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Alexandre Silva e Vasco Coelho Santos
Francisco Romão Pereira Alexandre Silva e Vasco Coelho Santos

Por uma e só uma vez, os chefs Alexandre Silva e Vasco Coelho Santos trocam de restaurante

No dia 14, Alexandre Silva cozinha no Euskalduna, no Porto, enquanto Vasco Coelho Santos comandará o LOCO, em Lisboa. O menu terá os mesmos ingredientes, mas será diferente. E só 20 clientes em cada cidade terão a oportunidade de o descobrir.

Cláudia Lima Carvalho
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Cláudia Lima Carvalho
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A premissa é aparentemente simples, mas arrojada o suficiente para que nunca aconteça. Pelo menos, não da forma que está planeada. Durante uma noite, Vasco Coelho Santos muda-se para Lisboa e Alexandre Silva para o Porto. Os dois chefs vão trocar de restaurante, apresentando-se como são fora do seu contexto habitual. E há mais: o menu será obviamente diferente, à imagem de cada restaurante e chef, apesar de os ingredientes serem os mesmos. A desculpa para tudo isto está no facto de tanto o LOCO, de Alexandre Silva, como o Euskalduna Studio, de Vasco Coelho Santos, ambos com uma estrela Michelin, celebrarem sete anos.

A ideia partiu de Vasco – e Alexandre não precisou de muito para dizer que sim. Na vida, são amigos; no trabalho, são igualmente destemidos, sendo-lhes reconhecida uma assinatura própria. “Nos aniversários do Euskalduna, tento sempre ter um evento diferente. Tive uma primeira ideia com alguns restaurantes do Porto, mas depois achei que poderia ser mais interessante fazer com alguém de Lisboa e pensei logo no Alexandre”, conta Vasco, sentado à mesa do LOCO, onde se planeia a noite de 14 de Dezembro. “Eu comecei logo a planear como é que poderia fazer a troca de restaurante com alguém, e em Lisboa não via mais ninguém com o registo, o estilo… Temos uma linha diferente, mas acho que somos um bocado mais ousados, e isso fez com que pudesse ser engraçado”, continua o chef, que se inspirou no Gelinaz, uma iniciativa que promove precisamente a troca de chefs e restaurantes em todo o mundo.

Do lado de Alexandre Silva, as celebrações no LOCO arrancaram logo no início do ano quando se anunciaram sete jantares com sete chefs convidados, um por cada ano de vida do restaurante. Houve João Rodrigues (Residência, Canalha), Henrique Sá Pessoa (Alma) e Poul Andrias Ziska do restaurante Koks (duas estrelas Michelin e uma verde), nas remotas Ilhas Faroé. Seguiu-se o brasileiro Alex Atala (D.O.M, duas estrelas Michelin), o alemão Christian Bau (Victor’s Fine Dining, três estrelas Michelin) e o japonês Zaiyu Hasegawa (DEN, duas estrelas Michelin e uma verde). “Faltava-nos um jantar, e eu disse-lhe: já que vais festejar o sétimo aniversário e nós estamos a festejar o sétimo aniversário, aproveitamos e fazemos as duas coisas”, recorda Alexandre. 

Propositadamente, a data escolhida para a troca não coincide com o aniversário de nenhum dos restaurantes, para que se possam celebrar irmãmente os dois. “7+7 são 14”, justifica Alexandre Silva. A gargalhada é geral. “Foi agora que te lembraste dessa”, atira Vasco Coelho Santos. “Muito bom.” 

Alexandre Silva e Vasco Coelho Santos
Francisco Romão PereiraAlexandre Silva e Vasco Coelho Santos

A descontração que reina à mesa até consegue esconder a inquietação, embora ela exista e nem Alexandre nem Vasco a escondam. Também por isso, na troca de casa, não estarão sozinhos. “Os restaurantes são muito diferentes. O meu é sempre ao balcão, eu não estou habituado já a este registo de serviço de sala e preciso de equipa. Eu vou trazer dois cozinheiros e um sommelier. O Alexandre vai levar um cozinheiro e um sommelier. Deixamos mais de metade da equipa para ajudar em toda essa parte mais operacional”, contextualiza Vasco. “E no final nós queremos que a experiência seja boa para o cliente, não é?”, reforça Alexandre. “É importante. Eu não quero dar um mau serviço no restaurante dele e vice-versa, as expectativas vão estar muito altas”, acredita o chef do LOCO. 

Em Lisboa e no Porto, os dois vão sair da sua zona de conforto “e por isso é que isto é muito mais giro”, defende o chef do Euskalduna, alertando Alexandre para a exigência de passar um serviço ao balcão. “São três horas a levar com o cliente sempre a fazer perguntas. Eu gosto desse registo, mas pode haver quem não goste.” Alexandre não hesita na resposta, sempre em tom de brincadeira: “Eu tenho ferramentas para isso. Por isso é que me chamam antipático”. “O nosso serviço aqui também é muito próximo do cliente. Não estão sentados ao balcão, mas nós estamos dentro da sala constantemente. Todos os pratos chegam à mesa através das mãos da equipa da cozinha”, diz, admitindo o desafio no Euskalduna. “Vai ser diferente porque nós colocamos os pratos e temos a oportunidade de sair, ali colocamos e ficamos.”

Nada que os assuste, à semelhança do repto a que se propuseram na construção do menu, que contará com 12 momentos (240€ com harmonização). “Isto não é só um jantar, nós fomos mais além. Vamos ter seis combinações de ingredientes escolhidas por mim e seis pelo Alexandre.” Combinações, essas, que têm que aparecer no mesmo prato. E nem um nem outro fizeram por menos: Alexandre escolheu carapau e pato, gamba branca e amêndoa, coco e carabineiro, borrego e pimenta preta, marmelo e Porto, maçã e couve; Vasco sugeriu ouriço e caril, batatas e ovas, feijão frade e pinhão, lírio e romã, ostra e massa mãe, porco e topinambur. “E, por exemplo, o feijão frade e pinhão pode ser uma sobremesa para um e para outro ser outra coisa. No final, vai ser giro ver o que cada um fez”, confia Vasco, que se decidiu a fazer um jantar-teste esta semana no Euskalduna para garantir que nada falha na grande noite. “Para mim, para vir para o LOCO, tenho que ser perfeito.”

Já Alexandre defende-se na escolha dos ingredientes e não quer isso dizer que não vá arriscar. “Eu pensei nos ingredientes como muletas para mim lá em cima. Quero fazer uma coisa diferente, mas apoiado numa muleta. Já sei o que vou fazer com carapau e pato. Ou já sei o que vou fazer com maçã e couve. O Vasco de certeza que também já sabe o que vai fazer com as escolhas que fez.”

No final, ficará a faltar apenas um brinde entre os dois. O que interessa é o que fica para a posteridade, lembra Alexandre: “Tentamos fazer um trabalho de proximidade uns com os outros e abrir as portas uns aos outros, mas mesmo assim ainda há muito atrito em algumas situações, e abrir o restaurante ao Vasco e o Vasco ao LOCO é uma pedrada no charco grande. É um sinal de confiança. Eu confio no Vasco, o Vasco confia em mim. Vai ser uma noite especial para os dois, mas também para as equipas e para os clientes.”

LOCO. Rua Navegantes, 53 B (Estrela, Lisboa). 21 395 1861. 14 de Dez 19.30 | Euskalduna Studio. Rua de Santo Ildefonso, 404 (Campo 24 de Agosto, Porto). 93 533 5301. 14 de Dez 19.30

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