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Lota d'Ávila
Francisco Romão Pereira/Time OutA sala do Lota d'Ávila

Lota d’Ávila, um “mercado” de peixe e marisco no meio de Lisboa

O novo restaurante dos donos do Ofício ocupou o lugar do antigo Rabo d’Pêxe. É uma marisqueira que se quer moderna sem abdicar das tradições. Na cozinha está Vasco Lello, chef habituado a escamas, conchas e carapaças, e agora a sobremesas.

Hugo Torres
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Hugo Torres
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Um mercado de peixe sem bordões, mas com boas rabanadas. Se nos pedissem para descrever em poucas palavras o Lota d’Ávila, que abriu recentemente no lugar do extinto Rabo d’Pêxe, nas Avenidas Novas, era assim que o faríamos. Ao leme da cozinha, o chef Vasco Lello aceita uma fórmula ainda mais sintética: marisqueira moderna. Mas hesita. O marisco e o peixe frescos são a aposta da casa; e a decoração salta à vista: as boias de barco nas paredes, as caixas usadas para transportar e leiloar a pesca distribuídas pelo espaço, a balança para pesar o produto em destaque na banca de peixe, a “barra” (balcão), a sala transformada em “bar de praia”, o terraço à laia de deck, tudo. Então por que hesita Vasco Lello? Se nos perguntassem, diríamos que era porque a expressão marisqueira moderna é omissa quanto a rabanadas. No entanto, na resposta do chef, ficamos a saber que é porque não vê mal algum em olhar para o Lota d’Ávila como uma marisqueira tradicional, desde que isso lhe permita ter uns “pratos de inspiração”.

Lota d'Ávila
Luis FerrazO chef Vasco Lello

As ostras, por exemplo. Há ao natural (3€/unidade) e à moda da casa, com puré de aipo, ovas de salmão, cebolinho e dashi (4€/unidade). Até o couvert: a proposta da carta é a versão “Lastro” (5,50€), com pão de fermentação lenta, manteiga dos Açores e paté – que no dia da visita da Time Out era de fígado de tamboril. No entanto, nada impede que se avance imediatamente para as torradinhas (3,50€), abrindo caminho à velha maneira para a Mariscada do Chef (65€). Nas entradas, há lingueirão grelhado (9,50€) e lírio fumado com amêndoa do Algarve e laranja (11,50€); camarão ao alhinho (12€) e peixe fumado na Lota, burrata e ikura – ou seja, novamente ovas de salmão – (13€); amêijoas à Bulhão Pato (18€) e tártaro de atum com tostas de pão alentejano (14€). É um equilíbrio propositado entre tradição e pratos de autor. Nem tanto ao mar nem tanto à terra. Podendo haver compromisso, como no croquete de sapateira com molho tártaro (3,50€), ou no choco frito com maionese de sésamo preto e lima (12,50€), melhor.

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Francisco Romão PereiraOstras ao natural e com puré de aipo, ovas de salmão, cebolinho e dashi

Embora a factura possa variar entre os 30€ e os 50€ por cabeça, Vasco Lello quer que o Lota d’Ávila seja um restaurante para quem vive em Lisboa, e que os pratos correspondam também às suas expectativas. Depois de três anos a trabalhar no Sea Me, um espaço muito procurado por turistas, o chef acredita que aqui será diferente. Já está a ser. “Temos servido muitos locais, o que não acontecia no Chiado. Residentes estrangeiros têm aparecido muito, também”, dizia em finais de Novembro, altura em que estavam em soft opening, a testar pratos, a fixar a carta e, como tem sido quase inevitável na restauração, ainda à procura de gente para completar o quadro de pessoal. O Lota d’Ávila está pensado para abrir todos os dias ao almoço e ao jantar. Contudo, nesta fase inicial, está a fechar às segundas-feiras. Mesmo o equipamento não está completo: logo à entrada, onde fica o balcão de inox e onde os tabuleiros de gelo servem de mostruário ao marisco (com o preço por quilograma, como no mercado), ainda falta o indispensável aquário para manter vivas e frescas as santolas, os lavagantes e as lagostas; por chegar está também uma balança de grande formato para a banca do peixe (igualmente em tabuleiros de gelo e com tabuletas com o preço), aonde os clientes podem e devem dirigir-se para escolher o peixe que vão comer e trocar impressões com quem o atender sobre o seu modo de confecção (cozido, grelhado ou ao sal, com batata assada e legumes grelhados a acompanhar). O bicho é pesado à frente do freguês.

Lota d'Ávila
Francisco Romão PereiraA banca de peixe

A casa faz gala da frescura do produto, que vem sobretudo de Peniche e dos Açores, segundo Vasco Lello, embora haja peixes e mariscos do “mar de Portugal todo”. Para uma coisa ou outra, todavia, pode revelar-se necessário percorrer milhas extra – no dia da visita da Time Out, o lavagante tinha origem no Canadá e as gambas em Marrocos. Tudo o resto era português, do lingueirão – que “tem sido um sucesso”, um bestseller – às ostras aveirenses e ao carabineiro algarvio que vieram para a mesa antes dos pratos principais. Nesses, voltámos a encontrar o cefalópode das entradas, agora à valenciana e não à setubalense, na paella negra de choco, polvo e lula (55€/duas pessoas). É uma das três paellas na carta, juntamente com a de cabrito assado (60€) e a de lavagante (85€), todas com uma nota de rodapé a alertar para o tempo de preparação – “aproximadamente 30 minutos” – por serem feitas ao momento.

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Francisco Romão PereiraPaella negra de choco, polvo e lula
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Francisco Romão Pereira/Time OutCarabineiro do Algarve

Fora da carta, chegou à mesa uma surpresa: caldeirada de salmonete e robalo. E a ideia é que esta e outras experiências da cozinha possam ir chegando aos clientes através dos “especiais do dia”, a serem escritos nos azulejos à entrada, para aproveitar a apanha diária. Sejam fritos, xeréns, arrozes, caldeiradas, ou sopas, “há liberdade de criatividade e de gestão”, sublinha o chef, que imagina ainda um bitoque de atum ou um “cachorro de alguma coisa”. Ou uns fumados a lenha (zimbro e sobro). Sushi, como acontecia no Rabo d'Pêxe, não: “Gosto de fazer e faço bem, mas à partida não vamos entrar por aí”. Os preços, acredita, são os adequados – para quem paga e para quem tem de se haver com a incerteza da inflação. “Temos um preço justo. E temos margem para manter a carta [com os preços que estão]”, garante Vasco Lello.

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Francisco Romão Pereira/Time OutLírio fumado com amêndoa do Algarve e laranja
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Francisco Romão Pereira/Time OutPeixe fumado na Lota, burrata e ikura

Carne, há. Mas pouca. Além da paella de cabrito, o bife grelhado com molho à Lota e batatas fritas (18€) e o prego do lombo com chips (10€), para o tradicional remate dos pratos de marisco. Mais os panadinhos de frango (7€), que também podem ser de peixe, para as crianças. Estas, aliás, têm um espaço só para elas, almofadado e ao ar livre, para poderem abandonar os pais nas refeições demoradas que uma marisqueira impõe, e irem fazer algo bem mais interessante do que comer – brincar. Do ponto de vista dos pais, elas estarão numa espécie de aquário envidraçado (o que é bastante adequado), visíveis de qualquer parte da sala. Esta é ampla e luminosa, sentando 44 pessoas. Cabem mais 12 no terraço, 16 na barra e oito no corredor. Quando o tempo permitir esplanada, são mais 28, num total de 108 lugares. Feitas as contas, são cerca de 500 metros quadrados, com uma equipa de 20 a 22 pessoas. Cada uma com o seu avental de borracha, para alimentar o imaginário de lota de peixe. Os clientes também podem ter “farda”: babetes de pano guardados nas prateleiras quadriculares no final do corredor, diante da cozinha, bordados com as palavras “capitão” e “capitã”.

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Francisco Romão Pereira/Time OutOs babetes de pano do Lota d'Ávila
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Francisco Romão Pereira/Time Out"Filho de peixe sabe nadar": o espaço infantil do Lota d'Ávila

Os mais assíduos poderão ter o próprio nome bordado num destes babetes. No dia em que a Time Out esteve no Lota d’Ávila já havia um: Pedro Teixeira. O actor é um dos sócios, com Diogo Figueiredo, do grupo Paradigma, proprietário deste restaurante e de um outro ao Chiado, o Ofício. André Figueirinha, director de operações do grupo, que aqui tem um papel de supervisão, é também o responsável pela concepção da carta de vinhos. Os cocktails, esses, saem do bar que está de frente para a sala com o seu enorme letreiro em néon laranja – “Lotado”. Mais propriamente das mãos de Bruna Ribeiro, que tem a seu cargo preparar bebidas com “muita cor”, em particular em variações de verde e cor-de-rosa, para contrastar com o branco das paredes, o azul marinho dos guardanapos, e as listras de cadeiras e sofás.

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Francisco Romão PereiraAs sobremesas

O que falta? As sobremesas. Vasco Lello quis ele próprio ocupar-se delas, mesmo que isso o esteja a obrigar a reaprender processos e a passar muito mais tempo na cozinha. São três: mousse de queijo, framboesas e cookie crumble (5€); folhado de amêndoa e fava tonka (6€); e, finalmente, com um topo caramelizado e crocante, a rabanada de brioche e gelado de tomilho (5€). Esta última é mais um exemplo do equilíbrio que aqui se procura entre tradição e inovação. Voltemos portanto ao início: uma marisqueira, sim; um restaurante de peixe, sim; mas também um sítio para ter os doces debaixo de olho. Resumir para quê?

Av. Duque de Ávila, 42B. 925 906 950. Ter-Qui e Dom 12.30-15.30, 18.30-23.00; Sex-Sáb 12.30-15.30, 18.30-01.00

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