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Um cavalo de Tróia nas Ruínas do Carmo

Escrito por
Miguel Branco
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Estreia esta quarta-feira, nas Ruínas do Carmo, Troianas, texto de Eurípedes que é a nova criação do Teatro do Bairro. António Pires volta a falar-nos sobre guerra.

Sopra um vento que não parece amigo. Não será por acaso que as mulheres estão vestidas de vermelho, mancha de fogo e sangue no leito destruído de Tróia. Eram nobres e agora serão feitas escravas, distribuídas por vários senhores gregos, e, em jeito meio coreográfico, simbolizam também a teia emocional de Hécuba, última rainha do reino agora destruído pelo tal cavalo de madeira envenenado. Menos ao acaso será Troianas, de Eurípedes, que António Pires e o Teatro do Bairro levam – há muito que assim é em Agosto – às Ruínas do Carmo (Museu Arqueológico do Carmo). Estreia-se esta quarta-feira e por lá fica até 17 de Agosto.

O encenador e director artístico do Teatro do Bairro, assume, anda “sempre nisto”. Nisto da guerra, da inutilidade da mesma, na impotência das vítimas, no exagero de cadáveres e num alerta constante que sente que deve às populações. Ter nascido em Angola, em 1967, também não deve ser um acaso: “Nasci numa guerra, deve ser por causa disso. Está muito presente em mim e acho que tenho responsabilidade de avisar as pessoas para este género de disparate. Parece existir um clima iminente de guerra actualmente que não é nada favorável”.

O mesmo que admite ver em Troianas, de Eurípedes, “o texto que melhor fala sobre o tema”. Se em Terror e Miséria, de Brecht, que o Teatro do Bairro estreou este ano, estávamos na ascensão de Hitler, a curva ascendente daquilo que viria a ser uma mancha negra e incurável na humanidade, aqui estamos no pós-guerra – ou pós-cavalo, se se preferir –, a tropeçar nos escombros, a desesperar por um futuro de escravidão que não se controla, um futuro que por aqui se chega a questionar se valerá mais do que a morte. A história gravita em torno de Hécuba, das suas fiéis troianas, da loucura da sua filha Cassandra, que jura vingança e tempestades no regresso a casa dos navios gregos, do assassínio do seu neto Astíanax e do seu filho Heitor, bem como do malfadado destino da sua nora Andrómaca. É a inevitabilidade do próximo capítulo. E tudo isto numa trincheira feita de sacos de areia, zona central da cenografia, à qual se acrescentam uma carrada de biombos que servirão para criar a tenda de Agamémnon, rei grego e responsável, a meias com o seu irmão Menelau, pela conquista de Tróia.

Os navios vão sendo carregados e Hécuba teima em ficar. O símbolo da mulher como vítima, “como despojo de guerra”, como garante António Pires, é outra parte essencial destas troianas. A falsidade, já mais para o final, de Helena, a mulher-veneno que desencadeou tudo isto quando fugiu da casa de Menelau e fez eclodir a guerra entre gregos e troianos, é contraposta pelo bater de pé de Hécuba, sempre em postura e palavras antibélicas. E esse é o caminho a seguir. Mesmo que este seja um texto pertencente ao século V a.C. 

De Eurípedes
Encenação António Pires 
Música e direcção coral Luís Bragança Gil 
Com Maria Rueff, Alexandra Sargento, Sandra Santos, Vera Moura, João Barbosa, Hugo Mestre Amaro, Francisco Vistas e os alunos finalistas da Act – Escola de Actores

Museu Arqueológico do Carmo. Seg-Sáb 21.30. 8-16€

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