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Portugália - Belém

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  1. Portugália
    Francisco Romão Pereira
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    Francisco Romão Pereira
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A Time Out diz

3/5 estrelas

A (quase) centenária cervejaria voltou à ribalta pela boca do Presidente da República — uma má boca, na opinião de Alfredo Lacerda.

Era sábado de sol, hora de ponta para o almoço, e a Portugália de Belém atraía mais gente do que o Padrão dos Descobrimentos, ali mesmo em frente. Havia lista para dar o nome à entrada e uma fila com 30 minutos de espera. Apesar do turismo, a clientela nacional enchia grande parte da casa e parecia atenta à actualidade. “Ele veio cá esta semana. Será que está cá hoje?”, comentava um homem para a mulher.

“Ele”, já se vê, era Marcelo Rebelo de Sousa. As notícias indicavam que teria ali estado há três dias. A razão principal da visita, de acordo com o Expresso, fora a auscultação ao povo sobre o seu dislate acerca das vítimas de pedofilia na Igreja. Nesse dia, o chefe de Estado teria acabado as reuniões com os partidos, no Palácio de Belém, e depois fora jantar à Portugália para avaliar como andava a sua popularidade. O jantar terá corrido bem (“Ansioso por testar o povo (...), consta que Marcelo dormiu mais tranquilo”, lia-se no artigo). Mas nada fora dito sobre a refeição propriamente dita. 

Já sentado à mesa, tentei inquirir os empregados sobre o assunto – sem sucesso. É difícil conseguirem-se dez segundos, que seja, da sua atenção. Aceleram entre as mesas, atarantados e fechados nas suas olheiras. Só quando chegou a altura do pedido, meti uma bucha: “Queria o mesmo que o Presidente da República costuma comer, por favor.” O homem – só vi empregados-homens – ficou surpreendido, mas teve presença de espírito. “Um bife da vazia e meia imperial. É isso?”, perguntou, galhofeiro, aludindo ao hábito do chefe de Estado de beber apenas meio copo de cerveja. “Ele costuma cá vir e é sempre assim: um bife e meia imperial.” 

A escolha do menu só espanta quem desconhece os hábitos alimentares presidenciais. Marcelo é o tipo de pessoa para quem o supra-sumo da refeição é um bife e uma Coca-Cola. Pode substituir-se o refrigerante por cerveja – meia cerveja (!) – mas ele é esse indivíduo demasiado acelerado para slowfood, conservador e esquisitinho, que só quer uma coisa fácil de mastigar, intensa, rápida e decadente.

O seu apetite pelo bife com molho “à Portugália” comprova isso. O icónico prato há muito se tornou num pedaço farinhento de proteína animal afogado numa piscina margarinhenta, gordura aquosa e maligna. A cada garfada, a pessoa sente que as veias se vão tapando, uma a uma, e que o sangue pode mudar de vermelho para amarelo-Vaqueiro, e que o SNS poderia estar mais desafogado sem o bife da Portugália.

De resto, o que se provou a seguir pareceu melhor do que o bife. A lista: croquetes acabados de fritar, interior em mousse mas guloso; casca de sapateira fraquinha, o recheio adocicado e insonso, muito ovo cozido e pouco marisco, tudo gelado, tal como aliás estavam as gambas da costa. Dos principais, provou-se a afamada (!!) açorda de gambas, que é uma papa insípida de pão branco e camarões gordos, descascados e rijinhos. E, por fim, o bacalhau à Brás, outra das especialidades da casa, saboroso e húmido, mas sem uma lasca que se visse do gadídeo, pouco para os 14€ cobrados. 

Nas sobremesas, um flan simples e uma “beermisù”, pastiche com cerveja do tiramisù, que do primo italiano só tinha os palitos La Reine. 

De regresso a casa, pensei em muitos outros restaurantes mais indicados do que a Portugália para Marcelo auscultar o povo e, sobretudo, para comer um bife decente. Nem o povo tem 25 ou 30 euros para gastar a comer só razoavelmente, por estes dias, nem a culinária da centenária cervejaria, hoje transformada em franchising de fast food, deveria ser exemplo gastronómico para se publicitar na imprensa. Num país tão dependente do turismo, também na comida, faltam-nos líderes mais exigentes. 

Alfredo Lacerda
Escrito por
Alfredo Lacerda

Detalhes

Endereço
Av. Brasília
Lisboa
1400-038
Preço
22€-30€
Horário
Seg-Dom 12.00-00.00
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