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Crítica

Tarara (FECHADO)

3/5 estrelas
Alfredo Lacerda
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A Time Out diz

O nome deste restaurante não é comum e não vai perceber logo ao início o que se come aqui mas fica no ouvido. Mais que não seja porque vai querer saber o que é uma tarara (assim mesmo, sem acentos) – é um ventilador para limpar os cereais, que separa o trigo do joio. Neste restaurante no Beato, a comida servida é asiática, sul-americana e ibérica (dos tacos e ceviches às noites de sushi, à quarta-feira), mas esta máquina ganhou o seu lugar de destaque ao centro. Era dos avós de João Duarte, o chef.

Crítica:

Há dias, Miguel Esteves Cardoso referiu-se a esta coluna como um sítio onde se é capaz de dizer mal até do que se gosta. O texto de MEC no Público de sábado deixou-me feliz, depois sorumbático, depois pensativo e confuso. Não era intenção
 de MEC embrenhar-me em insegurança, mas questionei-me. Valerá a pena dizer mal quando há tanta coisa para dizer bem? Valerá a pena dizer bem e dizer mal do mesmo restaurante, na mesma crítica? Valerá a pena o mas, sempre o mas – é bom, mas? Serei eu um ser amargo e vil?

Nenhuma dúvida: o “mas” é uma chatice. Os chefes que lêem livros sobre gestão de pessoas usam o mas para apertar com
os funcionários. É a técnica do achincalhamento controlado. Começam com um elogio 
para, de seguida, passarem a mensagem que interessa. “Você tem jeito para tirar cafés, mas a fazer relatórios é um desastre”.

Em matéria de crítica gastronómica, o mas confunde o leitor, estraga o ritmo da prosa; e a prosa de restaurantes quer-se linear: ou se gosta ou não se gosta, ou se ama ou se odeia,
ou é incrível ou é uma merda. Não devem ficar dúvidas. É para reservar ou não?

Serve esta introdução angustiante e bazofeira e umbiguista para contar sobre o almoço desta semana no Tarara. Ora, o Tarara foi bom. Mas. Precisamente.

Senão, vejamos. Chego ainda não são 13.00. O restaurante
 fica entre o Beato e Xabregas. Espaço luminoso, branco, bonito e limpo. Dois grandes clichés 
da actualidade a registar: os candeeiros-lâmpada e as farripas de madeira no forro do bar e das paredes. A sala está cheia (no total, sentam-se umas 40 pessoas), duas mesas grandes com grupos e os restantes lugares, onde me incluo, todos a chegar ao mesmo tempo. Teme-se o pior.

O menu é um mostruário de comidas da moda, América do Sul e Ásia em destaque. Tatakis, burritos, ceviches, yakitoris. Dois dos pratos mais promissores foram-se. A sopa de miso à Bulhão Pato não há.
 O yakitori (espetadas japonesas) de wagyu “encontra-se descontinuado”.

Só às 13.38 aterra na mesa um pratinho de edamame com flor de sal (enregelado), acompanhado de pepino em conserva de vinagre com sementes de sésamo torrado. “É o couvert”, explica a empregada, afogueada mas serena, preocupada mas atenta. Nisto, passam mais 10 minutos até chegar o ceviche de peixe branco (pregado) com leite de tigre e puré de batata doce. Peixe sem tempo na marinada, marinada insípida, puré de batata doce bruto, abaixo de outros da cidade, vide Cevicheria e Cantina Peruana. Mau arranque.

Segue-se o tiradito de lírio, o peixe cru em vinagre, saboroso
 e gordo, polvilhado de pó de togarashi e aro de malagueta. Pena vir com pele. Viajamos então para o México, com Portugal na bagagem. O burrito de porco preto vem numa tortilha assada, sobre abacate com tomate picado e lima. Grande combinação. Por fim, sugestão da casa, o yakitori de bacalhau negro com miso. Uma preciosidade. O bacalhau negro não tem nada a ver com o nosso bacalhau Gadus morhua. É outro bicho, nem pior nem melhor – diferente –, um condensado de gordura e ómega 3, uma delícia. A ideia de juntar bacalhau negro com miso tem a assinatura do famoso chef japonês Nobuyuki “Nobu” Matsuhisa, dos restaurantes Nobu. Aqui surge em versão espetadinha e tem
os mesmos atributos: a carne manteigosa marcada pelos fumos do carvão, vestida de uma pasta adocicada de miso.

Nos doces, seguiu-se a sugestão da empregada de mesa e provou-se o pudim 
de coco com lima e ananás caramelizado. Final em grande.

Preço disto tudo: 47 euros.
 Na conta não veio o couvert,
 nem o chá frio (bem bom), nem
 o café. “Por causa dos atrasos, ficam por nossa conta”, justificou a empregada, num gesto que salvou o que havia para salvar, que nos deixou com a certeza
 de que não foi desleixo, só azar, dois grupos grandes num dia de semana, tudo a pedir ao mesmo tempo, o pesadelo de qualquer cozinha, o terror de qualquer sala. Em síntese.

O Tarara deu-me um bacalhau negro que foi das melhores coisas que comi nos últimos tempos. E um chef e uma empregada ainda jovens, mas que sabem fazer bem, que se preocupam com os clientes. Se deste almoço tirarem lições, temos restaurante. Se não tirarem nada, há-de se perder tudo. Com ou sem críticas, meu caro MEC.

*As críticas da Time Out dizem respeito a uma ou mais visitas feitas pelos críticos da revista, de forma anónima, à data de publicação em papel. Não nos responsabilizamos nem actualizamos informações relativas a alterações de chef, carta ou espaço. Foi assim que aconteceu.

Detalhes

Endereço
Rua do Grilo, 98
(Beato)
Lisboa
1950-146
Preço
15€ (menu de almoço) - 25€
Horário
Ter-Sáb 12.30-16.00/19.00-23.00.
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