Notícias

‘Expedição ao Árctico’. O frigorífico do planeta está avariado

O registo televisivo da “expedição do século” é um relato alarmante. O primeiro de dois episódios estreia-se este sábado no Odisseia.

Raquel Dias da Silva
Jornalista, Time Out Lisboa
Upriser Lead Sampling
Fotografia: Lianna NixonExpedição Ártico: Um Ano no Gelo (2021). Expedição MOSAiC, no Pólo Norte. A cientista oceânica Zoe Koeing e o cientista BGC Manuel Dall'Osto conduzem perfis oceânicos à frente de um Upriser, um instrumento que mede a turbulência em todas as camadas do oceano.
Publicidade

Mais de um século após as primeiras travessias pelo Árctico, uma equipa internacional de mais de três dezenas de cientistas inspirou-se numa dessas viagens pioneiras, a do explorador norueguês Fridtjof Nansen, e decidiu levar a cabo a maior expedição científica já realizada no Pólo Norte. Durante pouco mais de um ano, estudou-se uma das regiões mais afectadas pelas alterações climáticas. Com um “tesouro de dados e incontáveis amostras” a bordo, o quebra-gelo alemão Polarstern regressou ao porto de Bremerhaven, no Mar do Norte, no final de 2020. Agora, o canal Odisseia traz-nos o relato de um dos maiores esforços da humanidade para compreender o que o futuro nos reserva, e o que podemos fazer para o mudar. A primeira parte do documentário Expedição ao Ártico: Um Ano no Gelo estreia-se a 23 de Outubro, pelas 16.00.

O Polarstern partiu do porto norueguês de Tromso, com destino ao Árctico Central, em Setembro de 2019. Uma vez lá, o primeiro desafio da expedição MOSAiC foi encontrar uma banquisa – uma camada de gelo flutuante – suficientemente forte para suportar o navio e os diferentes laboratórios, que foram posteriormente instalados ao seu redor. A operação envolveu movimentar toneladas de tecnologia de ponta antes de o Inverno árctico fazer desaparecer o sol. Pela frente, meses de escuridão permanente, frio intenso e muitos outros desafios, desde encontros com ursos polares a confinamentos forçados pela pandemia de Covid-19. É difícil imaginar, mas não é preciso. Em dois episódios (o primeiro estreia-se este sábado, o segundo no sábado seguinte), documentam-se as descobertas feitas no considerado “epicentro do aquecimento global”.

O gelo do Árctico está a desaparecer

A bem da verdade, os preciosos dados da expedição, que custou cerca de 150 milhões de euros, devem demorar anos ou mesmo décadas a ser integralmente processados. Apesar disso, a MOSAiC é já um marco histórico para o estudo das alterações climáticas e os resultados preliminares são suficientes para nos deixar alerta – e, sobretudo, reivindicar decisões políticas fundamentais e urgentes. É que, infelizmente, a calota polar é menor do que o previsto, o que afecta as estações do ano: o Verão no Árctico não só está a começar mais cedo como a prolongar-se. Com o gelo marinho a cobrir apenas metade da superfície que ocupava há 40 anos, o Árctico parece estar a aquecer mais depressa do que qualquer outro local do planeta. Se nada fizermos, as consequências prevêem-se cataclísmicas. Desde a subida do nível do mar até ondas extremas de calor e de frio.

“Só me juntei à expedição nos últimos três meses, mas estive a estudar, por um lado, a forma como as nuvens se formam por cima do Árctico e, por outro, como é que a composição química do oceano afecta a formação dessas nuvens, que são muito importantes para o resfriamento do planeta”, conta-nos por telefone o cientista Manuel Dall’Osto, que trabalha actualmente no Instituto de Ciências do Mar de Barcelona. “O navio esteve lá um ano, por isso foram feitas medições todos os dias. Foi possível identificar, por exemplo, diferentes perfis de salinidade e uma camada superior de água doce, mais fria e menos densa. Esse lençol congela mais facilmente, mas também derrete mais rápido. A amplificação do Árctico é um facto, o que significa que as temperaturas são quatro graus mais altas do que a média.”

O potencial desaparecimento do gelo no Árctico é um dos pontos críticos para o aquecimento global irreversível. “Uma das primeiras minas num campo de minas”, disse às agências internacionais o climatologista e físico Markus Rex, que liderou a MOSAiC. “As alterações climáticas já estão a decorrer. Não há discussão. Está a acontecer, é grave e vai piorar: mais tempestades, mais furacões, mais incêndios”, confirma Manuel Dall’Osto, sem hesitar em convocar uma revolução verde. Como sociedade, precisamos de começar a optimizar os recursos do planeta e investir em força nas políticas ambientais. Como indivíduos, temos de parar de arranjar desculpas – porque sim, todas as acções, por mais pequenas que pareçam, contam. “Andar de transportes públicos e a pé, combater o plástico, adoptar dietas sustentáveis. Por exemplo, não comer ananases no Inverno e beber bom vinho português [em Portugal].”

Odisseia. 23 e 30 de Outubro. Sáb 16.00

+ Seis documentários sobre alterações climáticas a não perder

+ Leia já, grátis, a edição digital da Time Out Portugal desta semana

Últimas notícias

    Publicidade