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25 Mulheres
© Raquel Costa25 Mulheres, de Raquel Costa

São cravos, senhoras (e um livro sobre a condição feminina)

A revolução também se faz no feminino. Conversámos com Raquel Costa sobre o álbum ilustrado ‘25 mulheres’.

Raquel Dias da Silva
Escrito por
Raquel Dias da Silva
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Os livros, tal como os filhos, demoram a nascer. Este andava a ser planeado há uma década. Foi em Abril de 2014 que Raquel Costa fez uma ilustração a que chamou “A Revolução Ainda Por Fazer”, longe de imaginar que acabara de lançar a primeira semente. Volvidos dez anos, percebendo em si uma insatisfação com o caminho que se tem feito em direcção à liberdade, à democracia e à igualdade, a fundadora do estúdio criativo Little Black Spot encontrou – mais do que a vontade que já germinava – tempo e espaço para fazer florescer 25 mulheres. Editado pela Oficina do Livro, não é o primeiro álbum que ilustra, mas é o primeiro em que também assina o texto. “Como artista, como educadora, como mulher, pergunto-me que lugar posso deixar às gerações mais novas com quem contacto. Há um ano, decidi começar a explorar a ideia de um livro sobre a condição feminina”, conta-nos, a três semanas de o apresentar na Livraria Buchholz, no dia 18 de Abril.

A problemática da mulher – das suas lutas e da sua emancipação – interessa-lhe há muito, quer de um ponto de vista ontológico e estético, quer de um ponto de vista social e político. Considerando a criação para a juventude, mas certa de que a proposta agradará também aos mais velhos, o que procurou foi deixar claro como ser mulher molda a forma de estar no mundo, de o ver e de se (re)ver nele. “Não é possível desligarmo-nos daquilo que são as nossas lutas e daquela que é a nossa percepção do lugar que ocupamos”, esclarece, antes de reforçar a ideia de que, mesmo uma pessoa com uma identidade de género diferente daquela que lhe foi atribuída à nascença, vive a experiência do que é ser mulher. Aí, porventura, sentindo-se presa não só pela sociedade, mas pelo seu próprio corpo. É essa a história de Guiomar, uma das 25 personagens retratadas que, na sua maioria ficcionais, são inspiradas pela realidade de tantas outras.

A selecção que nos chega foi resultado de uma pesquisa histórica, mas a autora confessa que, guiada pelo desejo de tentar contribuir para “uma memória intergeracional e plurifacetada”, optou por fabricar histórias de mulheres que pudessem ser “mulheres anónimas, mulheres comuns, mulheres como todas nós”. Salvo as incontornáveis Três Marias, que evocam Maria Teresa Horta, Maria Velho da Costa e Maria Isabel Barreno, autoras de Novas Cartas Portuguesas (obra que aparece numa outra cena, no gabinete de Teodora, uma mulher da ciência, que vive exilada, mas em liberdade, em Paris). “Acho que é mais fácil ressoar em nós uma história ficcionada com raíz na realidade, que desperte reconhecimento. Há histórias que são as histórias não de uma, mas de milhares de mulheres. O caso das Três Marias foi o único em que assumi a interpretação biográfica, porque não podia deixar de honrar o papel de quem veio antes.”

25 Mulheres
© Raquel Costa25 Mulheres, de Raquel Costa

Além de lembrar a luta feminista – pelos direitos das mulheres, pelo direito ao corpo e ao pensamento –, Raquel Costa também se debruçou sobre a sociedade portuguesa nas décadas de 1960 e 1970, a importância da educação e da memória, as heranças familiares, a acessibilidade ou falta dela, a identidade sexual e de género, a invisibilidade e o silenciamento, a violência contra a mulher, as revoluções que se fazem à escondida e, claro, as que nos levam à rua, de braços no ar e cravos ao peito. “Tentei criar uma oportunidade de diálogo e reflexão, de aproximação ao outro, às diferentes experiências de feminilidade e ao terreno comum que nos permite continuar uma luta que é mais forte se a fizermos juntas”, diz. “Tentei não fazer um livro triste, soturno, que só mostre os horrores de viver em repressão. É um espelho de contrastes, e há esperança e há um caminho.” Há 50 anos, culminou na Revolução dos Cravos, num hoje de festa, que “amanhã será novamente dia de luta”.

25 Mulheres, de Raquel Costa. Oficina do Livro. 48 pp. 14,50€ | Apresentação na Buccholz: 18 Abr, Qui 19.00. Entrada livre

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