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Oitto

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  1. Oitto, Carlos Duarte Afonso
    Francisco Romão Pereira
  2. Oitto
    Francisco Romão PereiraRESTAURANTEOITTO_FRP, 31/08/2022
  3. Oitto
    Francisco Romão Pereira Mousse de chocolate com avelãs e caramelo salgado
  4. Oitto
    Francisco Romão PereiraCeviche de corvina com batata doce de Aljezur e citrinos
  5. Oitto
    Francisco Romão Pereira
  6. Oitto
    Francisco Romão PereiraCabrito com arroz de forno
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A Time Out diz

4/5 estrelas

O fine dining de Carlos Duarte Afonso tem cozinha portuguesa contemporânea, sem palermices. Mas Alfredo Lacerda pagou um preço por isso.

Comecemos pelo melhor: a salada quente de polvo e pimentos, servida de entrada. O prato vai directamente para o top dos pratos mais deliciosos que comi este ano – uma surpresa, até porque comi mais polvo do que tremoço, em 2023. 

Hoje em dia, o polvo está por todo o lado, cozinhado à Brás ou à Meunier, grelhado ou guisado, na pressão, no Josper ou no sous vide. 

O polvo tomou os menus porque abunda, porque descongela bem e porque não há proteína mais fotogénica no Instagram: uma perna de polvo enrolada é uma imagem hipnótica e sexy como as pernas da Anja Rubik. 

A salada quente do Oitto estava morna (e não quente), e assim deve ser, a carne do molusco suave, cozida no ponto e depois entalada no forno com fumo, por cima um manto de molho cremoso, a lembrar mais um salmorejo do que uma massa de pimentão – o tempero afinadíssimo, doce e salgado e vinagre bom a espevitar tudo. 

De resto, foi assim com o resto da refeição: afinação e cuidado. Na cozinha do Oitto, mesmo sem o chef Carlos Afonso Duarte presente, os cozinheiros provam a comida e não deixam que nada vá para a mesa salgado ou insonso, ou sem sabor. 

Podemos, aliás, comprovar isso, porque eles estão ali ao nosso lado, atrás do balcão que separa a cozinha aberta da sala, absortos e focados como cirurgiões, sem perder a noção do tempo. 

Numa dia da semana, à noite, sala meio vazia, os pratos chegaram num instante, três entradas de uma vez, incluindo uns “croquetes de batata e alheira, espinafre e alho assado”. 

Dirão os leitores regulares: “Oh, Lacerda, croquetes de alheira?! Mas isso não é crime?!” É sim, mas quem nunca cometeu um que atire a primeira trouxa de morcela e maçã. 

Não era, de resto, a habitual cena-frita-com-alheira-manhosa-dentro. Por fora, farinha panko, por dentro alheira de qualidade, por cima uma maionese de alho boa. Se a batata e os espinafres e o alho assado sobressaíram? Não. Se soube bem? Soube. 

Melhor ainda esteve o ceviche de corvina, ligeiramente doce, mas especial: notas anisadas e elegantes, picles e cebola cortados a lupa e x-acto, o peixe suave e limpo, cada dentada um foguetório de pequenas coisas a explodir. 

Nos principais, destaque para um clássico que Carlos Duarte Afonso trouxe d’O Frade, em Belém, restaurante onde o chef se iniciou em nome próprio: o arroz de pato. Eis o seu prato-bandeira, híbrido entre o malandro corrido português e o risoto, a carne desfiada, chouriço caseiro aos pedaços, conforto e umami – à beira de se tornar um clássico. 

Menos expressivas as sobremesas, ainda que ambas bem. A mousse em modo cimento fresco, de chocolate negro, amêndoas e bolacha a fazer barulho. O “doce da casa”, por sua vez, a querer ser da tasca, sem sucesso, só a bolacha Maria a ligar, de resto tudo demasiado sofisticado para ligar ao popularucho. 

Fora as comida, a carta de vinhos tem algumas garrafas menos vistas por aí – não muitas – mas está longe de ter uma identidade ou preciosidades acessíveis. Os vinhos a copo começam nos 7€ – e não estamos a falar dos tintos de talha alentejanos, que Carlos Duarte Afonso tão bem conhece. 

Dito isto, quanto ao espaço, o Oitto ocupa um lugar no Chiado onde outros restaurantes sucumbiram. No dia em que lá fui, uma quarta-feira, o ambiente era um pouco tristonho, sem que se perceba bem por culpa do quê. A decoração tenta ser sofisticada, tons escuros, aqui e ali madeiras e apontamentos de mármore lioz. 

No serviço, o chefe de sala é extrovertido e hospitaleiro e procura animar as hostes, rumando contra a apatia dos colegas. Teve um desacerto estranho, quando anunciou que o azeite era Oliveira da Serra. Por momentos, ficou a ideia de que se tratava de uma piada – mais uma –, mas ele insistiu que era a sério. 

Feita a prova, percebeu-se que não era Oliveira da Serra (“Só se o mudaram, entretanto”), mas um azeite mais saboroso (e também com um pouco de tulha), porventura de produção caseira para o restaurante. 

Em síntese. O Oitto é um restaurante raro em Lisboa. Fora dois ceviches, é cozinha portuguesa contemporânea, sem tonterias, um fine dining de conforto, que tanto agrada a um alentejano como a um dinamarquês. Tenho dúvidas que vença, todavia, porque não apela aos novos ricos, mais atreitos ao posh e à festarola e à passadeira de outras moradas, nem apela às pessoas comuns, turistas incluídos, que não têm 60 euros para lá ir gastar num jantar. 

Alfredo Lacerda
Escrito por
Alfredo Lacerda

Detalhes

Endereço
Largo do Picadeiro, 8 A
Lisboa
1200-027
Horário
Seg-Dom 12.00-15.00, 19.00-00.00
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