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Do Porto para Lisboa: a juventude revolucionária ocupa o D. Maria II

Escrito por
Mariana Duarte
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O Grande Tratado de Encenação, do Teatro Experimental do Porto, estreou em Abril de 2017 no Porto e desce agora até ao D. Maria II. É o primeiro capítulo de uma trilogia sobre a juventude inquieta do Portugal das décadas de 50, 70 e 90. 

O Portugal jovem e revolucionário da luta antifascista. O Portugal jovem e revolucionário da luta pela “revolução cultural”. O Portugal jovem e revolucionário da luta contra as propinas, contra um país a ser esfaqueado por Cavaco Silva, da agricultura às pescas, com dinheiro de Bruxelas e um sorriso na cara (e as hemorragias perduram). O Grande Tratado de Encenação, criação do Teatro Experimental do Porto (TEP), é o primeiro capítulo de uma trilogia sobre a juventude inquieta de um Portugal de outros tempos – mais precisamente das décadas de 50, 70 e 90 –, mas sempre a ver o que acontece em 2018. É sobre jovens a sacudir ideias e a sonhar em voz alta dentro de um sótão, a pensar em “como fazer um espectáculo de teatro, em como fazer um país”, resume o encenador Gonçalo Amorim. Tudo isto para ver até dia 27 no Teatro Nacional D. Maria II.

O primeiro round faz-se com os olhos postos nos anos 50. E no teatro. Não é por acaso que um dos pontos de partida foi o livro O Pequeno Tratado da Encenação (1962), de António Pedro, um dos nomes ligados à fundação do TEP. A ponte com o presente é óbvia, nota Gonçalo Amorim. “O surgimento do TEP é uma coisa incrível mas leva 50 anos de atraso em relação à Europa. O António Pedro entra de cabeça no Brecht, no Pirandello, no teatro dentro do teatro... Queria fazer tudo. No fundo, ainda hoje, em Portugal, quando te lanças para fazer uma coisa, lanças-te para fazer tudo”, considera o encenador. “Há ainda esta sensação de estar tudo por fazer. Faltam traduções, centros de documentação, críticos, colectividades...”.

Neste projecto estabelecem-se ligações entre a biografia de Gonçalo Amorim (ele próprio andou a fazer barulho nos anos 90), a sua árvore genealógica (o avô esteve na criação do TEP; a mãe, Manuela Juncal, foi uma das jovens que nos 60s e 70s virou costas à família burguesa e rumou à fábrica e ao campo com os livros na mão) e a história passada e presente do TEP. “No primeiro espectáculo vamos até aos anos 50 e podemos ver que no Porto desse período houve um contexto histórico e social que permitiu o surgimento do TEP. Veio de resistentes antifascistas, comunistas, socialistas, católicos progressistas”, explica Gonçalo. “Fomos pesquisar os arquivos do TEP e o arquivo do Pacheco Pereira, que nos anos 60 escrevia os boletins internos do TEP, livres da censura, e onde traduzia várias peças de teatro”, acrescenta o encenador.

De resto, esta trilogia – que continua no trilho da militância cívica percorrida pelo TEP – é também o cimentar de uma equipa artística que foi dando forma, nos últimos anos, a uma ideia de companhia e a um modus operandi colaborativo, em que se constroem espectáculos e textos de raiz (tendo como dramaturgo residente Rui Pina Coelho). E é o elogio do fervor da juventude, da juventude inconformista, representada aqui por um elenco a condizer (Sara Barros Leitão, Catarina Gomes e Paulo Mota). A brincadeira do título do espectáculo com o livro de António Pedro vem precisamente daí. “Há nessa altura da vida uma força de ideias e um entusiasmo em defendê- las como se não houvesse amanhã”, diz Gonçalo Amorim. Uma vontade de “fazer tudo em grande”, mesmo a partir de um sótão com vista para um país. 

De Gonçalo Amorim e Rui Pina Coelho

Encenação Gonçalo Amorim

Com Catarina Gomes, Paulo Mota, Sara Barros Leitão

Teatro Nacional D. Maria II. Qui-Sex 21.30. Sáb 19.30. Dom 16.30. 3-12€.

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