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Televisão, Série, Aventura, Fantasia, Loki (2021)
©DRTom Hiddleston em Loki

‘Loki’, a série da Marvel que enterra um deus em burocracia

A nova série do Disney+ atira o Universo Cinematográfico da Marvel contra a quarta parede, mantendo a ficção. ‘Loki’ estreia-se esta quarta-feira.

Hugo Torres
Escrito por
Hugo Torres
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A absorção da Marvel Television pela Marvel Studios é, provavelmente, o melhor que aconteceu ao Universo Cinematográfico da Marvel (UCM) desde Homem de Ferro (2008). Depois de uma dúzia de séries produzidas paralelamente ao longo da década passada (de Os Agentes S.H.I.E.L.D. a Helstrom), o sucesso e a crescente influência do produtor Kevin Feige, assim como a “guerra do streaming”, levaram a casa-mãe, a Disney, a mudar de estratégia: as séries de televisão da Marvel também passariam a estar sob controlo criativo da equipa que tem navegado esta complexa e titânica narrativa no cinema (23 filmes, cinco curtas-metragens). Esta, por sua vez, parece ter encontrado no formato uma forma de se reinventar – desde logo porque, contando com os actores das produções para o grande ecrã e orçamentos igualmente ambiciosos, as séries têm uma preciosa vantagem em relação aos filmes: tempo. Em vários episódios, é possível explorar o detalhe tanto nas histórias como nas personagens, dar-lhes amplitude, profundidade e contexto. É o que está a acontecer nesta Fase 4 do UCM, não para mastigar origin stories ou soluções equivalentes, como seria fácil – e aborrecidíssimo – de se fazer, mas para desafiar modelos dramatúrgicos e tornar estes super-heróis ainda mais humanos.

Com estreia marcada para esta quarta-feira, 9 de Junho, no Disney+, Loki é a mais recente peça televisiva no interplanetário UCM. Uma série cujo primeiríssimo acto é levar a acção para fora da acção. Isto é, para o plano intermédio em que é garantida a continuidade da acção. O ponto de partida é Vingadores: Endgame (2019), no momento em que Loki, Deus da Mentira e irmão adoptivo de Thor, aproveita a confusão em seu redor para agarrar no Tesseract e desaparecer dali para fora. Problema: essa fuga não estava prevista pelos Time Keepers, os guardiões do tempo, pelo que os funcionários da judiciária, burocrática e implacável Time Variance Authority (TVA), ou Autoridade de Variação Temporal, detêm Loki e o levam para ser julgado por crimes contra a sagrada cronologia. Loki é tratado como um réu – ou, neste caso, uma “variante”. A pena é a aniquilação, pura e simples, célere e sem recurso. As “variantes” são encaradas como agentes do caos, que ao quebrar a linearidade da cronologia ordenada pelos Time Keepers criam ramos temporais com consequências imprevisíveis. A TVA existe, por isso, fora do tempo. Acima dele e abaixo dos criadores, como garantia de ordem e continuidade. Tal como originalmente pensado e executado nos comics, esta meta-realidade remete para os criativos que operam o próprio UCM. É como se os argumentistas (aqui liderados por Michael Waldron) se inscrevessem na história.

Depois de uma pausa sensaborona para resolver a crise identitária na América, com O Falcão e o Soldado do Inverno, a Marvel volta a trabalhar nos limites da ficção, criando narrativas dentro (ou fora…) da narrativa, testando a resistência da quarta parede, tal como na bem-sucedida WandaVision. A diferença é que, aqui, a audiência (a TVA) não olha para as personagens como elementos de ficção, mas como quem olha para um aquário – que tem vida própria mas sobre o qual tem agência. E é essa necessidade de intervenção, a necessidade de capturar uma “variante” que escapa uma e outra vez aos soldados da TVA, que impede Loki (Tom Hiddleston) de ser julgado e exterminado. O agente Mobius (Owen Wilson) convence a juíza Ravonna Renslayer (Gugu Mbatha-Raw) a deixar o Deus da Mentira participar da captura do fugitivo trapaceiro que se lhes esgueira por entre os dedos. Ravonna, cujo código penal se resume a fazer cumprir o que é estipulado pelos Time Keepers, acede – contra a vontade de Hunter B-15 (Wunmi Mosaku), que foi quem capturou Loki e quem estará sempre no seu encalço, para garantir que não foge. E ele bem tentará.

Loki deambula entre o policial e o drama existencialista, temperado por um humor sem punchline que beneficia do dinamismo conseguido entre os dois protagonistas, Hiddleston e Wilson. Numa conferência de imprensa virtual, na segunda-feira, a realizadora Kate Herron (Sex Education) e o argumentista principal, Michael Waldron (Rick e Morty), revelaram que O Silêncio dos Inocentes, Seven: 7 Pecados Mortais e Zodiac inspiraram a trama criminal, que além da investigação propriamente dita envolve viagens no tempo (claro) e cenários retrofuturistas. Tom Hiddleston, por seu lado, deixou no ar a possibilidade de um reinício para o anti-herói que corporiza há dez anos, pelo menos a de uma desconstrução: “O que eu adoro nesta série é que o Loki é despojado de tudo o que lhe é familiar. O Thor não está por perto, Asgard parece distante e os Vingadores não se vêem. Perdeu o estatuto, os poderes. Se lhe tirarmos tudo o que serviu para o identificar ao longo de seis filmes, o que é que sobra? Quem é ele?” O actor sintetizou assim a questão a que a série procurará responder: “O que faz do Loki o Loki?” A Marvel levantou um pouco o véu, oficializando o Loki do MCU como uma personagem gender fluid. As redes sociais, onde se lêem desde domingo comentários muito favoráveis aos primeiros episódios, pararam para aplaudir. É caso para isso. Talvez até para mais – mas não é altura para spoilers.

Disney+. Qua (Estreia).

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