Não vou cair no cliché temporâneo de dizer que passo o Verão à procura de bons gelados porque a verdade é que passo o ano inteiro à procura de bons gelados. Com Lisboa elevada a capital mimetista do centro global, pelo menos no que à gastronomia toca, os gelados – ou gelatos – aparecem realmente em qualquer lado. Desta vez, fui levada às traseiras de Entrecampos, onde a discreta Matoli promete saber artesão na produção. Não enganam. Mas o que aqui achei mesmo curioso foi o equilíbrio entre grandes quantidades de açúcar – são gelados muito doces – que nem assim aniquilam o sabor preciso de cada variedade (pequeno - 2,90€; médio - 3,90€). Os que provei – manga, morango, queijo/goiabada e nata – eram realmente potentes! Particularmente no de manga, parecia que alguém se tinha limitado a espremer a polpa da fruta mais madura e adoçada pelo sol, diretamente para o pote refrigerado. Acho justo falarmos em experiência sensorial.
Tendo cometido a (im)prudência de visitar o estabelecimento à hora de almoço, e em vista das demais opções doces (facto que ignorava), acabei por aproveitar para fazer rodízio. O bolo de chocolate (4€) foi dos mais satisfatórios que encontrei nos últimos tempos: massa bem chocolatuda com uma textura suculenta e diferente (desconfio que havia ali coco fresco ralado, bem miudinho!) recheada com uma ganache perfeita, brilhante, lisa, cremosa, praticamente um tónico de beleza. Percebendo a intenção, não fiquei fã da opção de o servirem morno (imagino que após uma breve passagem pelo microondas), porque desprezo genericamente o microondas e porque creio que o aquecimento subverte a lógica de um bolo recheado (que tem sempre de estar frio para se rechear e montar) sem benefício de maior: a massa fica a atirar para o molengona e os sabores apagam-se ligeiramente. É pena.
De beleza pueril é o pavê de pote (4,90€). Pavê é um doce caseiro brasileiro, que consiste em camadas alternadas de creme(s) e bolachas. As possibilidades são infinitas, mas aqui encontrei-o com baunilha e chocolate. A superfície era uma linda pista de ganache endurecida no ponto certo pelo fresquinho. Mergulhe-se a colher desde o topo ao fundo do pote, e teremos a sensação de ter encontrado o ouro na ponta do arco-íris.