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Teatro, Palco, F for Fake
©Estelle Valente/São Luiz

A verdade e a mentira confundem-se nos palcos do D. Maria II e do São Luiz

Os auéééu – Teatro trocam-nos as voltas com dois espectáculos em simultâneo, entre o Teatro D. Maria II e o São Luiz. Explicamos tudo, sem dar todas as respostas.

Escrito por
Mariana Duarte
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Anda por aí o rumor, alimentado pelos próprios nas redes sociais, de que os auéééu se separaram devido “a divergências éticas, políticas e pessoais”. A companhia dividiu-se em dois grupos, que estão agora numa guerra aberta para provar quem são os verdadeiros auéééu. Este conflito vai ter transmissão em directo nos palcos do São Luiz Teatro Municipal e do Teatro Nacional D. Maria II, de quarta 28 a 8 de Novembro, com dois espectáculos em simultâneo, ambos intitulados F.

De um lado, no São Luiz, estão Joana Manaças, João Silva, Miguel Cunha e João Santos. Do outro, no D. Maria II, temos Beatriz Brás, Filipe Velez, João Santos (sim, em duplicado) e Sérgio Coragem. Tudo isto é feito com a cumplicidade dos directores artísticos dos respectivos teatros, Aida Tavares e Tiago Rodrigues. Soa a drama? Sim. A demasiados egos? Também, não estivéssemos em teatro. Mas será que o break-up é mesmo verdade? Ficção, realidade ou qualquer coisa a meio caminho? As respostas são dadas no final de cada espectáculo, cujo título foi inspirado no documentário F for Fake, de Orson Welles, em que se reflecte sobre as questões de autoria e autenticidade, em particular no meio artístico – e é essa uma das problemáticas centrais destes espectáculos, cada um com o seu próprio texto e narrativa.

“Queremos abordar temas diferentes, mas que se relacionam entre si: a originalidade, a autoria, a verdade e a mentira”, explica Beatriz Brás. Apesar de em F estarem em maior evidência, são questões que têm vindo a ser abordadas pela companhia lisboeta ao longo do seu percurso, estabelecendo pontos de contacto com o trabalho de outras companhias como a mala voadora, Teatro Praga, SillySeason ou Cão Solteiro. “Nós trabalhamos muito esta ideia de como é que a realidade se torna ficção, e vice-versa, e a questão das identidades: até que ponto eu, quando estou em palco, sou mais ou menos autêntica? E o que é isto de ser verdadeiro ou não? No teatro, com tantas referências que eu tenho, é possível ser original?”, interroga a actriz e criadora, referindo que os “mentirosos profissionais” de que se fala num dos textos podem ser, precisamente, os artistas.

Este jogo de espelhos vai beber a uma série de referências. Entre elas, Guy Debord e a sua A Sociedade do Espectáculo; René Pollesch e a peça O Amor É Mais Frio Que o Capital, em que se questiona se haverá “uma vida verdadeira no falso”; e, inevitavelmente, Luigi Pirandello, com Para Cada Um Sua Verdade, texto a que os auéééu foram buscar a personagem de Laudisi. “O nosso Laudisi é o João Santos, que funciona como o território neutro. Esteve a viver em Itália, então está um pouco à parte destes conflitos. Quando voltou, não quis tomar partido”, diz Beatriz Brás. À semelhança da peça de Pirandello, este Laudisi vai ateando a confusão e provocando a dúvida nos espectadores.

“Este espectáculo é também o reflexo da nossa geração, uma geração da pós-verdade”, assinala a actriz. “Com a internet, tudo pode ser mentira, tudo pode ser verdade. A nossa geração vive um bocado disso. Em quem acreditar? Nas instituições, que detêm um poder simbólico?” Toda esta questão da autenticidade e da ficção vs. realidade, que estão no âmago da própria construção teatral, “fala-nos da vida”, considera Beatriz Brás. “O teatro interessa-nos para pensar a vida, não é só para ficar aqui numa sala. Interessa- -nos pensar além dele, nas nossas camadas sociais, o que é isto de ser mais eu. Quando eu estou na casa de banho a fazer xixi, não será também uma ideia daquilo que eu sou? Será que sou mais eu do que quando estou a dar uma palestra? Em última análise, será que não estamos sempre em personagem, em papéis?”

No meio de tantas perguntas, o teatro e o artifício podem ser o veículo para “chegar mais perto de uma verdade”. Seja lá o que isso for, como bem sabem os auéééu.

28 de Outubro a 8 de Novembro. Qua-Sáb 19.30, Dom 17.30. 12€ (São Luiz), 11€ (D. Maria II).

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