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“Antígona” esteve sempre à espera de Mónica Garnel

Escrito por
Miguel Branco
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A temporada da Sala Garrett do Teatro Nacional D. Maria II abre com Antígona, de Sófocles, numa encenação de Mónica Garnel. É a humanidade num armazém onde chove lá dentro. Clássico.

Para que ninguém se atrevesse a assaltar o trono e as gentes de Tebas, o novo líder da cidade, Creonte, decide enterrar com os desígnios do Olimpo o corpo do Etéocles e deixar Polinices sem honras fúnebres, irmãos de Antígona que se mataram a tentar chegar à cadeira do poder. À boca de cena, com o pano ainda descido e todo o elenco a encurralá-las, Antígona avisa a sua irmã Esmena que não ficará de braços cruzados a ver isto acontecer. Esmena diz-lhe que esteja quieta, que esse desejo de justiça é impossível, que o seu destino será o calabouço ou a morte. Assim começa Antígona, tragédia grega de Sófocles que abre a temporada do Teatro Nacional D. Maria II (TNDMII) pela mão de Mónica Garnel.

Estamos numa espécie de fábrica, armazém, cave meio devoluta onde tudo parece poder acontecer, onde não há espaço para sacos de terra a simular palanques de deuses, onde se efectiva uma actualização de um clássico que aqui assume uma estética nova, com espaço ainda para coreografias de grupo e ainda break dance, algo que Sófocles, por certo, não terá tido tempo para imaginar. “Fui à procura do invisível, do que não está lá tanto, sobretudo porque me interessava actualizar este clássico. Achei que tentei trazer este texto à terra, concretizá-lo, que não ficasse aquele lado mais poético ou grego”, explica Garnel.

Voltando ao enredo, claro, dito e feito, Antígona acaba presa pela ousadia de enfrentar Creonte depois de sepultar condignamente o corpo do seu irmão Polinices. E, abrindo ainda mais o quadro, Antígona é uma peça que aproxima a lente da temática da justiça humana, os direitos humanos e a igualdade de género e de classe, e, obviamente, a política, a ideia de liderança de uma cidade tão embebida na corrupção. E não só: “Acho que a Antígona está cheia de dicotomias, e uma delas é a homem vs mulher, o papel da mulher está muito claramente no texto, tanto que nem é preciso sublinhar. Mais do que isto ser a tragédia da Antígona, isto é a tragédia do Creonte e em última análise a tragédia de todos nós, a existência destes conflitos fundamentais do homem na vivência em sociedade, e também de pensar o que é isto de seres líder”, conta a encenadora.

Esta é a primeira encenação de Mónica Garnel para o TNDMII e logo assim, com um texto de um autor clássico, quando o que havia feito até aqui era o contrário, era convidar autores portugueses para lhe escrever um texto – belo exemplo disso é The Swimming Pool Party, espectáculo apresentado em 2018 no São Luiz com texto de Ricardo Neves-Neves e que terá agora uma reposição entre 27 de Setembro e 13 de Outubro. Mas há mais: Antígona é a peça com que Marianinha, ou Mariana Rey Monteiro, avó de Mónica Garnel, se estreou no teatro, em 1946, na companhia dirigida pelos seus pais Amélia Rey Colaço e Robles Monteiro. Portanto, Antígona sempre esteve à espera de Garnel.

Outro dado é o facto de aqui haver seis combinações possíveis de elenco. Isto porque as três actrizes – Carolina Passos-Sousa, Diana Lara e Joana Pialgata – rodarão na interpretação de Antígona e Esmena. Algo que aprofunda um “estado de alerta”, “o erro como matéria de trabalho”, um lugar que Mónica Garnel confessa gostar de trabalhar. É o perigo de se fazer o que se acha que tem que ser feito. O mesmo mal de que padece Antígona.

De Sófocles
E
ncenação Mónica Garnel
Com André Simões, Carolina Passos-Sousa, Diana Lara, Isaías Viveiros, João Grosso, Joana Pialgata, Laura Aguilar, Lúcia Maria, Manuel Coelho, Maurice, Paula Mora, Pedro Moldão e Pedro Russo

TNDMII. Qua e Sáb 19.00. Qui-Sex 21.00. Dom 16.00. 6,75-12€. 

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