[title]
Em Nova Iorque Maria Luísa Fernandes não escapava a artigos sobre os chefs carismáticos da cidade ou sobre as influências estrangeiras nos restaurantes nova-iorquinos. Agora, para a Plate Magazine fotografar o peixe grelhado em cima de puré de batata roxa e composto ainda com uns peixinhos da horta, tem de vir a Lisboa. Maria Luísa voltou em Fevereiro e, desde há um mês, fez do Peixe na Avenida a sua casa. A carta quer ser uma viagem pelas terras com alguma influência portuguesa e neste caminho só há espaço para um bife.
José Cabral já tinha este restaurante pensado para abrir há três anos, “mas só agora é que me apareceu uma chef Luisinha”, diz à Time Out enquanto Luisa se divide entre a cozinha e a sala, entre finalizar os pratos e ir conversando com quem almoça — e histórias tem muitas para contar, desde aquela vez em que lhe entraram 20 fotógrafos japoneses pela sala do Robert, onde trabalhou seis anos, ou aquela outra em que participou no concurso de televisão Chopped e teve de se desenvencilhar com ingredientes como bacalhau ou grão — bingo!, pensou a portuguesa — enquanto os outros concorrentes cortavam dedos com os nervos.
Luísa deixou Nova Iorque porque o ritmo é alucinante demais — “não se pode sair do top dos 50 melhores do Trip Advisor; não se volta a entrar”, diz, para explicar a pressão. Ao Robert nunca tal aconteceu, mas ao fim de mais de dez anos da cidade que nunca dorme, apetece tirar um cochilo - “além disso, uma pessoa começa a ficar velha e um hospital lá é muito caro”, brinca a chef.
Consigo trouxe alguns pratos que ficaram populares por Nova Iorque e ideias que têm selo americano — não há dúvidas disso quando chega à mesa uma mousse de chocolate com uma tira de bacon cozinhado e mergulhado em chocolate derretido (o bombom de bacon). Mas até aí chegar há muito mar. Começa-se a viagem com peixe nu e cru, que é como quem diz, com ceviches como o de atum rabilho dos Açores, cortado em pedaços grandes e servido com abacate, maionese de lima e aromatizado com togarashi, uma mistura japonesa de sete pimentas diferentes com sementes de sésamo.
Ultrapassada a colecção de sashimis e sushi — que traz a passagem pelo oriente — há pratos como o caril de Gôa, a moqueca baiana ou a lagosta de Moçambique. “Primeiro pensei fazer uma carta pelas praias portuguesas, mas tinha de ir a muitas e iam sempre dizer que não tinha ido a todas”, conta Luísa, que desde o inicio se quis focar no peixe, que aqui é todo selvagem, da costa portuguesa, com algumas ideias nascidas na América. O robalo de mar com favas e chouriço nasceu do prato de peixe que fez no concurso de televisão — na altura o peixe acompanhava com grão guisado com chouriço; aqui não há o constrangimento que respeitar o que vem na cesta e pôde usar as favas numa referência às sardinhas fritas com favas da região centro, diz. O robalo grelhado é terminado no forno para ficar com a pele crocante, como se serve em Nova Iorque - “crispy”, dizem eles que mandam parar traz um peixe em pele a estalar, “soggy”, chama-lhe.
É também assim que aparece o pargo, sobre um puré de batata vitelote e uns peixinhos da horta bem crocantes. Foi o que serviu ao Presidente Marcelo em Nova Iorque, na altura com linguado do Alasca. Para carnívoros que não suportem peixe, estamos mal — só há lugar para um bife do lombo com puré de batata trufado - “just in case”, justifica.
No final da refeição, há pratos tradicionais como papos de anjo — que Luísa faz enrolados como tortas — ou criações como a tal mousse densa, de chocolate 72 por cento cacau e a fitinha de bacon. É de juntas as duas partes da mesma colher, recomenda a chef.
Rua Conceição da Glória, 2-6 (Avenida da Liberdade). Ter-Sáb 12-15.00/18.30-00.00; Dom 18.30-00.00.