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Cravo
©DRCravo construído em 1728 por Christian Zell e restaurado em 1973 por Martin Skowronek

Sete concertos triplos que precisa de ouvir

Um programa que inclui os concertos para três cravos de Bach é o pretexto para lembrar outros concertos para três solistas

Escrito por
José Carlos Fernandes
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O mais frequente na música orquestral é que só um galo cante na capoeira, ou seja, a maioria dos concertos destina-se a um único solista. Porém, no período barroco, era frequente que vários solistas partilhassem o protagonismo e Bach, Vivaldi e, sobretudo, Telemann legaram-nos vários concertos para três solistas, em múltiplas combinações, algumas das quais não voltaram a ser repetidas (pelo menos por compositores de primeiro plano).

A variedade de modalidades de concerto para solista(s) e orquestra do Barroco deu lugar no Classicismo e Romantismo ao domínio de um único solista, sendo este, invariavelmente, o piano, o violino e, com menor expressão, o violoncelo. Esta normalização foi tão forte que o único triplo concerto do século XIX com lugar consolidado no repertório é o de Beethoven. Mas há muito mais para descobrir...

Concertos para 2, 3 e 4 cravos de Bach no CCB

Centro Cultural de Belém. 19 de Janeiro, 17.00. 5-23€.

Sete concertos triplos que precisa de ouvir

1. Concerto para três violinos RV.551, de Vivaldi

Ano: c.1717-30

Entre os 500 concertos de Antonio Vivaldi (1678-1756) conta-se meia centena de concertos para dois solistas e outros tantos para três ou mais solistas. Curiosamente, Vivaldi investiu mais nos concertos para quatro solistas e no que designou como concerti con molti strumenti, em que atribuiu papéis solistas (necessariamente breves) a seis e sete instrumentos, do que nos concertos triplos: estes resumem-se a um concerto para três violinos (RV.551), a um para violino e dois violoncelos (RV.561) e a dois para dois violinos e violoncelo (RV.565 e RV.578).

[I andamento (Allegro), por Giuliano Carmignola, Giorgio Fava e Luigi Mangiocavallo (violinos) e Sonatori de La Gioiosa Marca, em instrumentos de época (Divox Antiqua)]

2. Concerto para três cravos BWV 1063, de Bach

Ano: c.1730

Os 14 concertos para cravo e orquestra de Johann Sebastian Bach que chegaram aos nossos dias – oito para um cravo, três para dois cravos, dois para três cravos e um para quatro cravos – foram compostos para as actuações no Café Zimmermann, em Leipzig, do Collegium Musicum, um ensemble que tinha sido fundado em 1702 por Georg Philipp Telemann e que foi dirigido por Bach entre 1729 e 1737 e entre 1739 e 1741, ano em que faleceu Gottfried Zimmermann, o proprietário do estabelecimento, e a música no café acabou.

Mas enquanto os concertos para um, dois e quatro cravos são adaptações de concertos destinados a outros solistas, não foi possível encontrar os “moldes” originais dos concertos para três cravos (BWV 1063 e 1064), pelo que se supõe que terão sido compostos de raiz para serem tocados pelo próprio compositor e pelos seus filhos Carl Philipp Emanuel e Wilhelm Friedemann.

[Por Lars Ulrik Mortensen, Siebe Henstra e Menno van Delft (cravos) e Netherlands Bach Society, em instrumentos de época, ao vivo no Muziekgebouw, Amesterdão, 2017]

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3. Concerto para dois oboés e fagote TWV 53:C1, de Telemann

Ano: c.1740

O vasto catálogo das obras de Georg Philipp Telemann (TWV) contém 17 concertos para três solistas, nas mais variadas combinações. Entre eles estão dois para dois oboés e fagote, o TWV 53:g1 e o TWV 53:C1, este último com a indicação “Concerto alla francese”, que se justifica por a combinação de solistas ser muito prezada no barroco francês e por os títulos dos andamentos serem dados em francês: “Avec douceur”, “Très vite”, “Tendrement” e “Vivement”.

[Por Washington McClain e Matthew Jennejohn (oboés), Mathieu Lussier (fagote) e Arion Baroque Orquestra, em instrumentos de época, com direcção de Jaap ter Linden (Early-Music.com)]

4. Concerto para três pianos n.º 7 K.242 Lodron, de Mozart

Ano: 1776

Mozart tinha 21 anos e estava empregado na orquestra da corte de Salzburgo há três anos quando recebeu da irmã do seu “patrão, o Príncipe-Arcebispo Hieronymus Coloredo, a insólita encomenda de um concerto para três pianos. A condessa Antonia Lodron pretendia uma peça que pudesse tocar com as suas filhas Aloysia e Giuseppa, que, como ela, eram pianistas amadoras. Como era usual nestas encomendas, Mozart ajustou o grau de dificuldade aos intérpretes, providenciando partes solistas de dificuldade moderada à mãe e à filha mais velha e uma parte fácil para a filha mais nova. Esta é tão pouco relevante que, em 1780, Mozart rearranjou o concerto para dois solistas, provavelmente ele mesmo e a irmã, Nannerl, sem perdas significativas.

[Excerto do II andamento (Adagio), por Valery Gergiev, Denis Matsuev e Daniil Trifonov (pianos) e a Orquestra do Festival de Verbier, com direcção de Valery Gergiev, ao vivo na Salle des Combins, Verbier, Suíça, 2015]

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5. Concerto para violino, violoncelo e piano op. 56, de Beethoven

Ano: 1803

O Triplo Concerto de Beethoven tem um intrigante hiato de cinco anos entre a sua composição, em 1803, e a sua primeira apresentação pública, em 1808. Pouco se sabe sobre a sua génese – um fonte sugere que Beethoven o terá composto para o Arquiduque Rudolfo, que em 1803 tinha apenas 14 anos e começara a ter aulas de piano com o compositor e viria a tornar-se no seu principal mecenas e no dedicatário de 14 obras, algumas das quais estão entre as mais notáveis que Beethoven compôs. Segundo Anton Schindler, que foi secretário de Beethoven mas é fonte pouco fiável, a estreia do concerto teve lugar no palácio do jovem arquiduque, ocupando-se este do piano e tendo como parceiros o violinista Ferdinand August Seidler e o violoncelista Anton Kraft. Sobre Seidler a informação é escassa, mas Kraft era um virtuoso de primeira água – o que bate certo com a exuberância da parte de violoncelo. Rudolph era um aluno aplicado e talentoso, mas não um prodígio, o que torna plausível que Beethoven lhe tenha destinado uma parte vistosa mas de execução relativamente fácil. Há porém um óbice sério à versão de Schindler: se o concerto foi composto para Rudolph, porque razão a partitura editada em 1804, foi dedicada ao príncipe Lobkowitz?

[II andamento (Largo), por Anne-Sophie Mutter (violino), Lynn Harrell (violoncelo), Andre Previn (piano) e Filarmónica de Londres, com direcção de Kurt Masur]

6. Concerto para violino, violoncelo e piano op. 56, de Casella

Ano: 1933

Alfredo Casella (1883-1947) foi um dos mais relevantes compositores italianos da primeira metade do século XX, embora hoje seja quase desconhecido fora de Itália. Foi aluno de Fauré em Paris, mas em 1915 regressou ao país natal, onde se consagrou à composição, ao ensino e à promoção da música italiana do seu tempo, para o que fundou, em 1923, com o compositor Francesco Malipiero e o poeta Gabriele D’Annunzio, a Corporazione delle Nuove Musiche.

O Triplo Concerto de Casella espelha, de acordo com as suas palavras, os encantos da paisagem campestre toscana nos arredores de Siena, onde foi composto. Por coincidência, tem o mesmo n.º de opus do Triplo Concerto de Beethoven, mas a sua natureza é muito diversa: enquanto Beethoven procurou conferir a cada um dos solistas o máximo de brilho, Casella tratou os solistas como o concertino do concerto grosso do período barroco, que funciona como um pequeno grupo que dialoga com a orquestra.

[II andamento (Adagio), por Mathias Wollong (violino), Danjuio Ishikaza (violoncelo), Frank Immo Zichner (piano) e Orquestra Sinfónica da Rádio de Berlim, com direcção de Michael Sanderling (Capriccio)

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7. Triplo Concertino para violino, violoncelo e piano op.47, de Tcherepnin

Ano: 1930-68

O compositor Aleksandr Tcherepnin (1899-1977) faz parte de uma dinastia russa de compositores, que inclui o seu pai, Nikolai (1873-1945), que foi aluno de Rimsky-Korsakov, os seus dois filhos, Serge (n.1941) e Ivan (1943-1998), e dois netos, Sergei e Stefan (filhos de Ivan). Aleksandr Tcherepnin nasceu em São Petersburgo, mas a Revolução Russa de 1917 levou a família a fugir para a Geórgia, acabando por, em 1921, instalar-se em Paris. Fez carreira como concertista pelo mundo fora e em 1950 fixou residência em Chicago. Deixou um total de 109 obras com n.º de opus, entre as quais está este op.47, que nasceu em 1930 como Concertino para 12 cordas e piano e foi sofrendo sucessivas mutações até estabilizar, em 1965, como Triplo Concertino para violino, violoncelo e piano.

[Pelo Göbel-Trio Berlin – Hans Maile (violino), René Forest (violoncelo) e Horst Göbel (piano) – e a Sinfónica de Nuremberga, com direcção de Uwe Mund (Thorofon)]

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