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pessoa num sofá a segurar um bolo
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‘Teleculinária’: uma aula de pastelaria ou como (não) fazer um atentado

A nova produção da Mala Voadora fala-nos de bolos, terrorismo e mudanças políticas. A estreia está marcada para esta quinta-feira, 28 de Outubro, na Escola do Largo.

Raquel Dias da Silva
Escrito por
Raquel Dias da Silva
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Fazem-se bolos por muitos motivos. A protagonista de Teleculinária queria promover um manifesto. Investiu nos ingredientes, exclusivamente nacionais, e na forma, equilibrada, estável, agradável à vista. Tal como a sociedade com que ainda sonha – e pela qual foi parar a uma cela numa qualquer prisão do país. Ao que parece, conta-nos, como se estivesse a dar uma aula de pastelaria, orquestrou um atentado. Chamou-lhe “a mudança”. Não foi bem sucedida, mas parece estar mais optimista do que nunca. Este é o ponto de partida da nova produção da Mala Voadora, que convida a reflectir sobre os perigos da extrema-direita, uma ameaça tão iminente quanto insidiosa. É construída a partir de um texto do dramaturgo e actor britânico Chris Thorpe, que tem colaborado regularmente com a companhia. A estreia está marcada para esta quinta-feira, 28 de Outubro, na Escola do Largo, onde ficará em cena até dia 31.

“A primeira metade da peça já tinha sido escrita por Chris Thorpe para um outro espectáculo, Your Best Guess, mas acabou por não ser usada. De repente, em pandemia e a tentarmos reorganizar o trabalho, o Jorge Andrade [director da companhia] lembrou-se de desafiar o Chris a dar-lhe uma continuação. Falaram sobre a nossa situação política actual, de termos um partido assumidamente – não assumidamente, mas enfim – de extrema-direita, com assento parlamentar. A segunda parte é resultado dessa conversa”, partilha a actriz Maria Jorge, que interpreta a pasteleira-bombista, a única personagem em palco.

Diluindo as fronteiras entre a realidade e a ficção, Teleculinária transporta-nos para um lugar privado de liberdades, que conhecemos a partir da perspectiva de uma pessoa disposta a bombardear quatro estações de metro em hora de ponta, em nome de uma revolução política no país. E que, apesar das consequências dos seus actos, continua convicta da importância e da urgência das suas reivindicações. “Pelo menos no início, não está propriamente explícito que ela é fascista. E o perigo é esse. As pessoas já não estão exactamente num extremo ou noutro. Há um meio termo, de pessoas que vão apanhando assim uns discursos e têm assim umas ideias”, sugere Maria Jorge, sobre a mulher alienada – sem pais, amigos ou cara-metade – que, subitamente, reconhece numa figura televisiva um potencial ícone do futuro que idealizou.

Na prisão, a pasteleira-bombista dá por si deslumbrada com um homem. “Comentador da liga desportiva é pouco para este homem. Dá para perceber que é isso que ele pensa”, diz ela, antes de partilhar com o público o seu novo plano e começar a plantar as sementes de uma nova bomba por detonar. “Ela usa metáforas, como a do bolo, e aposta em mensagens fáceis, como as mentiras sobre os números. E evoca-as para o seu manifesto. Sem darmos por isso, ela é boa porque nos diz que quer dizer a verdade.” Ela nem precisa de ser muito concreta, basta aproveitar-se dos sentimentos de frustração dos que a rodeiam e ir dando “pequenos rasgos de atenção” àquela figura. “Estamos todos a viver neste limbo de não sabermos como falar do elefante na sala”, acrescenta Maria Jorge. E o problema é que, mesmo sem palco ou voz, ele continua lá: de repente já não é um homem, é um movimento – ou outro bolo prestes a explodir.

Escola do Largo. Largo do Chiado 15. De 28 a 31 de Outubro. Qui-Dom 19.00. 5€-7,50€. Reservas através de e-mail (geral@escoladolargo.com).

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