu ar asiático e o seu contexto sugerem origem japonesa, mas na verdade nasceu na Califórnia e tem ascendência coreana. Tem apenas 28 anos e a história da sua contratação é importante para se perceber que restaurante temos aqui.

Quando pensaram no projecto, os três sócios do Kai rumaram ao Dubai à procura de recursos humanos. No Morimoto, encontraram o chef que procuravam, mas junto com o chef veio parte da equipa, entre eles um pasteleiro sul-africano, a chefe de sala espanhola e um empregado do Cazaquistão – todos atraídos pelo novo buzz em redor de Lisboa e por um lugar com mais para fazer do que comprar roupa de grife e abrir contas bancárias com milhões (vide Isabel dos Santos).

Ou seja, de repente, Mário Cajada, dono dos cafés Simpli, e Miguel Moreira, proprietário do célebre restaurante São Gião, em Moreira de Cónegos – dois dos sócios do projecto –estavam a conceber um restaurante em Lisboa com discípulos de Masuhara Morimoto.

E quem é Masuhara Morimoto? Morimoto tornou-se conhecido depois da sua passagem pelo concurso televisivo de culinária Iron Chef, muito popular nos EUA, nos idos de 2000. Nessa altura, era o chef principal do restaurante Nobu, uma das mesas mais caras de Nova Iorque e do mundo. O Nobu, por sua vez, tornara-se famoso por dar um toque peruano à cozinha tradicional japonesa, inventando pratos que se tornaram icónicos em todo o mundo, como o bacalhau negro com miso. Morimoto terá acrescentado a Nobu os seus próprios pozinhos de contemporâneo, mas sem se meter em queijos Philadelphia e morangos e outras tendências tropicais que Lisboa tão bem conhece. Henry Park há-de ter absorvido algo disso na sua passagem pelo Morimoto do Dubai. Mas parece ter a sua própria ideia de cozinha, apesar da juventude. Inicialmente, estranhei ver na internet fotos de pratos deste Kai com florzinhas, algo que parece ter sido apenas uma experiência incidental para as revistas – e ainda bem. Mas outras coisas serão sua convicção.

O arroz, por exemplo, pareceu-me diferente: mais grosso, mais glutinoso, menos definido. Park, na verdade, usa uma variedade italiana do cereal. Não é inédito. O arborio, por exemplo, tradicional nos risotos, é um tipo de bago curto, tal como o arroz japonês para sushi. Pode funcionar. Mas não é a mesma coisa. Não é um sasa-nishiki.

E o Kai tem preço para um sasa-nishiki. É um cliché, mas é assim. O arroz é absolutamente essencial no sushi. A sua origem e a sua confecção são determinantes, estão cheias de pormenores. Um bom sushi-meshi, arroz com vinagre para sushi, demora muito tempo a fazer. É preciso lavá-lo muitas vezes, escolher boa alga kombu para aromatizar, conseguir equilíbrio entre a acidez do vinagre de arroz e o doce. Depois tem de se deixar descansar e arrefecer, normalmente com recurso a uma daquelas microventoinhas portáteis, até que ele fique à temperatura ambiente.

Henry Park sabe tudo isto, segue tudo isto. Só não usa arroz japonês.

Na verdade, estavam bons os seus niguiris e o seu sashimi. Boa técnica de mão, ritmo impecável, corte do peixe exemplar, frescura. Gostei também de ver peixes raros, mesmo em comparação com outros japoneses de topo, campeonato onde joga o Kai. Foi o caso do imperador, porventura o peixe português mais caro do mercado, consistência firme e elástica, a lembrar o goraz. Idem para o salmonete.

Outro ponto a favor é o tratamento do akami, peça mais magra do atum, com um vermelho intenso e brilhante, aqui enxuta de sangue através de um processo de cura que a deixa com uma textura sedosa e um sabor limpo de notas metálicas. E o mesmo dizer da enguia, que Henry Park processa ainda viva, tarefa dura e longa que os restaurantes normalmente resolvem com a compra em lata. Pena, num dos dias faltar atum gordo (otoro, chutoro), bem como ouriço – “um contratempo com o fornecedor” – , dois produtos comuns a este nível.

À parte o sushi, experimentou-se ainda a sopa de miso (4€), intensa, excelente; o carabineiro (25€, um bicho), servido já com a carne separada, a cabeça aberta deixando escorrer os fluídos gordos do hepatopâncreas, bons para banharem os legumes salteados servidos no mesmo prato. Outro momento alto foi a sobremesa de crème brûlée e sumo de yuzu (o citrino japonês, mais caro do que lagosta), receita já vista, mas aqui muito bem executada, uma nuvem de ovos onde apetecia enterrar a cabeça (8€).

Em síntese. O Kai está na primeira divisão dos restaurantes japoneses de topo de Lisboa, ao lado de estabelecimentos como o Go Juu, o Bonsai ou o JNcQUOI Asia. E está bem nesse grupo. Os preços é que são puxadotes, pelo menos para quem não é chairman da KPMG, empresa ali sedeada, e que faz do sítio cantina.

*As críticas da Time Out dizem respeito a uma ou mais visitas feitas pelos críticos da revista, de forma anónima, à data de publicação em papel. Não nos responsabilizamos nem actualizamos informações relativas a alterações de chef, carta ou espaço. Foi assim que aconteceu.

Alfredo Lacerda
Escrito por
Alfredo Lacerda

Detalhes

Endereço
Avenida Fontes Pereira de Melo, 41
Picoas
Lisboa
1050-250
Preço
35€ (almoço), 65€ (jantar)
Horário
Seg-Dom 12.30-15.00/19.30-23.30
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