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The Crown
Des Willie/NetflixThe Crown

Duas mulheres e meia

À quarta temporada, ‘The Crown’ divide o protagonismo de Isabel II com Margaret Thatcher e uma Diana Spencer em ascensão. A série de prestígio da Netflix regressa este domingo, dia 15.

Hugo Torres
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Hugo Torres
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É disto que o meu povo gosta. Se Jorge Perestrelo tivesse vivido para escrever sobre séries de televisão, em vez dos tonitruantes relatos da bola com que nos colava os ouvidos à telefonia sem fios (a expressão “ripa na rapaqueca” ficou para a história da rádio), talvez o lêssemos, a propósito da quarta temporada de The Crown, a fixar em letra de forma este elogio ao que de mais empolgante se passava dentro das quatro linhas. No caso, dentro das quatro linhas que fazem do ecrã um rectângulo. E tal se deveria ao facto de a narrativa da sumptuosa série da Netflix ter chegado ao mais popular e publicamente escrutinado período histórico do reinado de Isabel II – a década de 1980. Os anos em que o Reino Unido foi apresentado a Diana Spencer e se apaixonou pela futura Princesa de Gales, a “princesa do povo”, e depois viu transformar-se em ruína o alegado conto de fadas vivido com Carlos. É esse o grande apelo da nova leva de episódios, que se estreia no domingo, dia 15. No entanto, tal como a história de Lady Di se desenrolava mais nos bastidores do que aos olhos do público, também The Crown vai para lá do foguetório e se centra em duas personagens de peso deste tempo: a rainha, naturalmente, e Margaret Thatcher. 

Gillian Anderson como Margaret Thatcher
Des Willie/NetflixGillian Anderson como Margaret Thatcher


Isabel II, em versão sobranceiramente equilibrista, é personagem que já conhecemos. É a segunda temporada em que Olivia Colman lhe veste a pele, depois de o papel ter estado confiado a Claire Foy nas duas primeiras – e a última, visto que a já confirmada quinta temporada entregará a coroa a Imelda Staunton (
Vera Drake). Thatcher, não. Thatcher é novidade. E a abordagem à “Dama de Ferro”, também. Gillian Anderson (Sex Education) dá corpo à primeira mulher a governar o Reino Unido a partir de Downing Street e carrega, como não poderia deixar de ser, no radicalismo político da personagem, na firmeza, na obstinação. Em tudo o que a colocará em confronto com a rainha, com o povo britânico, e até com a Argentina, do outro lado do mundo. Mas não só. “Em última análise, a Thatcher que interpreto é uma Thatcher que está de acordo com a forma como o Peter Morgan escreve The Crown. Há muita humanidade nos seus guiões, ponto final. Não importa a personagem. Isso não difere com Thatcher. E portanto vamos ver mais do que aquilo que a estamos acostumados, vamos vê-la como esposa, como mãe. Essas características dela vão aparecer tanto como a vertente política”, antecipou Gillian Anderson ao L.A. Times

Esta é a segunda e última temporada de Olivia Colman como Isabel II
Liam Daniel/NetflixEsta é a segunda e última temporada de Olivia Colman como Isabel II

A actriz sublinha na mesma entrevista que estaremos perante “uma caracterização de Thatcher muito mais tridimensional do que aquela que se obtém num documentário político ou quando alguém pensa no seu papel histórico”. “Se não for compaixão – porque há muitas pessoas que, independentemente de tudo isto, nunca sentirão compaixão por ela –, suscitará pelo menos a sensação de um ser humano que era mais do que apenas retórica e política.” A palavra-chave está ali no meio: humano. Peter Morgan, o criador da série, e Gillian Anderson (um casal na vida real) vão humanizar Thatcher. É dizer muito – mas não é surpreendente. Na terceira temporada, The Crown tornou uma outra personagem pouco querida, Carlos, num destinatário de solidária complacência. “Fiquei muito satisfeito que a maioria das pessoas tenha dito: ‘Meu Deus, tenho muita pena do príncipe Carlos, aquele pobre menino’. Porque agora vou tirar-lhes o tapete”, ria-se Josh O’Connor, o actor que o interpreta, numa conversa com a InStyle em Fevereiro. “Não, isso não é necessariamente verdade”, corrigia. “A única coisa em que estou interessado é na nuance. Não acho que ninguém seja completamente inocente ou completamente brilhante, e isso de certeza para o príncipe Carlos. Penso que Diana também não era inteiramente inocente – isto em termos ficcionais, na nossa história –, portanto haverá altos e baixos. Dificuldades com Camila [Parker Bowles, amante de Carlos por esta altura; casaram em 2005] e com toda a família. Vai ser, espero, uma verdadeira viagem, uma série interessante para as pessoas verem.”

Para O’Connor, o que se segue é “a melhor temporada até ao momento”. Começa no final dos anos 1970, quando a família real se inquieta com o estado civil de Carlos, solteiro aos 30, e se atarefa para garantir uma linha de sucessão – isto é, arranjando noiva para o príncipe. Será Diana Spencer, de apenas 19 anos. “Emma Corrin faz de Diana, e interpreta-a incrivelmente bem, é formidável”, introduzia Josh O’Connor. Num longo perfil da Vogue britânica publicado em Outubro, Corrin contribuía para alimentar a expectativa, tal foi a ligação que criou com a personagem: “Sinto que passei a conhecer Diana como se fosse uma amiga.” Corrin tem 24 anos. Tinha um quando a princesa de Gales morreu, em 1997. “Eu sei que isto soa muito estranho, mas ela dá-me uma grande sensação de companhia. Suponho que seja porque, com o tempo, se cria empatia e compreensão. Adoro descobrir as pessoas.” Corrin parece ter passado muito tempo com a sua personagem, e a própria Diana estará, nesta temporada, a descobrir-se, a adaptar-se, ainda discreta por comparação com os outros dois colossos: Thatcher, naturalmente, e Isabel II, que na sua egrégia subtileza funciona como um estabilizador – político, narrativo – numa década de grandes escândalos. A rainha é o centro de tudo, mas para quê fazer disso espalhafato?

Netflix. Dom (Estreia T4).

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