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© Arlindo CamachoAntónio Zambujo

António Zambujo: “Achei por bem sossegar tudo e dar um passo atrás”

António Zambujo regressa com um disco feito à medida do confinamento. É o décimo da sua carreira. No fim, deixa-nos na expectativa do 11.º, do 12.º e do 13.º.

Escrito por
João Pedro Oliveira
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Mesmo sobre um disco a solo, António Zambujo fala sempre na primeira pessoa do plural. É uma nota que atravessa toda esta conversa sobre o novo Voz e Violão, e que talvez nos diga alguma coisa sobre o músico que diz de si mesmo ser uma galdéria, que gosta de cantar e fazer música com meio mundo, mas que no fim escolhe sempre regressar ao essencial da sua música, numa solidão de seis cordas. Para o futuro, várias notícias: em breve, teremos um segundo disco de voz e guitarra, depois outro em que haveremos de ouvi-lo tentar pôr-se no lugar de uma mulher, e depois ainda outro a cantar Sérgio Godinho, José Mário Branco e José Afonso. Uma mão cheia de novidades reveladas por quem se garante com a mesma motivação do primeiro momento. Por agora, o homem que fazia 120 concertos por ano está simplesmente feliz de poder regressar a palco. E promete parar a rua inteira só com a voz e uma guitarra.

Este disco estava pensado antes do confinamento, mas parece feito à medida dele.
Parece que veio a propósito, não é? Mas é anterior. Aliás, este disco já era para ter sido feito a seguir ao Rua da Emenda (2014). Já então tinha vontade de fazer um disco a solo, por causa das minhas referências, principalmente do João Gilberto. E porque sempre gostei muito disto... a construção dos discos todos, na verdade, acontece assim. Depois vais acrescentando coisas, mas a base é sempre a voz e a guitarra.

Como uma demo.
É mesmo isso. A ideia, aliás, era fazer uma coisa live on tape, sem grandes preciosismos. Se uma corda ficasse mal pisada, não importava: se a ideia que eu quis para a música estivesse lá, não ia estar a repetir aquele take apenas por um pormenor desses. Até porque os primeiros takes são quase sempre os melhores. Não gosto nada de passar muito tempo em estúdio, de repetir coisas até à exaustão. Mas este foi adiado a seguir ao Rua da Emenda porque meteu-se a ideia do Chico [Até Pensei Que Fosse Minha, álbum de versões de Chico Buarque, 2016], depois meteram-se os coliseus com o Miguel [Araújo], depois saiu o disco dos coliseus ao vivo, depois surgiu esta reunião com a malta para fazer o Do Avesso… o Rua da Emenda era para ter sido o final de um ciclo.

Tens isso assim bem delineado? Os passos seguintes alinhavados?
Não… não tenho pensado antes. Mas à medida que as coisas vão acontecendo, vou pensando o que é que faz sentido fazer a seguir. E esse ciclo parecia que ia mudar ali. Mas depois, o Do Avesso ainda acrescentou mais coisas, orquestra, piano, guitarras eléctricas… Foi quando andava em tournée desse disco que decidi começar a planear este a solo.

Depois de um disco com a Sinfonietta de Lisboa, três produtores diferentes e mais um exército de gente atrás, deu-te vontade de passar um tempo sozinho e em paz.
Sim. Lá está, é a questão do ciclo. Pensei: tenho que parar, não posso estar a somar mais que isto. O que é que eu ia acrescentar depois de tocar com uma orquestra, de meter um septeto em palco, depois dessas coisas todas?

Uma fanfarra…?
(Riso) Era o que faltava, de facto. Mas achei por bem sossegar tudo e dar um passo atrás.

Também queria dar um passo atrás e voltar à questão de este disco estar em sintonia com este tempo…
Sim, é verdade. E este tempo acabou por influenciar, de algum modo. No processo de gravação, por exemplo, nunca tinha feito um disco em casa.

Que tal foi isso?
Foi mais cómodo. Apesar de ainda não ter construído o estúdio que tinha ideia de construir… a minha sala funcionava como sala de ensaios, tivemos de improvisar umas mantas nas paredes por causa do reflexo do som, escolher as horas para gravar, que ao lado da minha casa estava a ser construída outra casa e nós tínhamos de ir gravando nos intervalos...

Gravando obras no intervalo das obras.
Exacto (riso). À noite não dava porque o Naná [Fernando Nunes, produtor] não gosta de trabalhar à noite e eu também não sou grande fã. Então tínhamos que escolher ali umas horas do dia. Eu tinha as músicas já preparadas, para passar o menos tempo possível em estúdio, para tentar fazer tudo de preferência no primeiro take. E então olha, fomos improvisando.

O que é que ficou adiado neste tempo para ti?
Tudo... (pausa) Já é mais de um ano... Houve ali aquela abertura, em 2020, e na altura, felizmente, fizemos logo uns quantos concertos. Depois voltou a fechar tudo outra vez. Este disco já tinha sido feito para sair antes do final do ano, aí para Novembro, mas depois fomos vendo a coisa ficando cada vez pior, e fomos adiando… Hoje em dia não adianta fazeres um disco se não o puderes apresentar ao vivo.

Os discos estão reduzidos a montras para vender concertos?
Quase só isso, sim. Apesar de eu nem me poder queixar. O meu público, felizmente, tem-me tratado muito bem e tenho vendido sempre bastantes discos. Mas sim, hoje um disco serve essencialmente para teres novo repertório para apresentares ao vivo. E não o podendo fazer não adiantava muito lançar o disco. Então optámos por lançar agora, na esperança de poder apresentá-lo ao vivo.

Como é que é passar de 120 concertos por ano para quase nada?
É uma depressão porque não consegues fazer nada em relação a isso. Não tens forma de contornar as circunstâncias. Nunca tinha acontecido, o mundo nunca tinha fechado. Então estamos todos a tentar perceber o que é que vai acontecer. Para mim foi uma frustração enorme. Tens um determinado ritmo, tens uma vida mais ou menos pensada em função daquilo que podes fazer, e depois, de um momento para o outro, nada.

António Zambujo
Mariana Valle Lima

O título do disco é uma evocação directa do João Gilberto.
Sim. Este disco foi pensado por causa disso. Na altura em que saiu esse disco (João Voz e Violão, 2000), o último dele, havia outro que eu também ouvia muito, um disco do Zeca que comecei a ouvir mais nessa altura, que era o Baladas e Canções, também só voz e guitarra, ele e o Rui Pato. Esses dois discos sempre me ajudaram a construir na minha cabeça o que é que eu queria para a minha música. E deram-me esta vontade de gravar em estúdio como se estivesse a tocar ao vivo, sem grandes preocupações, preciosismos… sem pintelhices (riso), pode-se dizer?

Creio que é o termo técnico, sim.
E então foi isso. Esses dois discos inspiraram-me muito. E depois o facto de o João Gilberto ter morrido o ano passado também me fez voltar à ideia. Acaba por ser uma pequena homenagem.

Na última vez que falámos, dizias: “Quando ouvi o João Gilberto pela primeira vez percebi que nada voltaria a ser o mesmo…”
Há assim alguns intérpretes que nos mudam. Comigo é o João Gilberto, o Chet Baker, o Tom Waits… assim aquelas grandes referências que eu oiço sempre, independentemente do estado espírito, aqueles a quem recorro mais. Se tivesse de escolher três, eram estes.

O Caetano diz que quando te ouviu pela primeira vez também pensou no João Gilberto. É um grande piropo.
Na verdade, a primeira vez que recebi esse piropo foi na Time Out, num texto do João Miguel Tavares que começava: “Se João Gilberto cantasse fado, seria mais ou menos assim.” Às tantas, o Caetano leu a Time Out (riso).

Diz que não perde uma edição. Ontem ouvi uma versão de “Mano a Mano”, do Salvador Sobral, que gravaste com a Maro e que está no Facebook dela; uma semana antes tinha conhecido a “Saia da Herança”, canção que fizeste com o João Monge para a Gisela João; antes disso li a notícia do teu dueto com a Gal Costa; uns dias antes tinha descoberto o “C’est Magnifique”, que gravaste com a Melodie Gardot...
Parece que te ando a perseguir...

Depois pus-me a pensar, e nos últimos anos acho que já te ouvi a cantar com dezenas de pessoas. És tu quem procura todos estes encontros?
Não… não sei, acho que surge naturalmente… No ano em que lancei o Quinto, fiz também uma série de colaborações. Assim de memória, com a Luísa [Sobral], com o [Samuel] Úria, com o Miguel [Araújo], com a Ala dos Namorados. O Tiago Palma [da editora Universal] dizia-me que eu era a maior puta da música portuguesa (riso).

Isso seria se fizesses a coisa só por dinheiro. Assim, quando muito, és uma galdéria.
É isso mesmo, uma galdéria. Nem sequer sei explorar bem a coisa (riso). Faço essas participações porque gosto, porque me dou bem com as pessoas e me identifico com o que fazem, porque faz sentido na minha cabeça. E eu gosto muito da Luísa, do Úria, do Miguel, dessa malta toda.

Isso é uma coisa muito das novas gerações de músicos?
Completamente, houve um tempo que não era assim. Acho isto muito bom. Encontras sempre outras coisas, vais percebendo como os outros funcionam, como trabalham, vais ouvindo outras músicas também. E tudo isso acaba inevitavelmente por te ir acrescentando alguma coisa. Acabamos por ir buscar ideias a toda a parte. Por exemplo, no Do Avesso convidei o Nuno Rafael e o Filipe Melo, porque vi um projecto que eles fizeram, o Deixem o Pimba em Paz, e gostei muito da sonoridade, dos arranjos que eles fizeram para aquelas músicas. Obviamente já conhecia o trabalho do Rafa com o Sérgio Godinho… a propósito, vou somar a tudo isto um dueto com o Sérgio Godinho.

A sério?! Isso é um grande acrescento.
Ele vai fazer uma espécie de Irmão do Meio parte II… não sei se isto se pode dizer…

Agora está dito. Que música vais gravar?
Não tenho a certeza… não me lembro agora. Fiquei preso no entusiasmo, nem dei importância a mais nada.

O Godinho é um grande promotor dessa ideia de tocar e partilhar com toda a gente…
É, não é?

Sentes que com essas trocas se cria uma onda colectiva na música portuguesa?
Um movimento, sim, inevitavelmente. Quando comecei a cantar, não tinhas tantos concertos de bandas portuguesas, tantos portugueses em festivais. Ao longo destes anos têm aparecido cada vez mais pessoas, vais aos tops de vendas e vês maioritariamente músicos portugueses, e isso acaba por ser também um sinal. Isso acontece porque existe um movimento e porque existe imensa qualidade.

“A motivação continua a mesma. É sempre a começar de novo.”

Lembro-me de dizeres que nunca tiveste grandes expectativas quanto começaste. Que tudo te foi acontecendo como uma sucessão de encontros felizes.
E é verdade. Tem sido um encontro atrás do outro e sempre a música pela música, desfrutando de tudo o que vai acontecendo... Não vou dizer que isto é tudo uma inconsciência. Tu tens noção daquilo que te vai acontecendo, da evolução. Mas também tens noção, como dizia o Eugénio de Andrade, que “o passado é inútil como um trapo”, e tens de ir sempre construindo alguma coisa. Não vou estar a viver dos discos que gravei e dos prémios que ganhei, nada dessas coisas. A minha motivação é igual à que tinha quando lancei o primeiro disco. Com outra maturidade, outro conhecimento, outras coisas, mas a motivação continua a mesma. É sempre a começar de novo.

Este disco é quase meio / meio entre canções originais e versões. As versões parecem escolhidas para fazer uma síntese pessoal das tuas influências…
Sim, acaba por ser isso...

Há Brasil, Alentejo, fado, canção latino-americana em espanhol… Foi pensado?
Acho que, ouvindo os discos todos, acabas por perceber que há sempre ali três ideias fundamentais. Há a criação de músicas novas; há a recuperação de canções, que numa fase inicial era sempre de fados antigos e de músicas tradicionais; e depois há o acrescentarmos outras coisas, como a música popular brasileira…

Mas há aqui uma escolha que se estranha mais. Como é que aparece o “Mona Lisa”?
Oh pá… vem da tournée do Do Avesso. Eu tinha lá o João Moreira e o Filipe Melo, e nós nos ensaios de som tocávamos sempre standards de jazz. Ou melhor, eu cantava e eles tocavam. E eu adorava aquilo! O “Mona Lisa” vem um bocadinho por isso e por causa daqueles discos do Nat King Cole em espanhol, que eu adoro. E então nessas brincadeiras eu ia sacando a harmonia que ainda não tinha, ia vendo com eles, até que chegou aquela versão meio ritmada que gravei no disco.

É a primeira vez que gravas em inglês?
Lá em casa, no estúdio, com os microfones ligados, comecei a tocar aquilo. O Naná perguntou o que era e eu respondi que era uma brincadeira que costumava fazer nos ensaios. E ele disse que achava incrível e que eu devia gravar. Foi assim. Nunca tinha cantado em inglês. Aliás, imagino-me muito mais a cantar em francês ou em italiano, que são para mim as duas línguas mais bonitas de cantar, tirando o português e o espanhol.

Em espanhol cantas o “Me Acostumbraste”.
Essa tem um bocadinho a ver com essa minha procura, essa minha quase obsessão quando descubro um determinado género. Aconteceu assim com o João Gilberto, como aconteceu com o Chet Baker ou o Tom Waits: tenho de ouvir tudo, ouvir muitas vezes, conhecer tudo. E aconteceu-me com a música latino-americana hispânica. Aquilo tem ali uma cena muito especial com quem me identifico. Não acredito em outras vidas, mas se tivesse tido outra antes desta, de certeza que tinha andado para ali. Depois há uma versão desta música que é da Chavela Vargas, que até foi da banda sonora do filme Babel, uma versão com a voz dela já velha, cheia de cigarros e de mescal. Impressionante. Além disso é uma música lindíssima. Então é assim que vão surgindo as ideias.

Então vamos lá a mais uma música: a letra de “Visita de Estudo”, escrita pela Maria Rosário Pedreira, sobre um miúdo que vem do Alentejo a Lisboa e dá o primeiro beijo… conta uma história tua?
(Riso) Tenho as portas abertas a muitas pessoas que me desafiam enquanto compositor e enquanto intérprete, mas o facto de trabalhar e fazer muitas parcerias com as mesmas pessoas permite que esse tipo de coisa aconteça. É o caso do Miguel Araújo ou o Pedro da Silva Martins, mas principalmente é o caso da Rosário e do [João] Monge, principalmente destes dois. Muitas vezes o que acontece é eu fazer uma melodia, mandar para eles, e eles mandarem uma letra de volta. Falamos sobre o que é que eu imagino cantar por cima daquela música…

E eles escrevem-te.
Exacto, eles escrevem-me. Nada disto é precisamente autobiográfico, mas é sempre escrito a pensar em mim, nas histórias que partilhamos em tertúlia, provavelmente vão ficando com aquilo na cabeça. Esta história da “Viagem de Estudo” não anda longe da verdade, só não tem o postalzinho no final, de que a música fala.

António e Diogo Zambujo
Kenton Tatcher

Por falar noutra vida, neste disco o teu filho canta contigo em dueto uma canção escrita por ele, “Escutando o Universo”...
Pá, isso foi a melhor surpresa de todas! Eu sabia que o meu filho sempre tocou. Sempre o conheci a tocar, a ouvir muita música. Sempre foi um tipo que ouvia muitas coisas que eu sugeria, nos últimos tempos até tem sido mais o inverso, ele sempre a mostrar-me coisas novas que aparecem e que ele gosta. Mas pronto, ele está a tirar Ciências da Comunicação…

Coitado.
(Riso) Está a acabar este ano. Houve uma altura em que percebi que ele gostava muito de escrever, escreve aliás muito sobre música também, em trabalho na Universidade. Mas só no confinamento é que ele me mostrou as músicas originais. É um tipo super reservado e tímido. Uma noite estávamos a beber uma cerveja, ele pegou na guitarra e disse-me “vê lá o que achas destas músicas”. Eram duas. E esta eu pensei logo em gravá-la, sem lhe propor nada ainda. Mais tarde, em tertúlias com malta amiga, desafiei-o a mostrar as canções a outras pessoas. À medida que ele ia cantando, fui achando que se calhar fazia sentido se ele participasse no disco. Lá arranjei coragem e felizmente consegui convencê-lo. Tocou e cantou pela primeira vez num disco.

Confesso que quando ouvi a música achei que aquilo no início eras só tu a cantar um pouco diferente.
(Riso) Mas sabes o que é engraçado? As duas avós dele, e a própria mãe, quando ele mostrou a música já gravada, no fim perguntaram: “mas quando é que tu entras?”, pensando que era sempre eu. E já houve mais pessoas que disseram isso, que o timbre é muito parecido.

No “Lote B”, o primeiro single do disco, ouve-se: “E só com uma voz e uma guitarra eu fiz parar a rua inteira”. Isto podia ser a tua biografia em 60 caracteres.
É. Por isso é que a escolhi para abrir, porque resume o disco… e sim, acaba por resumir toda a minha abordagem à música. É um bocadinho a história da minha vida.

"Imagino sempre as coisas o mais simples possível"

Dá-te mais gozo fazer parar a rua sozinho, em vez de ir com a fanfarra atrás?
Oh pá, dá! Dá muito mais. Por isso é que eu gosto muito daqueles discos [do João Gilberto e do José Afonso]. Não estou a dizer isto como crítica a ninguém, refiro-me apenas a mim: para o meu processo criativo, para a minha forma de pensar a música, imagino sempre as coisas o mais simples possível, com o máximo de espaço possível, com a respiração toda que a música tem de ter, com os silêncios. E estar sozinho com uma guitarra permite-me muito mais facilmente fazer isso.

Uma boa música tem de ser boa quando reduzida ao essencial?
Acabaste de dizer tudo: ao essencial. O essencial tem de valer por si. O resto acrescenta.

Em “Sinais”, música tua e letra do João Monge, cantas no lugar de uma mulher. “(...) as marcas de uma vida de mulher não cabem nas bainhas de um vestido”.
Este “Sinais” foi retirado de uma outra pasta que eu tenho com ele. Temos a pretensão de fazer em breve um disco, todo com músicas minhas e letras dele, sempre no papel de uma mulher…

Isso é muito Chico Buarque.
Era mesmo o que ia dizer, é aí que acabo por ir buscar isso. Temos a pretensão de fazer um disco inteiro assim, sempre no papel de mulher a falar de coisas que continuam a acontecer hoje em dia, com a malta a assobiar para o lado. O assédio sexual no trabalho, a violência doméstica, a escravidão da imagem que tens nesse texto do “Sinais”… hoje em dia se és mulher tens de aparecer igual àquela gaja que aparece na revista cheia de filtros em cima. Mesmo sabendo que estás a ser enganada, acabas por tentar alcançar aquilo, uma coisa totalmente ridícula. Quer em relação à mulher, quer ao homem, acaba por deixar de haver singularidade, é quase tudo igual, tudo em série, as mulheres têm de parecer todas assim… quando na verdade o essencial é outra coisa, é o que se sente, independentemente da aparência, da idade...

“Já não dobro um tango numa pista…”
“...mas se dançar ainda chego ao céu.” Oh pá, é o João Monge! O Monge tem essa capacidade de pôr nos versos aquilo que todos pensamos de uma maneira bonita. As letras dele são muito cinematográficas para mim, na minha cabeça vejo sempre um filme. E então estamos com esse projecto, já temos umas quantas músicas feitas…

Devem ter várias. Deram-se ao luxo de subtrair uma.
Esta do “Sinais” foi retirada dessa pasta porque achei que fazia sentido apresentar uma já. Mas recupera-se depois.

Resumindo, a próxima vez que te ouvirmos em disco vai ser no feminino.
Eh pá, não sei se vai ser já o próximo! É um processo, estamos a construir as músicas e tal. Tenho mais músicas para gravar a solo, já preparadas, que gostava de gravar para depois lançar os discos todos, tipo uma box. Tenho esse no feminino com o Monge, que é quase uma coisa de novas músicas de intervenção, no sentido em que fala de coisas que estão a acontecer agora e não podem acontecer. E depois tenho outra coisa também...

Outra?!
O Pedro (da Silva Martins) e o Luís (José Martins) têm uma coisa muito engraçada. Por exemplo, o Miguel Araújo acaba de compor qualquer coisa, põe o telefone a gravar e manda assim uma coisa rápida, o mais tosco possível. Nem cifra nem nada. O Pedro e o Luís são muito picuinhas com essas coisas e fazem logo uma coisa já com arranjos, com as guitarras do Luís, depois mais não sei o quê, e mandam a música logo muito produzida. Quando eles mandaram estas duas músicas, eu em conversa com o Luís disse-lhe assim: “gostava que um dia produzisses um disco meu”. Então ele lançou-me um desafio. Faz agora 50 anos sobre três discos fundamentais da música portuguesa…

Cantigas do Maio (José Afonso), Mudam-se os Tempos Mudam-se as Vontades (José Mário Branco) e Os Sobreviventes (Sérgio Godinho).
Precisamente! Então ele desafiou-me a fazer um disco de homenagem a esses três discos que foram tão importantes, tentando aliás ir um bocadinho pelo menos óbvio, explorando mais o Sérgio e o Zé Mário. O Zeca sempre cantei. Um novo disco com novos arranjos dessas músicas. Portanto, a ideia é fazer mais um disco a solo, depois fazer esse outro disco com o Monge e fazer este disco de homenagem a esses três discos históricos. Vamos tentar fazer isto tudo para lançar numa caixa ou uma coisa qualquer. Talvez juntar a este e fazer uma caixa com quatro ou cinco discos, sei lá.

Quando voltas ao palco?
Dia 24, Vila Franca de Xira, depois Ovar na outra semana, depois em Maio já temos algumas coisas para este disco. Dia 21 no Super Bock Arena no Porto, e dia 28 no Campo Pequeno. Vai ser um desafio engraçado, estar ali sozinho no meio do Campo Pequeno. Depois vai ser complicado, porque tenho de conciliar esses concertos do novo disco, que são a solo, com os concertos com a banda que ficaram adiados do ano passado para este. Um dia com banda com um repertório, outro dia a solo com outro repertório. Vai ser uma salganhada.

Conversa afinada

  • Música

António Zambujo, Voz e Violão é editado hoje, 23 de Abril. É o décimo álbum da carreira do músico que diz de si mesmo ser uma galdéria, que gosta de cantar e fazer música com meio mundo, mas que no fim escolhe sempre regressar ao essencial, numa solidão de seis cordas. O disco reparte-se quase irmãmente entre canções originais e versões que nos vão falando das principais influências de Zambujo: o fado, o cante, a música brasileira, as canções da América hispânica. Umas e outras explicadas aqui pelo próprio, durante uma conversa com a Time Out em que antecipa várias novidades.

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Há um manto de tristeza na música de Francisca Cortesão. Um tumulto interior mascarado de uma sensação de calma, mas também um véu de esperança que a leva a tentar fazer as pazes consigo própria. “Eu projecto isso naturalmente, mas se calhar não sou assim tão calma", conta. “Acho que sempre dei essa impressão, mesmo quando não é propriamente isso que está a acontecer. Não sou muito dada a explosões, mas acho que às vezes me faz falta.” O novo disco, Demolition Derby, divide-se entre observações sobre o mundo e ruminações internas.

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