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Queimado

  • Restaurantes
  • Bairro Alto
  • preço 2 de 4
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
  1. Queimado
    ©Inês Félix
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A Time Out diz

3/5 estrelas

Neste restaurante é tudo cozinhado ou terminado no carvão, mas não vale a pena levar o nome à letra – nada vai sair queimado. Aos almoços há um menu a 14€, com entrada, prato e bebida, sempre a rodar. Já o menu de jantar é de partilha, tem nove opções, só usa produtos locais e regionais e vai mudando consoante as estações do ano – tudo a preços acessíveis e com a recomendação de três a quatro pratos para duas pessoas. Ao domingo há “uma espécie de brunch”, com comida composta.

Crítica

O restaurante pertence a Shay Ola, um inglês que andou pelo design e pela música – e teve um supper club em Londres conhecido como The Rebel Dining Society. Na altura da abertura, esta mesma Time Out escreveu que passou por Paris, Berlim, e que assentou em Lisboa porque adorou “a cidade, as pessoas, a autenticidade”.

Nada de muito novo até aqui. Acontece que este Queimado trazia consigo um conceito que entretanto cresceu ou, melhor, renasceu (tem um milhão de anos, na verdade): cozinhar com fogo, no caso com carvão. Shay Ola propõe-se fazer isso, não na típica churrasqueira do bairro, mas num sítio mínimo da Rua Luz Soriano, ao Bairro Alto, com cocktails e DJ sets, vinhos naturais e cervejas artesanais.

Quando lá entrei, a primeira sensação foi a de estar num bar. Havia duas mesas corridas postas, banquinhos de um lado e do outro, à esquerda tínhamos o bar e encostados à parede bancos altos com um balcão para a parede, bons para quem quer beber um copo e ouvir música (e isso é permitido), não tão simpáticos para quem quer jantar.

Ao jantar, a um dia da semana, o restaurante estava praticamente vazio. Eu e o meu amigo sentámo-nos num dos extremos da mesa, dessas comunitárias alegremente promíscuas, e eu pensei o que sucederia se alguém se instalasse ao nosso lado. O meu amigo é um sujeito rude e conservador, com um gosto particular por frases de recreio de secundária: facilmente soltaria um “o teu pai deve ser aviador” ou outra parvoíce do género.

Poderia ter tido a sua graça, mas não aconteceu. Estávamos em plena época baixa, ressaca do Ano Novo, e nessa noite acabámos por jantar só seis pessoas.

Mas falemos da comida. Estamos em modo bistronómico, ou seja, pratinhos para partilhar, poucos hidratos, atenção ao produto e à sazonalidade, fumados, molhos. Doses pequenas, carta curta (couvert, cinco pratos salgados e duas sobremesas), mais legumes do que carne, mais carne do que peixe (só um linguado como prato do dia, fora da carta). Duas pessoas podem pedir o menu todo e eu diria que isso é aconselhável se em causa estiverem estômagos adultos de pessoas em idade activa.

Foi isso que fizemos. Notas de prova.

A abrir, pão da Gleba com manteiga de ovelha e sementes de chia. É isso: mais um restaurante com pão da Gleba. Deve ser o 20.º sobre o qual aqui se escreve. A única coisa que há a assinalar é o tratamento que lhe é dado – no caso muito bom, torrado, cortado fino. Em contraste, a manteiga de ovelha, que é excelente, apareceu demasiado fria e dura, mascarando-se assim o seu sabor queijeiro, que é a sua genética.

Apareceu depois o salsifi. Salsifi é uma raiz rara em Portugal, uma mistura de alcachofra, cherovia e mandioca. Há quem lhe reconheça notas a ostra, mas talvez por estar muito chamuscado esse sabor desapareceu. Por cima vinham uma raspas de sardinha alegadamente seca, mais uns fiapos de casca de limão de conserva, ao lado um molho de leite de arroz caseiro.

Diria que foi o prato menos bem conseguido da noite. Logo a seguir caiu feijão verde com molho labneh e fizemos as pazes. O feijão assado, com a vagem inteira, uns peixinhos da horta sem polme, bons para ensopar no molho ao lado, à base de iogurte gordo com menta. Bem fresco o linguado grelhado, com aros de chalotas fritas e lima. Depois, surgiram os lombelos com puré de nabo caramelizado. Os lombelos são duas peças compridas da vaca, a lembrar os lombinhos do porco, raros de encontrar. Têm por vezes uma consistência elástica, mas são muito saborosos. Os franceses chamam-lhes onglet e gostam de os grelhar, técnica aqui também usada. A acompanhar uma “redução” de beterraba que parecia na verdade apenas sumo de beterraba, detalhe estético que acrescentou pouco.

Continuámos nas carnes, com a costeleta de porco preto com mandarina queimada: notas doces e salgadas; a acompanhar uns estaladiços que pareciam batata frita, mas eram noodles de arroz crocantes. A terminar os pratos salgados, o campeão da noite: batata doce, crème fraîche fumada e morcela assada. Para sobremesa, dividiu-se um gelado de rosas com um curd de toranja. Muito bom o sabor da rosa no gelado, subtil e floral, a contrastar bem com a toranja, mais forte e amarga, mas igualmente aromática – pena a consistência do gelado estar dura como uma pedra.

No que respeita à carta de vinhos, tem escolhas interessantes, mas é pequena: só sete garrafas, das quais só duas delas tintos e uma de perfil natural (32 euros a garrafa). Percebe-se a preferência por brancos numa carta muito vegetal, mas ainda assim faltam alternativas para as carnes ou pratos mais fortes.

Serviço simpático e competente, rápido e rigoroso a explicar uma carta que só aparece escrita em inglês.

Em síntese. O Queimado faz lembrar um desses sítios antigos do Bairro Alto onde o restaurante era mais do que um lugar para comer – era sobretudo um sítio para começar a noite. É bonito e tem boa música e sente-se uma certa liberdade libertina, tão característica da zona. Gostaria de ter feito a visita num dia de casa cheia, com estranhos a acotovelarem-se, a cruzarem conversas e a pagarem cocktails uns aos outros. Mas quis o destino que fosse num dia chocho e, num dia chocho, com os olhos postos na comida e só na comida, este Queimado esteve quase, quase, a ser bom – mas houve sempre alguma coisa no prato que falhou e o tornou só razoável. Talvez Shay Ola deva fazer o que os colegas de outros neo-bistrôs da cidade fizeram: mudar só alguns pratos, tentando manter na carta os vencedores incontestáveis. Havemos de voltar.

*As críticas da Time Out dizem respeito a uma ou mais visitas feitas pelos críticos da revista, de forma anónima, à data de publicação em papel. Não nos responsabilizamos nem actualizamos informações relativas a alterações de chef, carta ou espaço. Foi assim que aconteceu.

Alfredo Lacerda
Escrito por
Alfredo Lacerda

Detalhes

Endereço
Rua Luz Soriano, 44
Lisboa
1200-223
Preço
30 a 40€
Horário
Ter-Sex 12.30-15.00/18.30-01.00,Sáb18.30-01.30, Dom 15.00-20.00.
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