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©DR"Walk the Line", a vida de Johnny Cash

Sete filmes sobre músicos

Filmar a música ou filmar o músico? É o dilema dos realizadores que fazem filmes sobre música... e músicos. A maior parte borra a pintura. Estes sete safam-se bem

Escrito por
Rui Monteiro
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Filmar a vida dos músicos é vulgar. Fazê-lo bem (há um longo rol de películas medíocres) é outra conversa. Com as injustiças próprias de uma lista, esta orienta-se pela qualidade cinematográfica propriamente dita, isto é, por esse raro saber de equilibrar a obra e a vida de um músico com a sétima arte. 

Sete filmes sobre músicos

Amadeus (1984)

Saber se foi Salieri (F. Murray Abraham) quem mandou matar Mozart (Tom Hulce) é uma estimulante distracção introduzida por Milos Forman (enfim, pela peça de Peter Shaffer que o realizador adaptou) na sua peculiar observação da vida de Wolfgang Amadeus. O filme, na verdade, é uma celebração da música que, mais ou menos às escondidas, usa episódios da vida do compositor para especular sobre a origem da sua criatividade. (Foi Deus, como preferia Salieri?) Ao mesmo tempo, Forman dá largas à imaginação e, pelo mesmo processo, “explica” a música como uma espécie de emanação de um espírito perturbado pela beleza, apesar da vida de estroina, avinhado, mulherengo, caloteiro, etc. tocado por um talento que contaminou o cineasta e valeu oito óscares.

Por Volta da Meia-Noite (1986)

Bertrand Tavernier encontrou no saxofonista Dexter Gordon a matéria ideal para recriar o estereótipo do músico de jazz brilhante, mesmo genial, porém assombrado, senão por um passado de miséria, pelo preconceito racial e principalmente pelo álcool e pelas drogas. Dale Turner é isso mesmo quando surge, em Paris, pelos anos de 1950, e experimenta, pela primeira vez, respeito e admiração pela sua música para lá da cor da sua pele. O vício, porém, prevalece. O oportunismo do viciado também. O que não impede um admirador parisiense de lançar uma mão amiga. O engenho de Tavernier (que Clint Eastwood não teve, dois anos, depois, quando estreou Bird – Fim do Sonho, sobre o genial Charlie Parker) foi, apesar da falta de originalidade da intriga, manter o seu filme sempre à superfície da previsibilidade e da lamechice. 

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O Piano (1993)

Se a biografia domina, digamos, o género filmes sobre músicos, o filme de Jane Campion é uma valorosa excepção soberbamente interpretada por Holly Hunter e pela então jovem Anna Paquin (ambas oscarizadas, a propósito), mais Harvey Keitel. Aqui, neste nenhures perdido entre as ilhas da Nova Zelândia, aí por meados do século XIX, há um piano, sim, uma pianista amadora, também, mas, principalmente, a realizadora neo-zelandesa constrói um pungente drama de isolamento e paixão em que a música de Michael Nyman é parte integrante da narrativa e não um mero acompanhamento sonoro. 

Walk the Line (2005)

Voltando ao formato de biografia convencional, James Mangold, com preciosa colaboração de Joaquin Phoenix e, ainda mais, de Reese Witherspoon (que sacou justo Óscar pela sua interpretação de June Carter Cash), atira-se à história de Johnny Cash. E, embora o filme tenha tudo para o desastre, o realizador faz da vida deste monumento da canção norte-americana uma estimulante e pouco moralista via dolorosa, iluminada, a espaços, e sempre em tons de cinzento, pela crueza bela da música. Está lá tudo, da má vida às drogas, aos tormentos físicos e psicológicos, a fé e a dúvida de um homem que viveu quase sempre à beira do abismo e provavelmente nunca encontrou a paz. Mas está lá tudo sem aproveitamento demagógico. Como um quadro sem título. 

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I'm Not There – Não Estou Aí (2007)

Estava toda a gente longe, mesmo longe de pensar que Bob Dylan seria um dia Nobel da Literatura, quando Todd Haynes dirigiu um dos mais estimulantes e brilhantes filmes sobre a música e os seus criadores. Deitando às urtigas as convenções da biografia, o realizador olha para o músico e para o homem através da evolução estética, política e estilística das canções. E quando vê obra tão rica e inquieta, e, por vezes, tão controversa, em vez de procurar a resposta simples vai pelo caminho mais longo. Por uma estrada panorâmica de onde surgem meia dúzia de encarnações (heterónimos, se preferirem, dado o novo estatuto do poeta) para o criador de The Times They Are a-Changin’, Bringing It All Back Home, Highway 61 Revisited e Blonde on Blonde, que Cate Blanchett, Christian Bale, Heath Ledger, Ben Whishaw, Richard Gere e Marcus Carl Franklin interpretam com primor e emoção. 

A Propósito de Llewyn Davis (2013)

E há os músicos que não chegam a lado nenhum. Os que não chegam ao estrelato, ou pelo menos ao reconhecimento público e recompensador. É o caso de Llewyn Davis (Oscar Isaac) que, mal equipado para o Inverno nova-iorquino e, a bem dizer, dependendo da bondade de estranhos e de alguns amigos, aterra nos bares da Village, aí pela década de 1960. Com uma guitarra, um punhado de canções, algumas ilusões de grandeza (mais tarde tornadas vitimização) e nem por isso muito talento, a vida do protagonista do filme dos irmãos Coen é um calvário pessoal e um olhar penetrante e cru, embora pontuado por alguma compaixão, sobre a vida dos que não triunfam. 

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Whiplash – Nos Limites (2014)

É aquela coisa do talento e da transpiração de que muito se fala na criação artística, mas raramente se observa e sobre a qual felizmente Damien Chazelle derramou um pouco de luz sem criar mais um subproduto de Fame armado ao sério. Embora na história de Andrew (Miles Teller) seja tudo a sério, que isto de ser um jovem e jeitoso baterista não chega para fazer sombra a Buddy Rich, o seu ídolo e modelo. É preciso trabalhar. Transpirar 99 por cento do caminho entre o talento e a qualidade, que a fama é outra conversa para o perfeccionista rigoroso, severo mesmo, para não dizer obcecado, professor Terence Fletcher – que J. K. Simmons interpreta em estado de graça suficiente para Óscar. 

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