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Galeria Munoz Carmona
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Muñoz Carmona: nova galeria no Bairro Alto abre com exposição sobre a mão humana na natureza

As exposições terão uma rotatividade de dois meses e vão sendo intercaladas entre a dupla fundadora da galeria e artistas internacionais.

Escrito por
Francisca Dias Real
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O Bairro Alto Hotel tem tudo. Tem camas, restaurante, um terraço com vistas inacreditáveis, uma pastelaria aberta a todos, mas faltava-lhe algo para ocupar a porta do número 109 da Rua do Alecrim – uma galeria. A Muñoz Carmona Art & Gallery fez as honras da casa e abriu, finalmente, as suas portas com uma exposição inaugural que mostra a relação de imposição do ser humano aos animais, ao confinamento a que os submete desde sempre – irónico até nos tempos que se vivem. 

Devia ter aberto em Março, mas viu a inauguração ser empurrada no calendário, que a pandemia não poupou ninguém. Só agora, em Setembro é que a Muñoz Carmona finalmente se abriu aos lisboetas e ao mundo com “Natureza Morta”, uma exposição da autoria de Juan Carmona, o fundador do espaço, e de André Ribeiro, com quem forma a dupla criativa do Thestudio.

Galeria Munoz Carmona
Manuel Manso

“Não podíamos fazer uma arte conceptual e intelectual que não chegasse às pessoas”, refere Juan. “Decidimos trabalhar um lado que se relacionasse com qualquer pessoa e, no fundo, isso não acontecerá apenas nesta primeira exposição, é regra para todas”. 

Juan Carmona fundou o Thestudio em 2005 e, pouco tempo depois, juntou-se a ele André Ribeiro. O projecto da dupla abrange várias áreas de trabalho, do design à arquitectura de interiores – e exemplo disso é o trabalho de direcção criativa e execução do espaço do restaurante BAHR, no próprio Bairro Alto Hotel, uma colaboração estreita com Marta Tavares da Silva, proprietária e administradora da unidade hoteleira.  

Porém, apesar destes projectos maiores, a dupla começou a explorar novos conceitos onde se pudessem exprimir artisticamente, um caminho percorrido que fez nascer o que agora dá forma à exposição “Natureza Morta”, que ambos consideram como sendo “o projecto profissional e pessoal mais ambicioso do nosso percurso”.

A galeria cabe em pouco mais de 50 metros quadrados, com uma grande janela para a rua que deixa entrar a luz e ilumina o espaço já todo ele branco, apenas com pilares em pedra originais do edifício. Na exposição que assinala a abertura da galeria, a ironia (e coincidência) não poderia ser maior. “Natureza Morta” trata de questionar o posicionamento ser humano perante os animais, e a sua relação de longa data em que o homem sempre impôs um sentido de propriedade.

Galeria Munoz Carmona
Cheuk-Yin To

“Não quisemos de todo entrar num tom moralista, mas estamos aqui a falar de um sentido de posse”, explica Juan. “Quando éramos crianças sabíamos que era natural comprar animais e pô-los numa gaiola e tê-los ali como objectos quase. Qual é que é a superioridade que nos permite fazer isso?”. 

A pergunta impõe-se no meio de peças provocadoras, de animais que são obras de arte ao mesmo tempo que passam por um processo de apropriação humano, numa representação bem diferente da habitual daquilo que seria uma natureza morta. 

“Inconscientemente apoderamo-nos da natureza como se fosse a ordem natural das coisas mas essa ordem natural foi imposta por nós”, acrescenta André. “Há aqui um choque entre aquilo que impusemos a toda a envolvência e ao direito das coisas existirem por si. Não há propriamente uma maldade por trás, é só inconsciência”.

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O que a dupla quer fazer aqui é questionar o visitante sobre estes comportamentos que, retirados do contexto, provocam o choque. “Há sempre um factor de egoísmo na parte de apropriação de um animal de estimação, mas há uma relação unilateral, há uma imposição humana”, diz André. 

Os animais aqui surgem quase como jóias, jóias essas que possibilitam ver arte em cenários completamente bizarros como o simples acto de trespassar um animal ou enjaulá-lo. 

A exposição começou a ser trabalhada há dois anos, muito antes de uma pandemia bater à porta, mas a relação do ser humano com o animal e as consequências que pode provocar servem aqui quase de ironia para o contexto actual. “Criamos milhões de animais e sabemos que o percurso de vida é, eventualmente, a alimentação. Agora é como se os animais nos estivessem a dizer para pararmos, para provarmos o nosso próprio veneno”, remata Juan. “A mensagem tinha de ser perceptível, mas é preciso as pessoas questionarem-se sobre o tema em si”. 

A ideia é que as exposições tenham uma rotatividade de cerca de dois meses, para poder dar lugar a vários e novos artistas, sempre intercalando com trabalhos da autoria da dupla Thestudio. E como não há representação de artistas, ao contrário da grande maioria das galerias em Lisboa, as exposições intercalares estão à responsabilidade de Deborah Harris, curadora convidada que está encarregue de convidar artistas internacionais contemporâneos para virem a Portugal expor os seus trabalhos pela primeira vez.  

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Deborah mudou-se para o nosso país em 2018, depois de ter deixado para trás o cargo de diretora do The Armory Show, em Nova Iorque, e trouxe na algibeira mais de 30 anos de experiência no mundo da arte. 

“O objectivo é trazer artistas que tenham algo a dizer. Que falem sobre política, ambiente, sobre a condição humana, o que seja. Queremos dar espaço para eles terem a voz sobre algo”, conta Deborah. “A ideia do Juan, que está a par com a minha também, é trazermos projectos diferentes que não há nas outras galerias. Queremos abrir a galeria a todos não é só para entendidos e críticos”. 

A próxima exposição será então de Curtis Santiago, seguindo também com nomes como Rachel Lee Hovnanian ou Bo Joseph. 

As peças, como em qualquer galeria, estarão também à venda e Juan admite que o preço é “acessível dentro de um mercado de arte contemporânea actual”, tentando sempre encontrar um equilíbrio também com os artistas internacionais. 

Rua do Alecrim, 109 (Bairro Alto). Ter-Sáb 12.00-20.00.

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