[title]
Corpetes cor-de-rosa, luvas de noiva violeta, camisas de noite rendilhadas e robes acetinados – é como abrir o baú de um quarto de vestir feminino, daqueles de tempos idos, e fazer da lingerie a prata da casa. É nisso que assenta a Boudoir Vintage Boutique, uma loja nascida no online e que ganhou casa na Almirante Reis. O holofote aponta para a roupa íntima vintage mas há mais roupa em segunda mão, objectos de decoração e ainda um estúdio de tatuagem.
Catarina Querido, nome sonante para quem era frequentador assíduo do antigo espaço Anjos70, já tem história neste mundo do vintage – além de ter encabeçado a associação, que deu por terminada a sua actividade no Verão passado, era também ela a organizadora da mítica Feira das Almas, que mais tarde veio a chamar-se Anjos 70 Art & Fleamarket (as próximas edições estarão para breve). É-lhe natural viver rodeada de achadões.
“A coisa começou ainda eu estava nos Anjos, era eu também que organizava a feira mensal, e acabei por ter lá uma banca minha onde já começava a vender peças”, conta. “Sempre estive muito ligada a este mundo do vintage e comecei a sentir uma atracção especial por peças que não encontras em quase nenhuma loja vintage, como é o caso da lingerie”.
Apesar desse carinho especial, Catarina confessa que “por motivos óbvios” as peças de roupa íntima vintage são sempre as que acabam por suscitar mais dúvidas à clientela, que acaba por optar por fast fashion na hora de escolher as peças de roupa interior.
Mas aqui a história é outra. O nome da loja remete, desde logo, para o cenário daquilo que nos tempos das monarquias era uma pequena sala que era usada por senhoras, para se vestirem sobretudo, e para passarem tempo, receberem visitas, escreverem ou bordarem – era assim que se caracterizava um boudoir. Mas no número 238A da Almirante Reis não há motivos rococó, dourados brilhantes ou mobiliário espampanante, a lingerie é mesmo a peça que mais brilha.
A loja nasceu no Instagram, onde Catarina já fazia as suas vendas habituais, mas ter um espaço físico não lhe saía da cabeça. A Covid ajudou, apesar de infortúnio para uns, acabou por se tornar numa oportunidade para outros – foi o caso. O espaço onde agora se ergue a Boudoir fechou devido à pandemia e Catarina agarrou-o. “Sempre foi um interesse enorme que eu tinha, porque já nos eventos que eu fazia no Anjos70 sempre tive um lado mais sex positive e sensual, e comecei a ver que havia de facto um nicho por explorar”, explica. “Só faltava complementar a marca com um espaço físico e aconteceu”.
Corpetes acetinados na parede chamam a atenção, muitos deles tingidos por Catarina. “Eram de peças de noiva e são sempre naqueles tons pérola, então decidi dar um ânimo às peças”, diz, mostrando que fez a mesma obra de arte com umas luvas brancas de noiva e que agora, expostas na vitrine, são rosa e violeta. Outras tantas peças douram os charriots e as mesas, soutiens e cuecas de renda, robes de cetim, camisas de dormir, bralettes ou conjuntos, vale tudo. Também encontra inúmeros pares de collants de outros tempos, que “muita gente compra para coleccionar a embalagem vintage”.
“Grande maioria do que eu tenho aqui é lingerie vintage que nunca foi usada. Consegui ficar com stocks de lojas que nunca foram vendidos, tenho muito deadstock, e acabo por aproveitar peças que vêm do fecho de fábricas”, conta. “É tudo sobretudo dos anos 50, 60 e 70, coisas incríveis que nem parece que os anos passaram por elas”.
Mas a lingerie, apesar de uma peça chave do puzzle da Boudoir, não ocupa toda a loja. Se de um lado brilha a roupa íntima, do outro há outros tantos charriots cheios de roupa retro e em segunda mão – e até coisas por estrear –, das calças aos vestidos, dos sapatos às camisas, das malas aos acessórios, há de tudo. Inclusive peças de mobiliário e decoração que não estão lá só para compor, estão à venda também – o candeeiro ilustre ou o castiçal fosco.
Catarina tem ainda uma zona dedicada a peças de designer e de grandes marcas que vende a preços simbólicos, em relação ao preço real de cada artigo.
As vendas no Instagram e no site da marca continuam activas, porque “há sempre clientes que não se podem deslocar à loja”, diz Catarina, que opta por manter os três canais de vendas abertos e ter ainda peças exclusivas apenas no online.
E se no piso térreo o vintage dá o encanto à coisa, quem desce à cave depara-se com um open space desafogado que se divide entre o armazém dos achados de Catarina, um estúdio de tatuagens e um atelier de costura.
Catarina partilha o espaço desde o início com Charlene Boieiro, mais conhecida como Françoise Tattoo, e é no piso subterrâneo que a artista faz da tinta e das agulhas a sua arte maior. Charlene, porém, tem a particularidade de marcar na pele desenhos de outros artistas, dando-lhes espaço para levar as suas criações no corpo de outros.
Já o atelier de costura está entregue a Naára e ao seu projecto Kahumbi – para já esta estadia ainda não é permanente, mas acaba por ser um complemento à loja. Além das criações de moda da marca, Naára está responsável por aulas de costura particulares ou em grupos de iniciação e aperfeiçoamento de costura, assim como iniciação à modelagem e ainda workshops de upcycling de peças.
“Além das actividades e das aulas que conseguimos ter aqui, acaba por me ajudar em alguns arranjos de peças que vou tendo e que precisam de ser aperfeiçoadas aqui ou ali”, explica Catarina. “Acho que num espaço como este faz todo o sentido termos esta ligação à costura, criámos boas sinergias e acho que pode resultar muito bem”.
Avenida Almirante Reis, 238A (Alameda). Ter-Sex 14.00-19.30, Sáb 10.00-13.00.