[title]
CTU, o disco com que Jorge Lima Barreto e Vítor Rua desafiaram o rock em 1982, foi remasterizado e está de regresso em vinil.
Trinta e sete anos, do Porto, muito mais vivo que morto. A assinatura com que José Mário Branco termina a desesperada e furiosa carta a que deu o nome de FMI pode, hoje, ser usada para apresentar a reedição de CTU, o álbum com que Jorge Lima Barreto e Vítor Rua inauguraram a discografia dos Telectu em 1982 (outra coincidência: partilham o ano de lançamento). Um registo atemporal cujos temas inspirados pela ficção científica de Philip K. Dick mantêm intacta a aura futurista e o desafio à norma rock vigente – tal como no início.
CTU é uma raridade em vinil. E é nesse formato que, pela primeira vez, é relançado nesta quinta-feira pela Golden Pavilion, que negociou a reedição com EMI/Valentim de Carvalho. “Conseguiram ter acesso às masters originais e pudemos remasterizar o disco da melhor forma, coisa que não foi feita na reedição do CD [em 2008]”, diz Vítor Rua. O músico destaca ainda o “brilhante texto” do jornalista Rui Miguel Abreu – a história da banda e deste disco “nunca tinha saído tão clara como neste texto” – que acompanha a reedição e a “reprodução mais similar possível” da capa original, uma serigrafia a quatro cores (concepção de Lima Barreto, que morreu em 2011) de uma pintura de Fernanda Gonçalves.
Vítor Rua era guitarrista e compositor dos GNR quando conheceu Jorge Lima Barreto, que tinha integrado com Rui Reininho a formação da Anar Band na década de 1970. Conheceram-se em 1981. “Imediatamente com o Jorge resolvemos criar um projecto novo em que se deu o nome de Telectu, que era retirado de um poema concreto do E.M. de Melo e Castro. Começámos a ter ensaios em minha casa, no Porto”, recorda. Tóli César Machado, também dos GNR, era o baterista convidado. À voz chegou mais tarde Dr. Puto. Luís Carlos participava “na parte de electrónica em tempo real e processamento de som”. “Com a certeza de que iríamos ter um disco editado na Valentim, fomos para a Bienal de Cerveira completar os ensaios”, que terminaram com um concerto em Vilar de Mouros.
CTU foi gravado nos estúdios de Paço d’Arcos, onde os pergaminhos de Vítor Rua iam de Independança, o LP dos GNR, à co-produção de Anjo da Guarda, de António Variações. Tanto um como outro têm temas com ligação à exploração sonora dos Telectu: “Avarias” e “Visões Ficções (Nostradamus)”. “Fizemos tudo de forma altamente original, criativa e invulgar para a época”, conta Rua. Como se define, então, este disco: avant-garde? “O disco é rock. É muito fácil. Agora, dentro do rock há muitas variantes. E este estaria incluído dentro de uma coisa tipo experimental, ou qualquer coisa assim, mas é um disco de rock”.
“Recordo-me de o Jorge Lima Barreto me ter perguntado: o que quer que este disco seja? E eu respondi: quero que daqui a 30 anos ainda seja avançado.” E é? “A resposta parece ser que sim”. A avaliação não é só em causa própria. “Ainda hoje mostro a alunos meus e eles perguntam se é um projecto novo”, “consideram-no experimental e difícil”. O percussionista Chris Cutler, sublinha Rua, chegou a compará-lo favoravelmente ao Remain In Light dos Talking Heads. “Considerava mais avançado. A importância [de CTU] não é só no rock nacional, é no rock mundial.” Prova disso é que é “pretendido em todo o mundo e é caríssimo. Os originais são vendidos a mil e tal euros por coleccionadores”. A Golden Pavilion vai vender os exemplares desta reedição a 20€.
+ Thurston Moore: “O rock'n'roll é profundamente espiritual”