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Serviços de Transporte, Bicicletas modificadas, Coobi
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Coobi: um serviço de estafetas mais justo e sustentável

Andam por aí duas bicicletas de carga cheias de encomendas. Apresentamos a Coobi.

Renata Lima Lobo
Escrito por
Renata Lima Lobo
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Se há coisa que não falta nas ruas de Lisboa e do Porto são estafetas de entrega de refeições associadas a grandes plataformas. Andam de mota, bicicleta ou trotineta, veículos que alugam ou compram por sua própria conta e risco, numa actividade muitas vezes associada a deficientes condições de trabalho. Em Março, no Porto, muitos estafetas inscritos em algumas dessas plataformas deram um murro na mesa e fizeram greve, exigindo, por exemplo, um aumento no pagamento durante os horários com maior fluxo de trabalho ou mesmo um aumento do valor pago por quilómetro, na sequência do aumento da gasolina e gasóleo.

Quem não depende das oscilações dos preços de combustível é a Coobi, um serviço criado a partir de um modelo cooperativo de estafetas, que está só a afinar as últimas peças para sair à rua em modo sustentável. Mas, neste arranque, a operação vai estar mais ligada à distribuição de produtos de empresas parceiras. Já lá vamos.

A ideia foi pensada por Hugo Charbonnier e Fernando Santos, que há dois anos, à boleia da pandemia, começaram a pensar numa forma diferente, e mais justa, de distribuir mercadorias pela cidade: uma cooperativa de entregas sustentáveis, um modelo que esperam ver replicado por mais cidades portuguesas. “É uma alternativa às grandes plataformas de entregas ‘uberizadas’, que exploram o trabalhador e cobram custos elevados aos comerciantes”, diz Fernando. Brasileiro, chegou a Portugal há três anos para tirar um mestrado na área de Política Social, focando-se precisamente no tema do trabalho precário em plataformas de entrega. Foi durante um intercâmbio na Austrália que viveu de perto a realidade dos estafetas dessas plataformas (onde se chegou a inscrever) e a falta de condições de trabalho, aliada aos elevados custos cobrados aos comerciantes, sensibilizou-o.

Chegado a Portugal, conheceu Hugo, sociólogo francês a viver em Lisboa há quatro anos e muito envolvido nesta questão da ciclomobilidade, que participava num conjunto de sessões virtuais organizadas por um grupo de cidadãos, onde se debatiam alternativas para promover o trabalho digno, alternativas às tais plataformas de entregas, como a criação de uma cooperativa. “É uma questão complicada, a da isenção de responsabilidade em relação ao trabalhador que usa os seus próprios recursos. Na cooperativa todos participam na tomada de decisão, é uma democracia”, defende Fernando.

Serviços de Transporte, Bicicletas modificadas, Coobi
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A ideia estava lá, mas era preciso dar seguimento e foi aí que contaram com a ajuda de parceiros que já estavam no terreno com iniciativas próximas da filosofia da Coobi. Por um lado, a CICLODA – Associação Oficina da Ciclomobilidade (conhecida pela sua Cicloficina dos Anjos) que encaminhou o projecto para o programa Bairros Saudáveis, um programa público criado em 2020 para financiar projectos que contribuam para a melhoria das condições de saúde, bem-estar e qualidade de vida da comunidade. E, por outro, a cooperativa multissectorial Rizoma, que já tem uma base de cooperantes muito grande e acolheu a Coobi no seu sector ‘Serviços’.

A circulação vai começar em menos de um mês, com a ajuda das primeiras duas bicicletas de carga eléctricas, o grande investimento deste projecto, que contou com um financiamento de 38.600 euros. Recursos que só ficaram disponíveis em Novembro de 2021, altura em que puderam começar a pensar na compra dos veículos (cada bicicleta rondou os 5000 euros) ou na construção do site oficial, que já está disponível, embora faltem alguns pequenos ajustes. E já estão a angariar os primeiros parceiros. “Um produtor de vinho de Setúbal pode ter uma distribuição no centro da cidade. Fazemos recolha no nosso local e distribuição pelos clientes do produtor em Lisboa”, explica Fernando, acrescentando que para muitos produtores é complicado fazer distribuição em Lisboa num carro ou carrinha. “Porque o trânsito não é fácil e a bicicleta tem maior agilidade para parar em frente às lojas. Uma carrinha causa transtornos ao trânsito e peões”, diz. As bicicletas estão prontas a circular, mas ainda é preciso “pintar e logotipar” as caixas que irão a bordo com os mais variados produtos.

Há espaço para crescimento no horizonte, embora o modelo on-demand de entregas não faça parte do actual plano. A Coobi vai começar a circular com rotas fixas, como entregas semanais pré-acordadas, ao mesmo tempo que se aliou à Coopcycle, uma federação internacional de cooperativas e uma rede solidária que aposta na partilha de recursos. Como uma plataforma que permite criar lojas online ou integrar uma app semelhante às que estamos habituados a usar para recebermos comida em casa ou no escritório, mas dentro do contexto cooperativo, um serviço em marcha em países como Alemanha, França, Espanha e Bélgica. “A questão da ciclomobilidade tem crescido muito, não só em Lisboa. E percebemos que é um modelo viável, porque está em grande crescimento noutras cidades da Europa. O modelo cooperativo é muito interessante, porque é aberto e outras cooperativas podem adoptar. E podemos criar uma rede em Portugal”, sonha Fernando, que para já prefere apostar na sustentabilidade financeira da Coobi, antes de avançar para o on-demand: a prioridade da cooperativa é ter um modelo virado para o que classificou de “trabalho decente”.

www.coobi.pt

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