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Mónica Calle
Fotografia: Alípio Padilha

A caminho de Santiago, Mónica Calle reencontrou-se com o texto

‘Noite Fechada’ explora a palavra enquanto corpo e retoma o registo intimista de Mónica Calle, com Mónica Garnel e Inês Vaz. Estreia esta quinta-feira, 7 de Outubro.

Raquel Dias da Silva
Escrito por
Raquel Dias da Silva
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Mónica Calle, Mónica Garnel e Inês Vaz estiveram em peregrinação durante quase um mês. Partiram da Sé de Lisboa para Santiago de Compostela e daí até Finisterra, o extremo do cabo, considerado por muitos o verdadeiro fim do Caminho de Santiago. Agora, de regresso a casa e ao Teatro do Bairro Alto (TBA), onde Calle se estreou profissionalmente, em 1988, esse percurso de fé materializa-se, de certa forma. Noite Fechada, o espectáculo que estreia esta quinta-feira, 7 de Outubro, é a primeira parte do “Caminho da Meia-Noite”, um díptico através do qual a actriz e encenadora torna – tão acompanhada quanto só – à palavra dita e à dramaturgia da escritora Fiama Hasse Pais Brandão, no ambiente intimista que caracterizava a antiga sede da Casa Conveniente, companhia que dirige desde 1992.

Sentada num pátio privado na Rua do Barão, perto da Igreja de Santa Maria Maior, Calle desfruta de um cigarro, depois de um ensaio parcial com Mónica Garnel. A conversa terá de ser breve, relembra-nos, com pressa para um outro compromisso, antes de nos contar como o Caminho as surpreendeu. Nunca o tinham feito. Despediram-se de Lisboa com uma série de ideias e vontades, como escrever imenso e partilhar um diário. “Fomos ingénuas”, diz, por entre uma nuvem de fumo. “A Inês teve vários problemas físicos. A Mónica [Garnel] teve uma lesão e esteve parada durante cinco dias.” A experiência colectiva foi, no fundo, profundamente individual. É o que voltará a acontecer em Noite Fechada, numa espécie de réplica, na sala principal do TBA. Por um lado, o dispositivo cénico prevê três palcos e três plateias num único espaço; por outro, o material a ser interpretado é o mesmo.

Confrontada com a urgência súbita em redescobrir como é que a palavra faz sentido ou se faz sentido no seu trabalho, Mónica Calle – que nos últimos anos abandonou o texto em detrimento da música e da dança – resolveu apossar-se do teatro de Fiama Hasse Pais Brandão. “Não são exactamente as suas peças que me estimulam, mas o que ela propõe a partir da sua escrita”, confessa a artista, que partiu de Poe ou O Corvo (1979) para a construção de Noite Fechada, uma história povoada de referências à História do Teatro e à vida e obra de Edgar Allan Poe. Misturando ficção e realidade, as três actrizes vão todas (ao mesmo tempo, ainda que a ritmos distintos) dar voz a personagens como a Signora Psyche Zenobia, a narradora de um conto humorístico de Poe, que acaba decapitada e, em vez de mostrar desespero, se revela até satisfeita por se ver livre da sua cabeça.

“Não é possível separar a carne do espírito, ao contrário do que ela faz”, afirma Calle, que nos desafia a reflectir sobre identidade e representação através desta ideia do corpo como veículo do pensamento e da palavra, de um discurso que é primeiro interior e depois comunicado. “Este é um texto, na realidade, bastante actual, bastante acutilante, bastante crítico e cáustico.” Fala-nos, obviamente, das sensações que o corpo nos permite vivenciar, mas também das diferentes formas de as percepcionar e até de as descrever ao outro.

Após a apresentação desta primeira parte, que Calle co-assina com Mónica Garnel e Inês Vaz, o “Caminho da Meia-Noite” fica completo com O Lugar do Meio-Dia, a partir de Eu Vi O Epidauro (1985), também de Fiama, que se estreia no TBA a 14 de Dezembro. “Esse segundo texto trabalhei-o [pela primeira vez] em 1999, num espectáculo chamado O Bar da Meia-Noite”, recorda Mónica Calle, para quem a memória – e os seus espaços afectivos – também são fundamentais para o desenvolvimento do projecto artístico.

TBA (Lisboa). 7 a 12 Out. Ter e Qui-Sex 18.30 e 21.30 e Sáb-Dom 17.00 e 20.40. 5€-12€.

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