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Life & Beth
Disney+Beth e a Vida

‘Beth e a Vida’, ou a crise de meia-idade de Amy Schumer

Amy Schumer cria, escreve, realiza, produz e protagoniza a nova série da Disney+, uma comédia dramática em que faz prova de vida enquanto actriz séria.

Hugo Torres
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Hugo Torres
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As canções são assim: intrometem-se. Inesperada e inapelavelmente. Por exemplo, quem diria que diante da nova série da Disney+, Beth e a Vida, comédia dramática com episódios de meia hora, como se fosse uma sitcom (que não é), sobre uma mulher que trabalha como comercial numa distribuidora de vinhos em Nova Iorque, e que se sente miserável, quem diria que diante dessa premissa estaríamos a cantarolar uns versos escritos há 40 anos em Lisboa? “Muda de vida/ Se tu não vives satisfeito/ Muda de vida/ Estás sempre a tempo de mudar/ Muda de vida/ Não deves viver contrafeito/ Muda de vida/ Se há vida em ti e outro jeito”. Eis António Variações, pobre diabo que se fez marçano que se fez barbeiro que se fez cantor que se fez ícone, a abraçar a universalidade, Hollywood incluída, pensamos nós enquanto avançamos pela história criada por Amy Schumer sobre uma crise de meia-idade no feminino. Enquanto vamos ruminando na ideia de que os versos-chave da canção são o terceiro e o quarto, e não os dois primeiros. Estamos sempre a tempo de mudar – e é isso mesmo que Beth fará, embora só depois de uma sequência de acontecimentos-choque.

Uma morte e um diagnóstico médico alarmante levam Beth (Amy Schumer) a pôr em causa a vida que leva em Manhattan, o trabalho, o longo relacionamento com Matt (Kevin Kane), que trabalha na mesma empresa que ela e é uma estrela das vendas; levam-na a questionar se a infelicidade que sente se deve à inércia, ao facto de se deixar levar e evitar decisões que causem atrito. Quando é atingida pelo duplo baque, termina o namoro e resolve fazer um intervalo da cidade – volta à bucólica Long Island natal, de onde havia fugido anos antes, para reavaliar opções. É por lá que se desenrola grande parte dos dez episódios. É onde Beth se vai confrontar com os fantasmas do passado, com os acontecimentos e as idiossincrasias familiares que a puseram no caminho em que está, através de flashbacks em que a vemos como adolescente (Violet Young) em confronto com uma mãe controladora e com grande necessidade de atenção (Laura Benanti). É onde ficamos a conhecer melhor a sua circunstância familiar, ainda com o pai (Michael Rapaport) e a irmã, Ann, que na idade adulta (Susannah Flood) nem sequer se aproxima da mãe, ao contrário de Beth, que mantém com Jane uma relação de co-dependência.

A protagonista está a ser vista como uma construção semi-autobiográfica e uma mobilização para a ficção dos anos mais recentes de Amy Schumer: o casamento, os problemas de saúde, a gravidez difícil, a maternidade… A comediante faz aqui um papel sério, deixando o humor sobretudo para as personagens que a rodeiam. O que não invalida que haja momentos em que esta comédia dramática se aproxima do formato de sketch que a celebrizou em Inside Amy Schumer. Há, no entanto, uma componente dramática inultrapassável em Beth e a Vida, que trata afinal de uma depressão e das suas profundas raízes, impedindo esta mulher de ter uma vida plena. Para impedir que a série se torne demasiado pesada, Schumer, que escreveu metade dos episódios e realiza quatro deles (e é produtora executiva), experimenta e mistura formatos. Vai até à comédia romântica, que protagoniza com a personagem de Michael Cera. Este faz um trabalhador rural com poucas aptidões sociais, John, de quem Beth se vai aproximando assim que chega a Long Island. Um casal que, diz a imprensa americana, se comporta em conjunto tal como Amy Schumer e o marido, o chef Chris Fischer, na vida real, numa espécie de desconexão amorosa.

Beth e a Vida tem este lado quase voyeurista. Mas também existe uma forma mais desapegada de a recomendar: se gostou da recente Somebody Somewhere (HBO Max), com Bridget Everett, antiga compincha de Schumer, é provável que venha a gostar desta série, que se estreia no Disney+ esta quarta-feira, 18 de Maio. Se não for por isso, que seja para ver o grande David Byrne (Talking Heads), nos seus gloriosos 70 anos, a fazer (mais) uma perninha na televisão. É possível que desencadeie uma noitada a limpar o pó e a ouvir discos antigos. Até porque, se levamos alguma coisa daqui, é que vamos sempre a tempo.

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